Edição 104
Uma boa rentabilidade em um ano, bem… isso pode ser uma questão de sorte. Já dois anos bons consecutivos não devem ser atribuídos exclusivamente à sorte, pode ser o resultado de uma boa estratégia implementada por uma equipe competente mas, vamos lá … talvez seja conveniente esperar um pouco antes de soltar rojões. Entretanto, quando os resultados batem a meta atuarial há cinco anos como no caso da Eletros, fundo de pensão da Eletrobrás e ONS, o último motivo que vêm à cabeça é a sorte.
No ano passado, a rentabilidade bruta da Eletros sobre seus ativos totais foi de 17,9%, superando em 6 pontos percentuais sua meta atuarial, que era de 11,6%. Em 1999, para uma meta atuarial de 14,6% a fundação conseguiu uma rentabilidade sobre o patrimônio de 44,1%. Um ano antes, em 1998, quando a economia ameaçou entrar em grave recessão por causa da desvalorização cambial e as bolsas despencaram, ainda assim a Eletros obteve uma rentabilidade superior à sua meta, de 11,8% contra 8,9%. Nos dois anos anteriores, 1995 e 1996, também a meta foi batida com facilidade.
Qual o segredo? O principal deles é a estabilidade da equipe de analistas, que tem tido pouquissímas baixas nos últimos anos. Desde que foi constituída, em 1995, por oito estagiários recém-saídos da faculdade, apenas um deixou a equipe, neste ano. Comandada por Luís Guilherme Nobre Pinto, que está há mais de cinco anos na Eletros, a equipe está constantemente aperfeiçoando seus conhecimentos, através de cursos e seminários. Dos seus sete membros, cinco já receberam MBA e dois estão fazendo mestrado, sendo o custo integralmente bancado pela Eletros. Além disso, o fundo de pensão costuma promover cursos internos de aperfeiçoamento profissional, tais como análise de risco e contabilidade.
Outra atrativo da fundação é sua política de remuneração, que mantém competitividade em relação ao mercado e estimula a permanência dos profissionais em seus quadros. Além do salário fixo, cada área conta com um rendimento variável de acordo com a sua performance no ano. “A remuneração variável por área faz com que a equipe cobre resultados entre
si”, conta o diretor financeiro da fundação, Benni
Faerman.
Com estímulos desse porte, a equipe está constantemente em busca de soluções inovadoras. No ano passado, a rentabilidade da carteira de renda variável dependeu, em grande parte, da montagem de uma sofisticada operação de hedge, replicada daquela que foi usada em 1998 e que impediu perdas durante a crise asiática. Naquela ocasião, a Eletros conseguiu evitar a perda de 18 pontos percentuais de rentabilidade na carteira de renda variável. Um ano antes, em 1997, a fundação conseguiu escapar das perdas provocadas pela crise russa através de uma análise apurada da situação, e da adoção de mecanismos de redução da exposição ao risco.
Com esse histórico, o assédio do mercado aos membros da equipe é intenso. O próprio Luís Guilherme, que chefia os trabalhos, já recebeu vários convites para trabalhar em instituições do mercado financeiro. Com MBA em finanças e cursando o final do mestrado pelo FGV, Luís Guilherme poderia seguir a mesma trilha de seu ex-colega de fundação, o economista Alexandre Póvoa, que passou pela Eletros antes de entrar no mundo das empresas de asset management.
Atualmente diretor da asset do ABN AMRO, Póvoa foi um dos únicos a deixar a equipe inicial da Eletros, mesmo assim depois de fazer uma pós-graduação em Nova York. Mas, para Luís Guilherme, continuar na Eletros tem uma explicação – qualidade de vida. “O ambiente aqui é muito bom, há um espírito de cooperação com uma competitividade saudável”, diz ele.
Antes de ir para a Eletros, ele teve uma passagem pela Investidor Profissional. “Quem trabalha no banco não tem condições de estudar, pois não tem hora prá sair”, afirma. Hoje, graças ao horário de trabalho bem definido, Luís Guilherme continua sua formação acadêmica, no que é incentivado pela própria fundação. No ano passado, ele participou de um Congresso na Inglaterra e apresentou um modelo dinâmico de avaliação de solvência produzido por ele, em conjunto com o atuário da Eletros, Sérgio Tinoco.
Homem do risco – Outra peça chave na equipe financeira da Eletros é Jair Ribeiro, o “homem do risco”. Ele chegou à Eletros em meados de 1997, proveniente de outro fundo de pensão, o Real Grandeza, de Furnas. Desde então, já recebeu várias propostas para atuar no mercado financeiro, mas não aceitou. “Desde o início percebi que o projeto era sério e inovador, e estou aqui até hoje”, diz.
Jair Ribeiro, que é também gerente de risco do fundo de pensão, foi o responsável pela montagem da primeira área de análise e controle de risco segregada de outras áreas, num fundo de pensão brasileiro. “Atualmente muitas fundações estão montando áreas de risco segregadas, mas há 4 anos quase ninguém fazia isso”, conta. Economista formado pela PUC do Rio de Janeiro, o profissional fez mestrado em administração pela Coppead (UFRJ), patrocinado pelo fundo de pensão.
