Sem pagar a conta | O principal problema dos institutos de previd...

Edição 108

Metade dos chamados regimes próprios municipais encontram-se em discordância com a Lei de Responsabilidade Fiscal, segundo informações da Secretaria de Previdência Social (SPS) do MPAS. De acordo com a Secretaria, de um total de 335 regimes próprios paulistas, 52,8% estão desenquadrados da lei. A principal razão desse desenquadramento são as dívidas que as prefeituras têm com eles, a maioria delas contraída antes de 1998, quando entrou em vigor a Lei 9.717, que proibiu os institutos de emprestarem dinheiro às prefeituras.
As relações quase incestuosas dos institutos com as prefeituras vêm de longe, dos primórdios do setor, quando a falta de uma legislação mais clara tornava moeda corrente os empréstimos dos institutos à cidade, com as promessas dos prefeitos de devolução do montante em pouco tempo. “Na verdade, no próprio estatuto dos regimes próprios havia uma cláusula que permitia a assistência financeira aos servidores. Com problemas de caixa, alguns prefeitos redigiam e aprovavam projetos de lei nos quais, além do participante, o instituto era obrigado a auxiliar financeiramente o tesouro municipal”, diz o atuário Benedito Passos, do Núcleo Atuarial da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Um dos mais conhecidos casos de empréstimos malfeitos para prefeituras é o da cidade de São Paulo, que na gestão do prefeito Paulo Maluf recebeu R$ 300 milhões do instituto paulista. Duas administrações depois e o caixa da autarquia ainda não viu o dinheiro de volta. Segundo o atual diretor superintendente do instituto paulista, José Roberto Siqueira, que assumiu o instituto com a ascensão da prefeita Marta Suplicy, o valor já corrigido e devido ao instituto chega a R$ 600 milhões. Ele espera que pelo menos R$ 500 milhões da dívida sejam pagos com precatórios do governo do Estado.
Também à mercê das disponibilidades da prefeitura para receber recursos de empréstimos está o regime próprio do município paulista de Jacareí (SP). Somados os valores de dois empréstimos, corrigidos pelos índices Anbid e TFB, com juros decrescentes de 1,6% para 0,6%, o montante devido pela prefeitura ao instituto atingiria R$ 54 milhões. A cifra, no entanto, é contestada pela prefeitura, que fala em uma correção pela taxa de juros legais mínima, contrariando os cálculos do instituto, que utilizou tabela de juros contratuais. “Vamos entrar com uma ação na justiça, para que ela, sim, especifique o valor total”, avisa o presidente do regime, Antônio Gilberto Silvério.
A necessidade de procurar a justiça para resolver questões de empréstimos não é, no entanto, a saída mais procurada pelos institutos. Para Aílton de Carvalho Jr, presidente da Associação Paulista de Entidades de Previdência Municipal de São Paulo (Apeprem) e do instituto de Caraguatatuba, dos regimes próprios paulistas que emprestaram recursos às prefeituras (70% do total) e ainda não foram ressarcidos, a maioria busca uma saída negociada com o devedor, que vai desde um parcelamento até a transferência de imóveis. “Sempre tentamos primeiro um acordo. Mas se a prefeitura não quiser acordo, aí não vejo saída senão a justiça”, comenta Carvalho Jr.
Porém, nem todos os empréstimos às prefeituras são exemplos de desastres. Benedito Passos lembra o caso do instituto previdenciário do município carioca Piraí, de R$ 17 milhões de patrimônio, que em 1998 emprestou R$ 800 mil à cidade para a construção de um distrito industrial com taxa de CDI mais juros de 0,5% ao mês, para ser quitado em 18 prestações. “Com a crise da Rússia naquele ano, a prefeitura preferiu liquidar suas dívidas em seis meses”, conta o presidente do instituto de Piraí (RJ), Afonso José Salles Filho. “O empréstimo serviu para criar mais de 1.500 empregos diretos no distrito e aumentar a arrecadação de impostos, revertidos para obras sociais no próprio município”, assegura o dirigente.

Fundos complementares – Os institutos municipais devem ingressar em uma nova fase assim que for aprovado o projeto de Lei Complementar nº 9, em votação na Câmara, e que prevê a criação dos fundos de previdência complementar aos funcionários públicos contratados após a entrada em vigor desta lei. Para eles, será fixado um limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social e quem quiser se aposentar com o último salário integral terá de contribuir para o fundo complementar.
Com isso, Estados e municípios passarão a dividir os custos das aposentadorias com os servidores, aliviando o caixa do instituto e do Tesouro municipal, que não mais precisarão arcar com o benefício integral aos que ganham acima do teto de R$ 1.430.
A demora na votação do Projeto de Lei Complementar nº 9 é creditada, segundo a Secretaria de Previdência Social, ao desentendimento entre os partidos de oposição e situação quanto ao tipo do plano – benefício definido ou contribuição definida. “Estamos trabalhando com hipóteses, já que o que existe ainda é um projeto de lei passível de mudanças até que seja aprovado”, comenta o atuário Newton Cezar Conde.
Quanto àqueles servidores ativos que ganham menos que o teto e seu instituto participa de um fundo complementar, o atuário Conde entende que eles devem atentar para o fato de que, se forem promovidos e passarem a receber acima de R$ 1.430, terão um benefício futuro menor. “Se um servidor ativo que hoje ganha R$ 1.000 for promovido e passar a receber R$ 5.000, faltando pouco tempo para requerer a aposentadoria, ele vai se aposentar com a renda que conseguiu acumular, e nada mais. Isso porque o tempo que esse servidor contribuiu sobre o novo salário foi insuficiente para montar reserva”, avisa Conde.
Para Vinicius Carvalho Pinheiro, da SPS, mesmo os servidores que ganham abaixo do teto podem contribuir para o fundo complementar, evitando que em caso de promoções e aumento dos salários acima do teto sejam prejudicados na hora da aposentadoria.

Paulistas recebem R$ 70 milhões/mês
Os chamados regimes próprios municipais são o mais novo nicho de mercado a despertar o interesse de bancos e administradoras de ativos. Afinal, apenas de aportes mensais os regimes próprios de São Paulo recebem cerca de R$ 70 milhões mensais, informa o presidente da Apeprem, Aílton de Carvalho Jr.
Entre os mais bem posicionados na disputa do nascente mercado dos regimes próprios paulistas estão o Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Santander (que herdou a estrutura e a rede de contados do Banespa). Mas, além deles, também outras instituições já estão se planejando para atacar esse promissor mercado, que engloba desde pequenos institutos até os chamados “super-institutos”.
Entre esses últimos, o que mais se destaca é o de São José dos Campos, com um patrimônio invejável de R$ 210 milhões. Segundo a diretora financeira do Instituto de São José dos Campos (IPSM), Sandra Maria Garcia de Oliveira, são quase 9 mil contribuintes ativos, com alíquotas de contribuição de 10% e 20% para participante e prefeitura, respectivamente”.
Segundo ela, o IPSM terceiriza a gestão de seus recursos, basicamente com o Banco do Brasil e o Santander-Banespa. “Além de uma extensa carteira investida em renda fixa e variável, também temos participação em fundos”, diz Sandra.