Entre a cruz e a espada | Para não ferir a lei, municípios mantém...

Edição 85

A aplicação da lei de responsabilidade fiscal, aprovada no início de maio deste ano, está levando os fundos e institutos de previdência municipais a postergar o aumento das alíquotas necessário ao seu equilíbrio atuarial. Com as despesas de pessoal estourando o limite estabelecido por lei – de 54% da receita corrente líquida – muitas prefeituras estão impedidas de aumentar as alíquotas até que encontrem outra solução capaz de reduzir os custos.
A lei de responsabilidade fiscal estabelece até o final de abril do ano que vem o prazo para que estados e municípios reduzam pela metade o seu desenquadramento em relação aos limites impostos por ela. A outra metade deve ser solucionada no ano subsequente. As penalidades aos infratores vão desde a suspensão dos repasses constitucionais até pesadas multas à pessoa física de prefeitos ou funcionários responsáveis. Além disso, tramita no Senado um projeto de lei que permitirá até mesmo a prisão dos envolvidos em infrações graves, entre as quais está o desequilíbrio dos regimes próprios de previdência.
Os poderes executivos têm até o dia 30 de setembro para enviar às Câmaras suas previsões orçamentárias para 2.001, dentro das novas regras. Como o ‘calcanhar de Aquiles’ da maioria dos estados e municípios é gasto com pessoal, essa conta afeta diretamente os fundos previdenciários e suas metas de ajuste.
A cidade de Diadema, na grande São Paulo, é um exemplo. O superintendente do Instituto de Previdência dos Servidores de Diadema (Ipred), Israel Frutuoso dos Anjos, conta que os estudos atuariais apontam para uma necessidade de elevação das contribuições da prefeitura dos atuais 10% para 12,83%, e dos servidores dos atuais 5% para uma faixa entre 7% e 11%, de acordo com o salário que recebem.
No entanto, Anjos considera difícil qualquer aumento esse ano, pois os gastos do executivo com pessoal já superam o limite de 54%. “Nos primeiros meses do ano que vem, o novo prefeito terá de sentar com todo mundo para encontrar uma solução”, diz.
Anjos, que também é tesoureiro da Associação Paulista de Entidades de Previdência Municipal (Apeprem), acredita que será muito difícil para os municípios cumprirem os ajustes no prazo estabelecido pela lei. “Só daqui a quatro anos vamos saber como ficarão todos esses ajustes e os regimes próprios de previdência”, arrisca.
Já a prefeitura de São José do Rio Pardo (SP) está em meio a uma renegociação com o seu instituto previdenciário para acertar uma dívida passada. A dificuldade é justamente fechar um acordo que se encaixe dentro dos limites legais. “Acabamos de iniciar as conversas e ainda não temos nada concreto, mas sabemos que estamos em cima do limite de 54%. Até um feriado, que implica no pagamento de horas-extra para os funcionários de serviços básicos como pronto-socorros e saneamento básico, nos faz estourar as despesas com pessoal”, desabafa o secretário de administração, Domingos Galati.
Assim como esses dois exemplos, grande parte dos regimes próprios reivindica a elevação das alíquotas e o acertos de dívidas passadas para colocá-los em ordem. Até pouco tempo atrás, além dos institutos ou fundos de previdência não serem levados a sério pelas prefeituras, que constantemente atrasavam aportes e sequer repassavam o desconto dos servidores, sua criação tinha pouca base técnico-atuarial.
Mas, a partir da Emenda Constitucional nº20, reforçada com a lei de responsabilidade que impinge penas severas a atrasos e desvio de recursos, esse quadro mudou. Agora, o Ministério da Previdência vai fiscalizar de perto a viabilidade atuarial dos regimes próprios.

Aposentados – Quem não conseguir se adequar aos novos limites e quiser transferir os servidores para o INSS, poderá ver-se frente a gastos ainda maiores do que teria com as contribuições aos fundos e institutos previdenciários. “Os prefeitos terão de se conscientizar e reduzir os gastos. A saída será investir na capacitação do servidor para oferecer qualidade nos serviços”, comenta o advogado Walter Peninque, da consultoria paulista Conam – Consultoria em Administração Municipal, que tem mais de 100 cidades em sua carteira de clientes. “Tem muita prefeitura que sequer começou a se adequar à lei, porque acham que ela não vai pegar”, acrescenta.
As prefeituras dispõem de mecanismos legais para reduzir a massa do funcionalismo, tais como: cortar até 20% do número de cargos comissionados; demitir servidores não-estáveis e reduzir a jornada e salários dos servidores estáveis.
Outra alternativa seria transferir a responsabilidade pelo pagamento de aposentados aos fundos ou institutos previdenciários, só que para isso é necessário que essas entidades possuam reservas suficientes. De acordo com o especialista em contabilidade pública do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam), Heraldo da Costa Reis, a lei dispensa do limite as despesas com aposentados que sejam custeadas por receitas provenientes da contribuição dos mesmos, da compensação financeira e de outros recursos, como alienação de bens, direitos e ativos, bem como superávit financeiro.