Montando portfólios sustentáveis | EFPCs são precursoras da adoçã...

Edição 352

Até fevereiro de 2023 a Vivest deverá ter aprovada e registrada uma política específica sobre como tratar a questão climática, além de ter uma metodologia consolidada para medir as emissões de carbono dos portfólios. Elaborada com o auxílio da consultoria externa Resultante/KPMG, a nova abordagem prevê também uma metodologia de engajamento, que está sendo redigida agora, para avaliar os objetivos, com quem e como fazer para monitorar o sucesso dessas iniciativas, explica a chefe de pesquisa da fundação, Luciana Puccetti.
Recém chegada do encontro do PRI em Barcelona, Puccetti observa que a ênfase do debate global continua no clima, com um início de discussões sobre questões de direitos humanos. “No encontro, ouvimos casos de fundos de pensão australianos e ingleses, por exemplo, que fazem engajamentos com começo, meio e fim. Nossa estratégia não é de desinvestir em determinadas empresas, mas engajá-las, até porque nosso universo de companhias aqui é muito restrito e porque acreditamos ter maior impacto positivo como acionistas”, afirma.
A entidade acaba de referendar e formalizar, ainda, uma metodologia ESG com rating nas três dimensões: social, ambiental e de governança, que serão utilizados para sinalizar aos gestores no comitê de investimentos sobre reduções ou aumentos de posições com base em scores que modulam as posições fundamentalistas. A experiência prática, entretanto, já está em pleno vigor e em recente IPO a entidade desistiu de participar da operação porque havia questões de governança que não deram o conforto suficiente para fazer o investimento. “Foi um caso específico, mas de modo geral está tudo muito integrado aos nossos processos e certamente impactou as tomadas de decisão”, diz Puccetti.
A adoção de critérios de exclusão ESG não faria sentido, lembra Paulo de Sá, gerente executivo de investimentos em renda variável e imobiliários. Se fizéssemos lista negativa de empresas, eliminaríamos pelo menos 30% dos papéis do Ibovespa e isso criaria um problema fiduciário para a fundação”, diz. Além disso, listas negativas reduziriam muito o poder de engajamento e o potencial de retorno porque as empresas em transição são as que têm maior potencial de rentabilidade.
“O engajamento é o mais importante para o investidor institucional de grande porte no Brasil, porque a união dos investidores é essencial e vamos agora fomentar e detalhar mais o nosso engajamento, seja ele feito de forma individual ou coletiva”, informa Sá.
Os dois novos tópicos aprovados para 2023 – política climática como item específico e questões de governança – virão somar-se a outro passo relevante, a aprovação, há dois meses, da nova política de votos definida pela Vivest. “Essa política utiliza parâmetros básicos da Anbima e, por esses padrões, seríamos obrigados a votar apenas em duas companhias, o que é pouco, mas também não temos como acompanhar as 140 empresas investidas”, explica Sá.
Em função disso, o comitê de renda variável irá eleger uma lista de empresas a serem acompanhadas e nas quais a entidade exercerá poder de voto em 2023. Hoje a sua maior carteira de longo prazo tem 23 ações, o que já ajuda a delimitar um universo. “Lá fora há várias empresas que fazem esse trabalho, que é gigantesco, mas aqui não há quem faça isso, a não ser algumas empresas globais e cujo custo ficaria muito elevado”, explica. “Então, os próprios investidores precisam acompanhar as atas, verificar os temas em discussão, analisar se devem votar ou não e comparecer para votar”.
Construir uma política de investimento responsável em temas ligados ao clima esbarra na falta de dados das companhias, sem os quais é impossível construí-la, daí a importância de contar com uma consultoria externa. “Hoje as nossas carteiras já têm rating ESG melhor do que o Ibovespa e, no movimento que fizemos em 2021 para reduzir em 90% nossa alocação em fundos no exterior- por sorte, diante do que ocorreu no mercado global de lá para cá -, os 10% que restaram estão em fundos como o Climate, da Nordea, e em BDRs ESG”, diz Sá. No mercado local, a alocação tem sido aumentada ou reduzida de acordo com as notas ESG.
A Vivest, com R$ 32 bilhões em ativos, tem três grandes fundos de renda variável de gestão própria em que os diversos planos de benefícios entram como cotistas e em todos eles a questão ESG aparece acoplada. O maior deles, um fundo que investe em empresas de qualidade, é fundamental para o ESG por ser de médio e longo prazos e tem como meta IPCA mais 8%. É o que tem dado maior retorno no médio prazo, mesmo em tempos difíceis para a bolsa. O fundo de oportunidade, por sua vez, não usa scores porque é de total return, mas também ganhou do Ibovespa este ano em critérios ESG. Tudo isso ainda é pouco, analisa Sá, diante do que poderá ser feito no futuro em relação ao investimento sustentável.