Além da área de risco e da equipe de analistas de primeira linha, uma terceira ponta do triângulo também desempenha função essencial na Eletros. A área de compliance, chefiada por Ricardo Teotônio, que foi montada em 1995 quando isso era ainda uma novidade no mercado. Teotônio já trabalha na fundação desde 1994, mas foi só a partir de 1997 que assumiu a gerência da área de controle, que funciona atualmente com uma equipe de 6 pessoas.
A segregação das funções de aplicação, controle e risco, como acontece nas modernas empresas de asset management, já vem funcionando na Eletros desde 1997, como parte de um plano de estruturação das suas operações montado pela consultoria Arthur Andersen e o consultor Nei Brito. A consultoria externa, que chegou a Eletros em 1994, começou a sua tarefa pela contratação de profissionais de mercado, caso de Luís Guilherme e Póvoa para as áreas de investimento, e também de Benni Faerman para ocupar o cargo de diretor financeiro.
Quando assumiu a diretoria financeira da Eletros, em 1985, o economista com pós-graduação em finanças pela FGV-RJ já encontrou o projeto de reestruturação da área. “Cheguei com a missão de implantar um modelo que havia sido proposto pelos consultores externos”, explica Faerman. A contratação do grupo de oito estagiários, dos quais sete permanecem, é fruto desse projeto.
Depois de reestruturar a área financeira e montar a área de controle, faltava apenas criar a área de risco. Isso foi feito dois anos depois, com a contratação de Jair Ribeiro, que estava deixando a Real Grandeza. “Naquela época, nem nas assets era comum a segregação da área de risco”, lembra Faerman. Ele explica que a área de risco veio para consolidar a reestruturação em meados de 1997.
Da equipe inicial que formava a área financeira apenas Póvoa, que saiu para estudar em Nova York, deixou a fundação. “Quando ele voltou, não conseguimos segurá-lo, porque ele voltou muito valorizado dos Estados Unidos”, conta Faerman.
Rotina e resultados – A equipe de analistas da Eletros mantém uma rígida agenda. Há pelo menos uma reunião semanal onde os profissionais mostram suas análises, ficando cada um responsável por dois setores. Com base nas análises, a equipe financeira da Eletros traça seus cenários de investimentos e um plano estratégico de investimentos. Em 2001, por exemplo, a equipe financeira da Eletros delimitou os limites de concentração da carteira de renda variável entre 12% e 25%. “Nas atuais circunstâncias, a carteira de renda variável está parada”, diz Jair Ribeiro.
Ao contrário do que fez em 1998 e 2000, a Eletros não está fazendo trava novamente em 2001. “Não acreditamos em cenário de ruptura, mas a crise argentina tem atrapalhado o desempenho da carteira”, conta Jair Ribeiro (a declaração é anterior aos lamentáveis acontecimentos terroristas ocorridos em Nova York).
O diretor de risco da Eletros comenta que o fundo de pensão tem se revelado conservador nos investimentos, mas progressista nas técnicas. A Eletros foi um dos únicos fundos de pensão a utilizar derivativos nos últimos anos, exclusivamente para hedge. Atualmente, a carteira é formada por ações de primeira linha.
A carteira de renda fixa também tem se beneficiado do espírito de experimentação da equipe da fundação. Neste ano de 2001, a área financeira resolveu realizar uma operação inédita de hedge para a renda fixa. A Eletros comprou DI futuro e travou 30% da carteira pré-fixada. Com esta estratégia, a carteira está rendendo 116% do CDI. Além da rentabilidade, existe a segurança. “Nunca fomos surpreendidos por uma quebra de alguma instituição financeira. Não mantemos papéis com alto risco de crédito”, conta Jair Ribeiro.
Os novos planos da fundação
Se por um lado a Eletros acumula sucessivos resultados positivos na gestão de investimentos, do outro o fundo de pensão enfrenta os desafios de sobreviver em um mercado cada vez mais competitivo. Um dos maiores desafios da fundação é aumentar o número de patrocinadoras e de participantes, com o objetivo de ampliar a escala e reduzir os custos. “As empresas de previdência aberta podem fazer planos individualizados e para o mercado. Nós só podemos fazer planos para empresa. Precisamos ter escala para competir”, afirma Ruderico Ferraz Pimentel, presidente da Eletros.
O fundo de pensão está saindo à mercado para buscar a adesão de novas patrocinadoras. Como atrativo, além da perspectiva de boa rentabilidade das reservas, a fundação apresenta um baixo custo para a administração dos planos, atualmente girando em torno de 1% ao ano.
Outro desafio da Eletros é a abertura do processo de migração do plano de benefício definido para o de contribuição definida. O fundo de pensão já planejava ter realizado a migração, com o objetivo de reduzir os riscos do passivo, no primeiro semestre deste ano. Mas dificuldades envolvendo mudanças na legislação dos fundos de pensão e demora na aprovação pelos órgãos reguladores atrasaram a mudança. A tendência é que a migração fique para o início do próximo ano. Com a migração, a direção da Eletros espera atrair novas patrocinadoras com mais facilidade.