Edição 278
O pedido de retirada de patrocínio do fundo de pensão PSS enviado à Previc no início do ano envolvendo todos planos patrocinados pelas empresas do grupo Philips, Gibson e Atos Brasil, acendem um sinal de alerta para o sistema. Apesar de ter sido uma decisão da Philips de ordem mundial, o movimento mexe com o mercado por se tratar de um dos fundos de pensão mais tradicionais e antigos do sistema.
Fundada em 1977, a PSS possui cerca de 6,1 mil participantes e patrimônio na ordem de R$ 2,6 bilhões, segundo dados de novembro do ano passado. A entidade esteve entre as primeiras associadas da Abrapp, em 1978. Na época, o diretor do fundo de pensão, Rubens Scuoppo, compôs a primeira diretoria da Abrapp. A PSS também teve em seu quadro de diretores Nelson Rogieri, que presidiu a Abrapp em 1996.
A história do fundo de pensão é marcada por inovações no sistema, entre elas uma das primeiras migrações de um plano de benefício definido para contribuição definida e a oferta aos participantes por perfis de investimento. No início da década de 2000, em uma iniciativa que mexeu com o mercado de fundos de pensão, anunciou a intenção de migrar seus recursos para um PGBL do Bradesco, estratégia que acabou não se concretizando.
Segundo a Philips, que se manifestou apenas por e-mail, a decisão pela retirada de patrocínio foi uma estratégia da empresa, que prevê a redução e eliminação dos riscos previdenciários em seu balanço. A medida foi adotada em âmbito mundial e já implementada em países como a Holanda, em 2014, e Estados Unidos e Reino Unido, em 2015. “A previsão é de que esse processo [de retirada de patrocínio] ocorra em aproximadamente um ano e meio. Durante esta fase, os planos de benefícios serão mantidos em funcionamento sem qualquer alteração”, salienta a Philips em comunicado.
Migração – Atualmente, a PSS oferece dois planos de benefício: o plano B, de benefício definido (BD), e o Plano C de contribuição variável (CV), o qual contempla contribuição definida para os benefícios programáveis e benefício definido para os benefícios não programáveis. Ambos os planos oferecem benefício de risco, como suplementação por auxílio-doença, invalidez e morte.
A Philips informou que vai selecionar uma seguradora para administrar o plano BD. Com isso, os participantes terão a opção de migrar para um plano da mesma modalidade da seguradora. A empresa destaca que garantirá a manutenção do benefício definido nos níveis atuais fazendo um aporte para a seguradora e as patrocinadoras Atos e Gibson estão propensas a tomar a mesma medida. O participante que optar por um resgate ou transferência parcial dos recursos não terá direito ao aporte.
Além de poder transferir os recursos para um plano CD ou BD da seguradora selecionada pela empresa, o participante poderá optar pela transferência para o plano de outra entidade ou pelo resgate dos recursos, no qual há incidência de imposto de renda. Para os novos funcionários, a Philips oferecerá um novo plano de previdência aberta.
Plano instituído – Uma opção que ainda não foi aventada pelos participantes é a criação de um plano instituído para receber a adesão daqueles que não queiram migrar para a previdência aberta. De acordo com o consultor da Gama, empresa adquirida recentemente pela Mercer, João Marcelo Carvalho, nesse caso seria necessária a mobilização de uma associação ou sindicato dos participantes para instituir o plano dentro de um fundo de pensão já existente. Ou então, seria necessário criar um novo fundo de pensão destinado a administrar os planos, neste caso, de contribuição definida, dos participantes que quisessem fazer a migração. Ainda não há informação de alguma mobilização dos participantes nesse sentido, mas como o processo deve durar pelo menos mais um ano, é possível que surja essa proposta ao longo dos próximos meses.
Outra migração a caminho – De acordo com o advogado especializado no setor previdenciário, Fábio Junqueira, do JCMB Advogados e Consultores, mesmo que tenha sido uma decisão com orientação mundial, a saída da PSS indica que é preciso uma mudança de postura dos reguladores. “Estamos em um ano muito delicado para o sistema, pois existe uma questão que vem sendo debatida há muito tempo, que é a forma que a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) vem colocando novas obrigações para o sistema”, destaca Junqueira.
O advogado diz que além da Philips, outra entidade de grande porte deve pedir encerramento das atividades ainda este ano, sem revelar o nome do fundo de pensão. “A retirada de patrocínio de dois fundos de pensão que vão migrar para a previdência aberta é um fato que não pode ser ignorado. Se a Previc não considerar o contexto de crise e olhar com mais cuidado o alto nível de exigências em relação às entidades, a tendência pode ser consolidada”, salienta.
Para Junqueira, a previdência aberta não tem a quantidade de obrigações e altos custos que o mercado de fechada apresenta atualmente. “O mercado de previdência aberta é muito mais bem definido na atuação da Superintendência de Seguros Privados (Susep), em comparação com a Previc”, opina.
Para o novo presidente da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi), Edson Luís Franco, quando se olha para a previdência das empresas, pode haver um movimento de criação de novos planos de previdência tanto abertos quanto fechados. “É um processo de transição. Os novos planos devem adotar um modelo de contribuição definida puro, que pode ser de uma entidade aberta ou fechada. Se for aberta, há certas características quando se refere a escala. Por exemplo, para pequenas e médias empresas mesmo que não tenha riscos atuariais associados ao plano, tem um alto custo se a opção for a previdência fechada”, explica. “A empresa ou vai para um modelo de contratação de entidade aberta, que tem a vantagem da escala, ou opta pelo modelo de plano fechado, e especialmente em caso de planos maiores, pode ter uma vantagem de custo. O que percebemos em termos do mercado de aberta é um crescimento bastante acelerado nos últimos dez anos em todas as modalidades de planos, inclusive empresariais”, diz Franco.
Caso pontual – Na visão do superintendente da Previc, José Roberto Ferreira, há certo exagero ao se falar em tendência de migração para a previdência aberta. “Para o sistema, a PSS sempre foi uma referência. No entanto, esse movimento especificamente aconteceu em todos os países nos quais a Philips tem negócios. É um movimento mundial. Esse caso em específico tem uma questão corporativa e institucional e a lei permite a retirada de patrocínio”, salienta José Roberto. O executivo ressalta que, sob a ótica do estado e compromisso de fomentar a cobertura previdenciária, esse é claramente um movimento indesejável. “Mas não é nosso papel dificultar isso; desde que tenha provisão legal, temos que autorizar a retirada”, complementa.
O consultor atuarial da Willis Towers Watson, Felinto Sernache, reforça a opinião do superintendente da Previc e destaca que o caso da PSS é algo isolado. “Pelo que acompanhei, foi uma decisão estratégica da matriz. Isso não deve ser um elemento propulsor do nosso mercado”, acredita. O executivo destaca que não vê a migração para previdência aberta como algo que esteja acontecendo em grande escala no momento.
Mesmo considerando o caso da PSS como pontual, dados o Ministério da Previdência mostram que o número de entidades fechadas de previdência complementar caiu de 350 em 2005, para 316 em 2014. Naquele ano, apenas uma entidade nova foi criada, enquanto sete foram encerradas (veja tabela). Embora a maior parte da redução de patrocinadoras seja proveniente de processos de reestruturação de empresas, os números indicam claramente que há pouco movimento de abertura de novos planos. Esse fato relacionado aos novos casos de retirada de patrocínio pode indicar um agravamento da situação de estagnação do sistema.