Na Previ, uma das principais iniciativas do ano foi a revisão do Código Previ de Melhores Práticas ASGI (responsabilidade ambiental, social, de governança e integridade), que era o antigo código de governança corporativa da entidade, de 2004. O novo documento, divulgado em dezembro, incorporou essas práticas para nortear o acompanhamento e a análise dos investimentos nas empresas participadas, avaliar a qualidade do disclosure dos temas materiais e identificar e mensurar riscos ASGI no portfólio, segundo explica Fernando Melgarejo, diretor de participações. O novo código deverá fundamentar as tomadas de decisões e a proposição de ações voltadas ao crescimento sustentável das companhias investidas.
“A mudança principal é estrutural, com a inclusão de novos conceitos. Modernizamos o Código para o debate avançar”, afirma Melgarejo. Havia, por exemplo, dificuldade para entender como as companhias estavam posicionadas sob óticas específicas nas áreas ambiental, governança e outras, mas a revisão deve permitir olhar para as empresas como o mercado está olhando, de maneira segmentada por critérios. “Além disso, incluímos um capítulo só para a questão climática e as megatendências”, conta.
Outra novidade é a elaboração de um plano de ação específico, ainda em fase final de construção, para a transição do portfólio sob as óticas ASGI, megatendências e mudanças climáticas. O plano integra o planejamento estratégico da entidade e terá foco no monitoramento do cumprimento dos compromissos públicos de redução das emissões das principais empresas do portfólio e também numa análise da transparência das informações divulgadas por essas companhias, detalha Melgarejo.
“Fizemos também um trabalho de engajamento nas empresas que compõem o IBRX 100. Ao todo, foram 100 engajamentos realizados neste semestre, sendo 30 deles bilaterais, ou seja, a fundação,como acionista, engajando diretamente a companhia, e os outros 70 no modelo coletivo”, explica. Os engajamentos envolveram diretorias, conselhos e áreas de relacionamento com o investidor das empresas, para incentivar a adoção de medidas que tratem de gaps sensíveis identificados pela análise interna da entidade. Já no caso dos engajamentos coletivos, o trabalho é feito por meio do PRI, CDP (Carbon Disclosure Project) e do IPC (Investidores pelo Clima), iniciativas das quais a fundação é signatária. “No próximo ano, faremos o mesmo movimento”, diz.
A maior preocupação não é com a ordem de grandeza, mas sim com a qualidade dessas ações e o objetivo atual é ter participações em assembleias que sejam mais ativas. “Estamos procurando atuar de forma mais efetiva, construtiva, colocando a opinião da Previ em relação às matérias colocadas para deliberação nas assembleias”, afirma. A carteira hoje é composta por 50 empresas e o objetivo é passar a atuar de forma mais efetiva, o que significa colocar a opinião da Previ mais fortemente em relação às matérias apresentadas para deliberação.
Entre os casos em que é necessária essa atuação mais firme, ele cita três exemplos: o acúmulo das funções de CEO e chairman, uma prática à qual a Previ se opõe; a não instalação de um Conselho Fiscal, órgão que faz parte de uma estrutura de governança adequada e portanto é compreendido pela fundação como essencial, e as politicas de remuneração. “Acreditamos que a remuneração deve estar sempre atrelada ao resultado da companhia, à criação de valor e também às questões ASGI”, explica. Essas recomendações constam do Código e também da política de voto da entidade.
Embora alguns resultados do engajamento sejam obtidos a curto prazo, ele lembra que na maioria dos casos o resultado é de médio e de longo prazo porque não são mudanças que podem ser realizadas de forma imediata. “Isso tem a ver com o próprio trabalho da Previ, com o nosso horizonte de investimento, que é de longo prazo, então tentamos fazer com que as companhias criem um ambiente para que o acionista possa monitorar isso, não apenas no Relatório Anual, que é uma vez ao ano, mas que ela dê transparência as metas de ASG e cronogramas. Sabemos que a mudança vem no médio e longo prazo, mas queremos acompanhar como ela está caminhando.
As análises são consideradas para o rating ASGI, ferramenta da entidade para fazer análise de risco e oportunidade alimentada pelo que as companhias fazem. “Sob a ótica de risco, se uma companhia promete algo e não cumpre, eu passo a olhar aquele ativo com mais atenção. E é também uma ferramenta de oportunidade porque tem empresas que tem uma vertente forte de inovação para ASGI que podem ser boas oportunidades para investimento”, observa.
A meta de engajamento é semestral e a cada semestre surgem novas metas com base nas análises dos questionários ASGI. “A gente fecha o ano, faz o subtotal e de acordo com as novas análises, faz outros planos de atuação. Fazemos o acompanhamento e traçamos novas metas, que não são divulgadas por serem estratégicas. Mas estamos sempre nos aprimorando e procurando a evolução do portfólio sob a ótica do risco ASGI”, conclui.

