Edição 331
Signatária do PRI desde a largada do programa, a Previ trabalha este ano para reforçar sua proximidade com empresas investidas e participadas, buscando assegurar o caráter ASGI – critérios ambientais, sociais, de governança e integridade – das mesmas. Segundo o diretor de Participações da entidade, Denísio Liberato, a governança deverá ganhar um novo capítulo ainda este ano, no máximo no início do próximo, quanto a entidade divulgar as diretrizes gerais de sua política de voto, respondendo a compromisso assumido ao aderir ao Código de Stewarship da Amec. “A Previ quer pagar de forma sustentável os compromissos com os participantes de seus planos”, afirma Liberato.
Em 2020 a Previ começou a preparar um trabalho de fôlego para entrar nos modelos de negócios das companhias, incluindo avaliação de seus fornecedores e compradores, as externalidades que podem afetá-la, o relacionamento com os empregados, entre outros. “Já temos os ratings qualitativos e agora vamos montar um ranking quantitativo, mas esse é um trabalho extenso que exige relação muito próxima com as empresas e deverá ser concluído apenas em 2021, conta o diretor. Nas empresas participadas, as interações são constantes, por meio dos conselheiros, incluindo workshop anual com eles para discutir qual será o tom do ano, entre outros eventos.
O desafio do trabalho, avalia Liberato, está na forma não homogênea e não uniforme de divulgação dos dados pelas empresas, trazendo parâmetros e métricas distintas. Outra frente de trabalho assumida pela Previ é comparação entre setores. “A política tem um filtro estático para os segmentos mas, à medida que as métricas avançarem, esses filtros serão mais dinâmicos, acompanhando o potencial de upside da companhia e permitindo fazer movimentos de preços”. Ele observa que estudos científicos recentes já mostraram que o engajamento com as companhias é um caminho melhor do que excluir ou boicotar empresas. “É melhor participar das decisões estratégicas delas do que excluir; a Previ já fazia isso intuitivamente e sentimos que todos querem falar conosco”.
Rafael Castro, gerente executivo de Controles Internos da Previ e candidato a uma vaga no Conselho do Principles for Responsible Investment (PRI) em 2020, sublinha que a Previ tem uma cultura de engajamento direto que vem de muitos anos e tem buscado ampliar as ações de engajamento coletivo usando a base de signatários do PRI para disseminar essas iniciativas. “A rede brasileira do PRI tem um número representativo de signatários, entre elas algumas grandes EFPCs e gestores de grande, pequeno e médio porte”. O engajamento é um dos pilares das estratégias do PRI de médio e longo prazo e tem espaço para crescer mais.
Castro ressalta que o movimento em direção aos investimentos ESG cresceu muito desde o final do ano passado e a pandemia apenas imprimiu maior velocidade, por conta dos impactos sobre a biodiversidade relacionadas à temas econômicos. “Os mercados passaram a olhar para a realidade das mudanças climáticas com maior amplitude”, avalia Castro. Entre os principais riscos apontados pelo Forum Econômico Mundial no ano passado, cinco eram ambientais.
A taxonomia (classificação), que está em fase de consulta pública na Europa, é um dos principais pontos em discussão e multiplicam-se os eventos e painéis sobre o impacto que a nova taxonomia européia terá no restante do mundo. “Se o processo evoluir em outros mercados, tudo terá que ser alinhado nos reports e o grande desafio será tentar uma convergência das taxonomias porque elas tendem a refletir os diferentes contextos regionais”, explica o especialista.
Por enquanto, cada região está iniciando a sua para minimizar os riscos de greenwashing e, no Brasil, a Febraban tem trabalhado para isso no mercado de crédito. “Estamos envolvidos no tema desde a construção do PRI e hoje a preocupação é com a transparência dos processos”, diz Castro. Ele lembra que já evoluiu o número de empresas que usam o modelo de relatório do GRI – Global Reporting Initiative – mas isso também precisa avançar porque nem sempre o conteúdo dos relatórios está adequado.
“Há mais empresas reportando e aumentou a qualidade dos reports mas é preciso melhorar na comparabilidade dos dados”, avisa Castro. ‘Evoluiram também o processo de investimentos responsáveis, assim como nossos modelos e métricas como investidores”.
O PRI, com mais de três mil signatários no mundo, responsáveis por mais de US$ 100 trilhões em ativos sob gestão, procura mais signatários entre fundos de pensão, já que eles influenciam todas as cadeias econômicas.
