Edição 76
Temendo uma queda de liquidez dos papéis da Telefonica com a operação de troca por BDRs (Brazilian Depositary Receipts), algumas fundações planejam e outras até já iniciaram um processo de redução da concentração deste ativo em suas carteiras. “Os fundos de pensão querem liquidez e a tendência para o papel da Telesp é ficar sem liquidez”, comentou o analista da consultoria Lopes Filho, Carlos Manoel de Souza.
Diante da aproximação da operação de troca, as fundações tendem a diversificar os investimentos no setor de telecomunicações, trocando parte das ações da empresa espanhola por outras como Telemar e Tele Centro-Sul. “A maioria dos fundos de pensão parece não querer a troca por BDRs”, observa Souza. “Eles pretendem sair de Telefonica e com isso as outras teles podem aumentar sua participação.”
O processo de realocação no setor de telecomunicações não deve se limitar aos investimentos realizados diretamente na Bolsa de Valores. De acordo com o analista do BBA Capital Icatu, André Paes, a troca efetiva das ações da Telesp pelos BDRs pode reforçar esta migração com a entrada em cena das empresas de administração de recursos de terceiros. “O movimento deve aumentar quando a operação for realizada, porque existem muitos fundos indexados que devem se desfazer do papel”, explica Paes.
As operações de reposicionamento entre os fundos de pensão já começaram. A Valia (Vale do Rio Doce), por exemplo, vendeu por R$ 26 milhões todas as ações da Telesp que possuía em seu portfólio. Elas representavam 4% dos recursos totais da carteira de renda variável do fundo de pensão. “Não aceitamos o risco de ficar com este papel”, afirmou o diretor financeiro da Valia, Manoel Cordeiro. Apesar da venda, o setor de telecomunicações continua importante na política de investimentos da fundação, ao lado de outros como energia e petróleo. “Telecomunicações é estratégico para nós e estamos nos posicionando”, afirmou o diretor superintendente da Valia, Eustáquio Coelho Lott.
A Petros (Petrobrás) também já se definiu e vendeu R$ 35 milhões em ações da Telesp dentro do processo de reestruturação de sua carteira. Em operações casadas, a fundação comprou o mesmo valor em papéis de outras empresas de telecomunicações: R$ 15 milhões em Telemar, R$ 17 milhões em Tele Centro-Sul e outros R$ 3 milhões em Embratel. Nas próximas semanas, a revisão do portfólio da Petros deve se estender a outros setores. “Vamos deixar as operações de curto prazo”, afirmou a diretora financeira da Petros, Eliane Thompson-Flôres. “Nossa idéia é melhorar a qualidade e investir no longo prazo.”
Ao final das realocações no setor de telecomunicações, a participação da Telefonica na carteira de ações da Petros havia caído 60%. Ao mesmo tempo, a representatividade do setor variou pouco, com uma oscilação de 30% para 32%. “Resolvemos sair dos papéis com perspectiva de menor liquidez, como Telefonica”, afirmou a diretora financeira da Petros. “Havendo a troca por BDRs, a ação vai perder liquidez, o que tornará mais difícil a realização de lucros.” Segundo a diretora, ainda que não tenha sido o objetivo, a operação gerou lucro porque o conjunto dos ativos adquiridos – Tele Norte-Leste, Tele Centro-Sul e Embratel – vem tendo um desempenho melhor do que as ações da Telesp.
Embora a perspectiva de queda na liquidez tenha sido o fator preponderante na decisão da Petros, também pesou consideravelmente para o fundo de pensão a indefinição sobre a questão da imunidade tributária dos recibos ofertados pela multinacional espanhola. “Estávamos preocupados em relação a esta questão e a falta de definição reforçou nossa decisão de vender”, disse Eliane. Na Valia, o fator também contribuiu para a decisão de venda. “Esta incerteza de ordem legal pesou para nós”, disse o diretor superintendente do fundo de pensão, Eustáquio Lott.
Compasso de espera – Os outros fundos de pensão que detêm ações da Telesp estão avaliando a oportunidade de vendê-las antes da realização da troca pelos Brazilian Depositary Receipts. Na Previ, por exemplo, os recibos não são considerados uma boa opção. Antes de se afastar do cargo para concorrer à eleição interna para o conselho do fundo de pensão, o então diretor de participações da entidade, Vitor Paulo Gonçalves, declarou-se publicamente contrário à possibilidade de a fundação ter os BDRs.
