Prá não dançar o tango… | Países discutem internacionalizaç...

Edição 120

Com o sistema previdenciário em colapso, a situação da Ar-gentina suscita debates em vários países vizinhos. Na tentativa de evitar o mesmo caminho dos irmãos do Prata, o Brasil e outros países como México e Peru discutem a necessidade de internacionalizar uma parte das carteiras de investimentos dos seus fundos de pensão.
Na Argentina, a crise começou a se anunciar no final de 2000, quando o governo chamou os gestores de fundos das Administradoras de Fondos de Jubilaciones y Pensiones (AFJP) para ajudar a comprar seus títulos, apesar da exposição das AFJPs às dívidas do governo já ter superado os 50%.
Através de mudanças regulamentares e do estímulo do governo, as administradoras utilizaram seus fluxos internos de 2001para comprar os instrumentos do governo. Quando essa relação chegou a comprometer mais de 80% dos US$ 21 bilhões de ativos em dezembro de 2001, a Argentina declarou moratória e converteu para pesos todas as dívidas antes dolarizadas.
As medidas fizeram o sistema de seguridade social retornar à dependência do governo em honrar suas obrigações. Veja, a seguir, a situação do Brasil, México e Peru e o que estão fazendo no sentido de escapar de destino semelhante ao da Argentina:

Brasil – O Brasil é o país onde a discussão sobre a internacionalização dos investimentos está mais atrasada, em conseqüência de uma antiga pendência que existia com a Receita Federal que assegurava aos fundos de pensão imunidade tributária. Com a queda dessa imunidade no final do ano passado, houve um princípio de discussão sobre o tema no início deste ano, principalmente para constituir os Fundos de Investimento no Exterior, os Fiex, e comprar ADRs.
Mas os próprios fundos de pensão, que gostariam de ter um pouco mais de liberdade de investimento, reconhecem que é difícil, política e fiscalmente, conseguir uma mudança nessa legislação devido à intensa necessidade de financiamento interno e da contração do mercado brasileiro de capitais.
A dívida pública brasileira representa hoje 74% do Produto Interno Bruto (PIB), sendo um dos pontos mais vulneráveis do País na visão dos investidores. Muitos deles têm medo que uma eventual vitória do presidenciável Luis Inácio Lula da Silva, do PT, possa significar um não reconhecimento de parte dessa dívida, gerando perdas para os investidores.
Quase 60% dos ativos dos fundos de pensão brasileiros estão aplicados em renda fixa, sendo a maior parte em títulos do governo. Isso é explicável facilmente pelas altas taxas de juros pagas por esses títulos, de cerca de 18% ao ano atualmente, o que permite às fundações alcançar uma rentabilidade nominal de cerca de 2% a 3% acima da sua meta atuarial, sem risco e sem trabalho. Com isso, esses títulos têm atraído as fundações como o açúcar à abelha.
Mas muitas fundações já acreditam que isso deve mudar no próximo governo, qualquer que seja ele (ver reportagem à página 24), favorecendo as aplicações em renda variável e em novos projetos estruturados. Muitos dirigentes de fundos de pensão gostariam que as regras para investimento no exterior também se tornassem mais abrangentes.

México – No México, o colapso da previdência argentina fez com que alguns legisladores mudassem quase que por completo sua visão sobre as alternativas de investimento para os US$ 29 bilhões de ativos do sistema previdenciário do País. Conhecido como Afore, o sistema consiste de doze companhias privadas que supervisionam a maior parte dos ativos da seguridade social dos futuros aposentados.
Em 2001, grupos representantes de sindicatos fizeram lobby em protesto contra a possibilidade que a Afores investisse em ações do mercado externo, alegando que era muito arriscado. De qualquer modo, esses mesmos grupos – que hoje temem o impacto da crise nas reservas dos trabalhadores – agora apóiam que até 20% dos ativos da Afores sejam colocados nos mercados internacionais.
A atual legislação proíbe investimentos em valores mobiliários estrangeiros, de emissores não-mexicanos. Mas as regras tendem a mudanças. O Senado do País está considerando reformas legais aprovadas pela Casa dos Representativos, que daria ao conselho de administradores dos fundos de pensão autoridade para determinar os tipos de investimentos e os níveis de exposição internacionais dos ativos. O conselho, conhecido como Junta del Gobierno de la Consar, é composto de 15 membros, entre os quais dirigentes da Consar (órgão regulador da previdência mexicana), do Ministério das Finanças, Comissão de Seguros e Valores Mobiliários, da Agência de Seguridade Social e de grupos de trabalho.
Para Isaac Volin, vice-presidente de planejamento da Consar, se o Senado aprovar a medida haverá uma boa probabilidade de que o tema ‘investimento internacional’ venha a ser discutido pela Junta del Gobierno na segunda metade de 2002. “No Consar, vemos essa possibilidade como uma coisa muito positiva”, disse Volin. “Tenho certeza que os argentinos se sentiriam muito melhor se soubessem que, ao menos uma por-
ção de seus ativos, estivesse investida no exterior”, comentou.
Em 30 de abril desse ano, mais de 86% dos ativos do sistema de previdência privada mexicano estavam investidos em instrumentos do setor público – número expressivo, se comparado aos 12% dos valores mobiliários privados.

Peru – No Peru, dois subcomitês do Congresso estão analisando uma medida que poderia aumentar para 40% os montantes locais alocados em ativos internacionais pelos fundos de pensão da AFP. Membros dos subcomitês de Economia e Seguridade Social dizem que a decisão da pauta pode ser alcançada ainda em julho, quando se dá o término da sessão legislativa.
Apesar da aparente vontade política em aumentar o limite dos investimentos externos para 40%, o Banco Central pode ser mais restritivo na hora de liberar as aplicações para outros países. Mesmo com o atual limite de 10% que vigora desde o ano 2000, o BC peruano tem permitido às AFPs investirem no máximo 7,5% do sistema, que soma cerca de US$ 10 bilhões.
A Superintendencia de Bancos y Seguros, que regula as atividades dos fundos de pensão peruanos, expressou que aprova a diversificação em geral. Fazendo referência às reservas do BC peruano, a superintendente assistente das AFPs, Lorena Masias Quiroga, comentou em entrevista que “a discussão parece sempre desembocar na adequação do sistema previdenciário versus o desenvolvimento do mercado de capitais”.
Segundo ela, outro ponto positivo de se permitir investimentos adicionais nos mercados internacionais é a rentabilidade, já que forçar as AFPs a investir localmente poderia saturar os mercados peruanos, reduzindo as taxas de juros artificialmente e diminuindo o retorno dos fundos.
No final de abril, os fundos de investimento no exterior que compunham as carteiras das AFPs tinham um pouco menos da metade do limite permitido pelo BC, de 7,5%, sendo que as Letras do Tesouro dos Estados Unidos eram o item de maior procura. A resolução 223 da Superintendência impõe restrições para os tipos de fundos que podem ser comercializados pelas AFPs. Os fundos precisam ser domiciliados em países com ratings de dívidas triple A, ter 90% de seus ativos investidos nesses países e ações denominadas em dólares.