O pomo da discórdia | Regulamento mais duro e oneroso desagradou ...

Edição 368

Biagi,Jarbas de(Abrapp) 23jun 01Publicada em dezembro de 2023 no Diário Oficial da União, a Resolução 59 do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) segue dando pano para manga entre entidades e associações da área. Ela estabelece regras mais duras e onerosas para retirada de patrocínios de planos previdenciários, desagradando algumas empresas patrocinadoras que tentam fugir dos seus rigores invocando normas da resolução anterior, a 53, em seus pedidos de retirada.
“A Resolução 59 é fruto de uma preocupação com o aspecto social. Ela não acaba com o direito de retirada de patrocínio, porque isso tem previsão na lei. Mas estabelece que seja feita com proteção maior ao participante”, explica o presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), Jarbas de Biagi.
Entre outros pontos, a Resolução 59 obriga as empresas interessadas em retirar seus patrocínios dos fundos a: elaborar um Plano Instituído de Preservação da Proteção Previdenciária e criar um Fundo Previdencial de Proteção da Longevidade. Além disso, prevê que não haverá devolução de nenhum tipo de recurso às empresas. “São instrumentos que tornam a retirada menos traumática para os participantes”, avalia De Biagi.
Com a implantação desse novo regulamento, o primeiro semestre de 2024 trouxe uma série de repercussões entre as empresas patrocinadoras. A Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) imediatamente arquivou, em fevereiro, os 72 requerimentos de retirada feitos anteriormente, com base na Resolução 53, que ainda não haviam sido analisados. E nos últimos meses, o que se viu foram reclamações, pedidos de reconsideração e até ações na Justiça.
Diretor de Licenciamento da Previc, Guilherme Campelo, argumenta que a superintendência, “como órgão supervisor, está apenas seguindo a nova resolução”. Segundo ele, o texto da nova resolução “reflete uma grande preocupação do governo. A principal motivação da atualização é em relação às privatizações das companhias”, esclarece.
Das 72 patrocinadoras que tiveram os requerimentos de retiradas arquivados, seis Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) decidiram entrar com pedido de reconsideração. São elas: Fundação Libertas de Seguridade Social, IcatuFMP, EnergisaPrev, MultiBRA Fundo de Pensão, Silius e Mauá Prev.
Campelo foi o responsável por avaliar estas considerações e decidiu indeferi-las. “Fiz o que a nova resolução determina que eu faça”, garante. “Em momento nenhum proibimos o direito de retirada de patrocínio. Isso é legítimo e ficará na legislação. Mas somos um órgão fiscalizador, temos de cumprir o que o CNPC demanda. Houve uma nova diretriz e estamos seguindo, sob pena de sermos responsabilizados judicialmente se não cumprirmos.”

Campelo,Guilherme(Previc) 24jul 02Artigo 26 – O principal ponto de discordância entre patrocinadoras e Previc é em relação ao artigo 26 da Resolução 59. Ele determina que o novo texto “aplica-se aos processos de licenciamento de retirada de patrocínio em andamento, pendentes de autorização pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar”, ou seja, coloca sujeitos à aplicação da nova regra os processos que já estavam em curso.
“O artigo foi criado com o princípio de retroagir para beneficiar o participante naquele momento em que ele está tendo o direito dele retirado”, aponta Campello. “A partir da publicação, o ato passa a valer imediatamente. E os processos que estavam em curso foram indeferidos pela Previc para proteção dos participantes e assistidos, com base no artigo 26.”
As patrocinadoras entendem que o tal artigo não poderia ser aplicado, uma vez que consideram que a lei não deve retroagir para prejudicá-las. “Pediram a tutela antecipada, mas aí é que está: o artigo não está prejudicando ninguém, e sim protegendo o direito adquirido do participante. Você estaria prejudicando o direito do participante e do assistido se agisse de outra forma”, afirma o diretor.
“As patrocinadoras não querem trabalhar com a retirada sob a nova resolução, porque a 59, de forma bem resumida, trouxe oneração no custo de retirada, seja nas reservas, na impossibilidade de levar um possível saldo ou até na questão da criação dos fundos e planos de proteção. Então, sem dúvida, ficou muito mais cara a saída do patrocinador”, resume De Biagi.

Ações na Justiça – Insatisfeitas com as decisões da Previc, três entidades e/ou patrocinadoras decidiram recorrer à Justiça para tentar fazer valer o direito de terem seus pedidos de retirada julgados ainda com base no texto previsto pela Resolução 53. São elas: Itaúsa, Enel (patrocinadora da Vivest) e Banesprev.
A Enel teve sua ação ordinária indeferida, assim como aconteceu com o pedido de mandado de segurança do Banesprev. O mandado de segurança da Itaúsa ainda não foi julgado, mas, para Campelo, a demora na decisão do juiz era sinal favorável à Previc. “Ele deve indeferir. Já faz mais de um mês da ação, e ainda não teve liminar”, argumenta.
Tanto o diretor da Previc quanto o presidente da Abrapp apontam o que consideram uma incongruência no comportamento dessas empresas que se rebelaram contra a implementação da nova regulamentação. Afinal, os representantes das patrocinadoras fizeram parte da votação unânime do CNPC que aprovou a Resolução 59.
“A resolução foi aprovada por unanimidade no CNPC, depois de muitos debates. E o CNPC tem representantes das entidades, dos participantes, mas também dos instituídos e patrocinadores. Então, se a resolução teve unanimidade depois de uma longa discussão, é porque chegou-se à conclusão de que ela aconteceria em prol dos interesses de todo o segmento naquele momento”, aponta De Biagi.
“As patrocinadoras participaram da aprovação, porque têm direito a assento no CNPC. Não questionaram o texto no Conselho, mas questionam no Judiciário? Acaba sendo meio contraditório, porque a ata foi assinada, essas empresas tiveram conhecimento. Então, não podem questionar a legitimidade”, diz Campelo.

Posicionamento das empresas – Investidor Institucional tentou conversar com as três empresas que entraram na Justiça para impedir que seus casos fossem julgados com base na Resolução 59. As empresas Itaúsa e Enel avisaram, por meio de suas assessorias, que não iriam se manifestar sobre o caso. Já o Banesprev não respondeu às tentativas de contato da reportagem.
Em meio ao imbróglio, Abrapp e Previc torcem para que estas medidas judiciais sejam decididas e encerradas o mais breve possível. “A ação judicial, embora seja direito constitucional, sempre gera desgaste. O tempo perdido, essa demora para prestação jurisdicional, desgasta todas as partes. Se a ação é movida contra a Previc, não é só a Previc que sente. É todo o sistema, as entidades, as patrocinadoras, os participantes, os assistidos… O segmento inteiro sente”, lamenta De Biagi.
“Precisávamos de um meio termo entre as vontades do empresário e do trabalhador, especialmente nesse caso, que são de pessoas mais velhas, que precisam da assistência. E conseguimos esse equilíbrio com a Resolução 59, tanto que eles mesmos (patrocinadores) assinaram, concordaram com a nova resolução. Está tudo registrado”, encerra Campelo.