Medidas para os primeiros cem dias | Grupo de Trabalho de Previdê...

Edição 352

Por quase um mês, um grupo de cerca de duas dezenas de pessoas reuniu-se diariamente no Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB) para discutir medidas a serem tomadas da área de previdência nos primeiros 100 dias do governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. A primeira delas é a recriação do Ministério da Previdência, nos moldes em que funcionou no seu segundo mandato, de 2007 a 2010. As medidas, discutidas pelo Grupo de Trabalho da Previdência, um dos trinta grupos técnicos que atuaram no gabinete de transição, foram encaminhadas à coordenação do gabinete e serão enviadas ao futuro ministro da Previdência assim que for nomeado pelo presidente Lula.
O diagnóstico abrangeu duas áreas, fundamentalmente, que são o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e a previdência complementar fechada. Das vinte pessoas que compunham o GT da Previdência, a maioria voltou-se ao tema INSS, e apenas duas dedicaram-se ao tema da previdência complementar fechada. “É um segmento muito específico, poucas pessoas têm conhecimento do seu funcionamento”, explicou o coordenador desse tema no GT, Fabiano Silva dos Santos.
Santos participa do sistema de previdência complementar há mais de uma década, tendo atuado como chefe de gabinete da Funcef, o fundo de pensão da Caixa, de 2009 a 2011. Após isso passou a atuar através do escritório de advocacia Mollo e Silva Advogados, que mantém com a esposa e sócios, em processos sobre multas e punições aplicadas pelos órgãos reguladores contra fundações e dirigentes de Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC).
Indicado para a primeira equipe de transição, Santos convidou o ex-superintendente da Previc e ex-presidente da Funpresp-Exe, Ricardo Pena, para compor com ele o núcleo de diagnóstico sobre a previdência complementar. Juntos, eles receberam no CCBB dirigentes de entidades e associações previdenciárias, dirigentes de sindicatos, além da Abrapp, Anapar e associações de RPPS. “Fizemos reuniões com todos eles e coletamos sugestões de alterações em regras e eliminação de resoluções”, diz Santos.
Segundo ele, uma das principais preocupações que o GT teve foi com relação ao fomento do sistema de previdência fechada, que nos últimos anos estaria perdendo espaço para a previdência aberta. Segundo dados do Ministério do Trabalho e Previdência, os recursos acumulados pelas entidades fechadas aumentaram de um total de R$ 681 bilhões para R$ 1,15 trilhões entre 2013 e julho deste ano, enquanto nas abertas os recursos passaram de R$ 402 bilhões para R$ 1,19 trilhões no mesmo período. Ou seja, se em 2013 as abertas tinham 59% do total detido pelas fechadas, em julho deste ano passaram a ter 103,5%, ou seja, superam as fechadas em volume de recursos num prazo de nove anos.
O número de entidades fechadas caiu de 378 para 317 no mesmo período de nove anos, fruto de fusões de patrocinadoras em vários casos mas também de retirada de patrocínio em outros. “Queremos, de certa forma, dar um breque no avanço das abertas em relação à essa importante massa de recursos da previdência complementar fechada”, diz Santos. Segundo ele, uma das medidas propostas pelo GT é de rever a legislação de retirada de patrocínio, adotando ao mesmo tempo mecanismos de incentivo tributário como alíquota zero à recursos que fiquem no sistema por prazos mais alongados. Esse último mecanismo, no entanto, não faz parte do rol de sugestões do GT da Previdência, uma vez que a missão do grupo é indicar medidas urgentes para os 100 primeiros dias de governo e não políticas estruturantes de médio e longo prazo.