Dona de um modelo próprio de análise ESG há dez anos e uma das primeiras entidades a lançar um manual de sustentabilidade, signatária do PRI e do CDP, a fundação Real Grandeza levará esses princípios para o seu novo desenho de investimentos. “Estamos deixando de fazer gestão de ativos para adotar um modelo mais alocador, com maior presença de gestão externa, terceirizada. Na mesma direção, estamos atualizando o manual para revisitar o ESG e fazer uma atualização de sua aplicação”, explica Patrícia Queiroz, diretora de investimentos.
Com o aumento do número de gestores externos, será preciso verificar como cada um deles trata os critérios de sustentabilidade, o que deverá contribuir para um efeito multiplicador porque incentivará os gestores a ter modelos ESG melhores, acredita Queiroz. “A partir do momento em que atuo mais com os fundos, posso alavancar ainda mais o processo todo”, explica. O manual permite separar a atuação do gestor externo e inclui o ESG não como fator excludente mas como um diferencial na seleção dessas casas. Serão atribuídas notas melhores a quem tiver práticas mais orientadas por esses princípios.
No modelo anterior, a fundação já utilizava inclusive listas de vedação de setores e empresas, mas agora, com o stock picking deixando de ser feito dentro de casa, não há vedações previstas. “O trabalho será feito de acordo com as práticas de cada gestor e vamos priorizar os melhores modelos, então vamos querer saber se eles são signatários do PRI e se os fundos têm esse comprometimento com o tema”, diz.
A mudança deverá representar também um avanço em relação às práticas de seleção de empresas que eram adotadas pela entidade, por meio de envio de questionários. “Agora poderemos fazer isso com um conjunto de gestores, o que dará mais força ao processo”, espera. A fundação já aprovou os gestores para as classes de renda variável passiva e, mais recentemente, os de multimercados, que ainda não começaram a fazer alocação. O próximo passo será selecionar os gestores de fundos ativos de renda variável e, mais adiante, os de renda fixa/crédito e fundos imobiliários (FII).
O menor apetite ao risco por conta do cenário de juros altos não afeta os produtos com critérios ESG, avalia a diretora, uma vez que o investidor pode fazer uma seleção de ativos sustentáveis que ajuda a reduzir o risco de forma geral em seus investimentos. Os ativos sustentáveis deverão ter presença mais forte na parcela de renda variável ativa, o que significa também uma melhoria do modelo dessa classe como um todo. Com ativos totais de R$ 18,2 bilhões, a fundação tem hoje 23,1% dos ativos do seu plano CD e 16,1% do plano BD aplicados em renda variável. Em ETFs, os percentuais são de respectivamente 16,9% e 11,5%.

A Prevcom – Fundação de Previdência Complementar do Estado de São Paulo – adotou este ano duas iniciativas para incorporar cada vez mais os critérios de sustentabilidade à sua carteira de investimentos. Com R$ 2,54 bilhões em ativos, 7% dos quais estão aplicados em renda variável, a entidade contratou em junho uma consultoria externa que montou um “termômetro” ESG para a alocação nessa classe, informa Francis Nascimento, diretora de investimentos. “A carteira de renda variável como um todo passa por essa avaliação, que gera uma nota ESG baseada nas notas conferidas a cada papel”, explica.
Em setembro veio uma segunda iniciativa, que transformou a agenda da sustentabilidade em exigência para todos os novos gestores contratados. “Nossa gestão é 100% terceirizada e, embora na atual carteira de investimentos – renda fixa, renda variável, exterior, multimercados e FIPs – , as oito casas gestoras já façam análise de sustentabilidade, agora decidimos tornar isso uma exigência na seleção dos novos fundos e temos aplicado desde setembro”, detalha. Atualmente, 95 % da carteira tem gestores signatários do PRI (Principles for Responsible Investments).
Ser signatário do PRI é o mínimo exigido, mas os gestores também precisam mostrar que têm forte preocupação com o tema e detalhar como desenvolvem essa área em suas assets. “Eles precisam ter essa preocupação e ela tem que constar de suas agendas, então toda seleção de novos fundos incluirá o ESG como uma exigência”, diz. O assunto fazia parte das preocupações da entidade há algum tempo e havia a meta de implementar algum sistema que acompanhasse melhor os ativos já existentes nas carteiras. “A expectativa é ir ampliando aos poucos essas iniciativas, para tornar toda a carteira de investimentos mais alinhada a esses princípios”, conta Nascimento.