A Fundação Real Grandeza, que adota investimentos ASG ou ESG na sigla em inglês desde 2004, vê o Brasil ainda muito atrás da Europa e dos EUA na indústria de produtos ESG. “Apesar disso, o assunto está saindo do anexo e indo para a capa dos relatórios anuais, o que é uma evolução expressiva”, avalia o diretor presidente da fundação, Sérgio Wilson Ferraz Fontes.
Segundo ele, o futuro é de muito ativismo já que o horizonte de investimentos a longo prazo exige a integração ESG a todos os processos. “A tendência é modernizadora na área de gestão de investimentos. A Real Grandeza, uma das pioneiras em sustentabilidade no Brasil (é aderente ao Carbon Disclosure Project e ao Principles for Responsible Investment – PRI), entra agora em nova etapa de seu compromisso ESG, aumentando seu ativismo junto às empresas investidas por meio de engajamento direto com gestores, administradores e emissores de títulos de dívida.
“O mercado já passou da fase do romantismo, agora a visão deve ser a de reduzir riscos de longo prazo e melhorar a sustentabilidade de maneira efetiva, produzir retornos compatíveis com a liability de longo prazo”, afirma o dirigente. Para entrar nessa nova fase, a Real Grandeza já dispõe de equipe treinada em sustentabilidade na área de investimentos, porque formou pessoas ao longo dos anos.
O mercado cria métricas quantitativas para medir o desempenho ESG e isso começa a ser feito por meio dos ratings fornecidos aos fundos de investimento por empresas internacionais, observa o sócio da consultoria Aditus, Guilherme Benites. Segundo ele, por enquanto as métricas têm sido mais qualitativa do que quantitativa. Ele acredita que colocar métricas quantitativas muito restritivas, neste momento, seria uma decisão questionável. “Talvez seja mais interessante olhar o processo de investimentos dos gestores e saber como eles incorporam o ESG”.
A Aditus já utiliza ratings por critérios ESG nas análises de fundos e vai mostrá-los nos relatórios que divulgará aos clientes em 2021, mas Benites considera cedo demais para usar essa classificação como critério. “Vamos mostrar isso aos clientes para começar a sensibilizar as pessoas em relação a essa discussão”.
A Fusan – Fundação Sanepar de Previdência e Assistência Social -, cuja gestão de investimentos é 100% terceirizada, não exerce influência direta sobre a análise ASG das empresas investidas, mas faz seleção e acompanhamento dos gestores de modo que eles apliquem essas práticas, diz o diretor administrativo-financeiro da entidade, Dirceu Wichnieski.
“Em 2021 as exigências ficarão mais fortes e faremos um acompanhamento ainda mais próximo do gestor; vamos exigir relatórios de conformidade e estamos estudando como reforçar essas medidas porque entendemos que será cada vez mais importante”, avalia o diretor. O objetivo é incluir essas questões nos mandatos de forma mais clara, principalmente nos mandatos exclusivos. Ele lembra que a patrocinadora Sanepar tem uma atuação forte na área de saneamento e já passou por um problema ambiental que gerou forte impacto no passado, o que exigiu uma série de providências e reforçou a preocupação com esses critérios.
Na Sistel, o tema ainda é bastante novo, admite a diretora de Investimentos da fundação, Luciana Rodrigues da Cunha Gomes. “Já está contemplado em nossa política, até porque é uma obrigação regulatória e incluímos um parágrafo específico nesse sentido”, diz a diretora. Mas, com uma carteira composta majoritariamente por títulos públicos federais – 98% do total, fica difícil avaliar o ESG. O plano CD já tem alguma diversificação por meio de fundos de fundos, inclusive no exterior, fundos de ações, fundos imobiliários e estruturados e tende a aumentar essa diversidade.
A Fundação Banrisul de Seguridade Social (FBSS) incluiu, entre suas políticas, critérios para avaliação de risco relacionados à sustentabilidade econômica, ambiental, social e de governança dos investimentos, explica o diretor financeiro da entidade, Álvaro de Borba Kafruni. “A observância das diretrizes e critérios estabelecidos nos respectivos documentos procura manter um ambiente social e ambiental sustentáveis”, afirma o diretor.