Mas embora extrapolando o foco das medidas urgentes dos 100 primeiros dias, o GT analisou alguns aspectos macro do processo de fortalecimento das entidades fechadas. Uma das coisas fundamentais, segundo Santos, seria delimitar mais claramente os campos de atuação das previdências fechadas e abertas. Entre outras coisas, seria importante deixar claro que não há espaço para o renascimento da proposta de medida provisória sugerida pela ex-superintendente da Susep e atual diretora de crédito à infraestrutura do BNDES, Solange Paiva Vieira, criando uma agência nacional de previdência complementar que una Previc e Susep. Também seria importante olhar com atenção a regulamentação da norma da Emenda Constitucional 103, que abre a gestão de planos de previdência complementar de entes federativos para entidades de previdência aberta, para não prejudicar as entidades fechadas.
Na opinião de Santos, há também a necessidade “de disciplinar o ato regular de gestão no sentido de oferecer mais segurança jurídica às decisões dos dirigentes das EFPCs e ao processo de supervisão baseada em riscos, a ser aperfeiçoado pela Previc”. Segundo ele, do jeito que está, “hoje dificilmente as pessoas se habilitariam a ser dirigentes de fundos de pensão, dado a subjetividade com que a Previc conduz a questão das infrações. É importante que se tenha uma padronização do ato regular de gestão”, diz.
Na avaliação de Santos, houve um excesso regulatório por parte do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) nos últimos quatro anos, período em que foram editadas 25 Resoluções que, segundo ele, “impuseram custos normativos crescentes às operações das Entidades Fechadas de Previdência Complementar”. Em relação à Previc, ele avalia que a autarquia adotou verdadeira “usurpação de poderes” nos últimos anos em relação ao CNPC.
As sugestões do GT da Previdência, a serem enviadas ao futuro ministro da Previdência, são as seguintes:
n Recriar o Ministério da Previdência, na mesma estrutura que existia no segundo mandato do presidente Lula;
n Recriar a Secretaria de Política de Previdência Complementar, com o objetivo de estabelecer diretrizes políticas macro e atuar no sentido de fomento do sistema;
n Suspender quaisquer novas medidas por parte do CNPC até a posse do novo ministério. Atendendo ao pedido do GT, a última reunião do CNPC deste ano, ocorrida em 14 de dezembro, resolveu prorrogar por seis meses, de 31 de dezembro de 2022 para 30 de junho de 2023, a adoção de medidas para a operacionalização do CNPJ por plano;
n Criar grupo de trabalho quadripartite na área de previdência complementar, formado por representantes do Estado, participantes/assistidos, patrocinadores e entidades, para fazer uma revisão normativa do setor logo no início de funcionamento do recriado Ministério da Previdência Social, a exemplo do que foi feito no 1º mandato do presidente Lula quando se revisaram as normas à luz das então recém criadas Leis Complementares 108 e 109, editadas em 2001;
n Rever a Resolução 15/2022, referente à retirada de patrocínio. Segundo Santos, “a norma de retirada de patrocínio enfraqueceu o sistema de previdência fechada, houve uma enxurrada de pedidos de retirada de patrocínio, mais de 100 neste ano”. Ainda de acordo com ele, “se for mantido como está, levará a uma completa destruição do sistema fechado”;
n Analisar a possibilidade de suspender temporariamente, a partir de 1º de janeiro de 2023, as contribuições extraordinárias impostas aos participantes e assistidos para financiar o plano de equacionamento dos déficits nas EFPCs. Segundo Santos, muitos déficits apresentados são conjunturais e os planos podem ser recuperados, então a sugestão de suspender temporariamente esse mecanismo é tomada no sentido de “não prejudicar tanto os participantes e até os patrocinadores”;
• Melhorar os processos de licenciamento, sobretudo para se evitar a chamada “financeirização” dos planos previdenciários, passando a exigir cobertura de invalidez, pensão por morte e sobrevivência, e um percentual de contribuição suficiente para bancar a taxa de reposição dos benefícios dos servidores públicos ligados aos Entes Federativos obrigados pela Emenda Constitucional 103 a implantar o Regime de Previdência Complementar;
• Alterar/revogar 16 atos normativos da previdência complementar, incluindo a edição de um novo decreto do processo administrativo sancionador, em substituição ao Decreto nº 4.942, de 2003;
• Aperfeiçoar a Resolução CMN nº 4.994, que regula os investimentos das EFPCs, com a reabertura do segmento de aplicação em imóveis e melhoria da carteira de infraestrutura (via Fundos de Participações e debêntures de crédito);
• Revogar a Instrução Previc nº 42, de 2021, que obriga as EFPCs ao provisionamento do risco de crédito dos ativos financeiros pertencente ao seu portfólio a partir de 1º de janeiro de 2023;
• Revogar a Resolução CNPC nº 43/2021 sobre marcação à mercado dos títulos e valores mobiliários das EFPCs;
1 Revogar a Resolução CGPAR nº 37/2022 que trata dos parâmetros dos planos de benefícios das estatais federais;
• Mudar a representação nos Colegiados do CNPC e CRPC, tornando-a paritária e evitando o conflito de interesse dos representantes (auditores e procuradores) da Previc nos julgamentos administrativos dentro da Câmara de Recursos;
De acordo com Santos, o levantamento dos problemas e o diagnóstico do segmento de fundos de pensão e RPPS foi feito num período de quase trinta dias, entre meados de novembro e início de dezembro.