Na Sistel, a decisão sobre os recibos ficará, curiosamente, a cargo da própria Telefonica. Isto porque, na recente reestruturação do fundo de pensão, houve uma repartição negociada dos ativos entre as principais patrocinadoras – Telemar, Tele Centro-Sul e Telefonica. Conforme o diretor de investimentos da Sistel, José Leitão Viana, as ações da Telesp que a fundação detinha em seu portfólio foram todas alocadas para o plano de benefício gerido pela Telefonica.
Quem decidirá sobre os BDRs na Sistel será o economista Sérgio Gouveia, que acaba de assumir a diretoria dos planos de benefício da multinacional espanhola (ver seção Nomes & Carreiras). “Foi feita a cisão dos ativos mas o gerenciamento ainda não chegou às minhas mãos”, explica Gouveia. “A decisão sobre a troca pelos BDRs envolverá a patrocinadora (Telefonica) mas ainda estamos em fase de transição”, complementou.
Timing – O momento ideal para a venda de ações da Telefonica varia de acordo com a estratégia adotada por cada fundação. A Petros e a Valia já marcaram posição, mas outros fundos de pensão podem aguardar a aproximação da troca por BDRs para agir. Para o analista de telecomunicações do Banco Bear Stearns, Alexandre Constantini, embora haja espaço para a valorização do papel, este é um bom momento para vendê-lo. “A Telefonica já subiu muito recentemente e reduziu o upside”, justifica.
Segundo o analista, é natural que ocorra uma migração dos investidores de ações da Telefonica para outras empresas, não só pela expectativa de comprometimento da liquidez dos papéis mas também pela dificuldade em se determinar qual será o risco dos BDRs. “Com a troca, a exposição deixa de ser só ao mercado paulista e passa a abranger toda a América Latina e Espanha”, disse Constantini. Este ponto contribuiu para a decisão da Valia em se desfazer dos papéis da Telesp. “Não temos vivência nenhuma com os recibos”, afirmou o diretor financeiro do fundo de pensão, Manoel Cordeiro. “Prefiro permanecer no mercado local porque lá fora o comportamento é diferente.”
Como se não fossem suficientes todas as polêmicas em torno da troca pelos BDRs, existe um outro fator complicador em relação às ações da Telesp: a possibilidade de a multinacional espanhola ser comprada, de uma hora para outra, por uma outra gigante das telecomunicações – a British Telecom (BT). As negociações entre as duas empresas, que haviam sido interrompidas em dezembro, foram retomadas recentemente.
Emissão vai financiar
a compra da CRT
A Tele Centro-Sul (TCS), por meio de sua controlada Telepar, está fazendo uma emissão de commercial papers no mercado internacional no valor de R$ 900 milhões, que serão usados para financiar a compra do controle acionário da Companhia Riograndense de Telecomunicações (CRT), hoje pertencente ao Grupo Telefónica. A empresa espanhola, que já controla a Telesp, se viu obrigada a negociar suas ações da CRT porque a Lei de Telecomunicações prevê que uma companhia só pode ter mais de 10% das ações com direito a voto em uma única operadora.
A aquisição da CRT fará com que a Tele Centro-Sul se aproxime da extensão de cobertura das outras duas grandes empresas de telecomunicações do Brasil. Ao incorporar de 1,7 milhão de linhas da CRT, a TCS vai chegar a um total de 7 milhões de acessos, contra 9,5 milhões da Telefónica e 10,5 milhões da Telemar. “A TCS ficará próxima das outras duas”, observa o diretor de investimentos da Sistel, José Leitão Viana. “Isso resgatará o equilíbrio que foi originalmente desenhado pelo governo.”
Os sócios da Tele Centro-Sul são o banco Opportunity, a Telecom Italia e diversos fundos de pensão, entre os quais se destacam a Funcef (Caixa Econômica Federal), a Previ (Banco do Brasil), a Valia (Vale do Rio Doce) e a Sistel (Telefónica, Telemar e Tele Centro-Sul).