A entidade definiu diretrizes para os novos investimentos como, por exemplo, que a análise deve ir além da conformidade legal. A fundação privilegia investimentos em empresas que se destaquem pela adoção de melhores práticas de governança; que disponibilizem informação a respeito de práticas de responsabilidade socioambiental; em empresas signatárias do PRI; que incorporem melhores práticas de governança corporativa, como transparência, equidade, prestação de contas (accountability), e responsabilidade corporativas.
Além disso, explica Kafruni, para cada segmento de aplicação dos recursos há orientação de vedações expressas de investimento, seja no próprio setor ou em empresas. São adotados filtros na avaliação dos investimentos e, na renda variável, há destaque para as companhias que integrem o ISE – Índice de Sustentabilidade Empresarial da B3. Há também uma posição privilegiada para investimento em empresas que apresentem relatório anual de responsabilidade socioambiental, que adotem código de conduta, entre outras.
Na parcela sob gestão terceirizada, a entidade exige a adesão dos gestores ao Código de Ética da Anbima, declaração de seguirem orientação de sustentabilidade no setor de intermediação, conforme proposto pela B3; adesão ao PRI da ONU e do Equador e a adoção de critérios de sustentabilidade na composição do portfólio do fundo.
O caminho ESG deverá direcionar todo o sistema de EFPC porque permeia o nosso modo de pensar e são atributos fundamentais para a atividade das fundações”, avalia o diretor presidente da Néos Previdência, Augusto Reis. Apesar disso, ele aponta a limitação em relação às poucas opções de ativos disponíveis no mercado, com EFPCs em compasso de espera para poder incorporar melhor essas alternativas. A patrocinadora da Néos, o grupo Neoenergia, já faz recomendações claras a respeito dos critérios de sustentabilidade na escolha dos investimentos, conta Reis.
“Há uma convergência plena de entendimento entre a patrocinadora e a entidade, mas na prática ainda enfrentamos limitações. O tamanho da bolsa no Brasil, por exemplo, e o número de empresas listadas, atrapalham”. A alocação no exterior traz maior maturidade nesse assunto, acredita o dirigente. “Os critérios ESG serão incluídos na política mas não de uma maneira que “engesse’ as opções porque precisamos garantir a performance financeira dos ativos”, diz Reis.
A Capef já incorporou a preocupação com o ESG nas políticas de investimentos para os dois planos de benefícios que administra, informa o diretor de Administração e Investimentos da entidade, Marcos Miranda. As políticas incluem tópicos específicos de observância de princípios de responsabilidade ambiental, social e de governança. Na seleção de investimentos, explica o diretor, é feita uma análise de questões associadas à sustentabilidade, bem como responsabilidade socioambiental e ao fortalecimento da governança e transparência.
Além disso, as políticas dos planos dizem que não apenas os ativos/empresas/fundos investidos, mas todos os integrantes do mercado financeiro e agentes econômicos, de forma geral, devem buscar métodos que minimizem impactos sociais e ambientais negativos em suas atividades. “Implantamos isso em nosso próprio prédio e consideramos a utilização de requisitos de sustentabilidade nas nossas instalações, onde já contamos com o uso de fonte renovável (solar) na geração própria de energia para a entidade”, detalha Miranda.
Os fatores de sustentabilidade observados no processo de seleção de ativos constam no Manual de Investimentos da fundação e, já na fase inicial de prospecção, os gestores terceirizados dos fundos respondem a um questionário de ‘Due Diligence’ onde devem informar se as questões de ESG são consideradas por eles na análise dos ativos do fundo.
A governança, segundo ele, é um aspecto melhor regulado no Brasil, inclusive pela CVM, regras da bolsa, etc, e tem critérios objetivos, mas os fatores ambientais e sociais precisam ser analisados com cuidado especial, conferindo as informações prestadas pelas empresas.
“A Magalu deu um salto durante a pandemia, um salto de qualidade na questão social, sem demissões e com um processo de seleção de pessoas negras, provando seu compromisso com a inovação e quebra de paradigmas, além de manter energia solar em suas 300 lojas”, lembra o dirigente. Casos como esse são um sinalizador importante para os investidores, diz Miranda.
Na Capef, ele conta que houve estudos para entrar numa emissão de debêntures recentemente mas, ao constatar que a empresa emissora era uma termoelétrica que usava carvão no modelo tradicional e não carvão vegetal sustentável, a entidade resolveu desistir apesar da boa rentabilidade das debêntures. “Entre um retorno atraente e o risco de enfrentar questionamentos futuros pelos nossos conselheiros, participantes e pelo próprio mercado, preferimos não entrar”, conta Miranda.