Edição 238
A regra que limita a aplicação de cada fundação a no máximo 25% do patrimônio do fundo local que investe no exterior é o grande impeditivo para a alocação de recursos das entidades decolar de vez para fora do País. Essa é a opinião de gestores de recursos que já contam com produtos desse tipo à disposição dos institucionais ou até teriam condições de lançar fundos de investimento no exterior, mas ainda não fizeram isso. Para eles, a imposição da Resolução 3.792 do Conselho Monetário Nacional (CMN) acaba inviabilizando o ingresso das fundações no segmento.
A norma estabelece que “as entidades devem observar, considerada a soma dos recursos por elas administrados, o limite de até 25% do patrimônio líquido de um mesmo fundo de investimento constituído no Brasil que tenha em sua carteira ativos classificados no segmento de investimentos no exterior”. Roberto Cintra, gestor de renda fixa e moedas da Goldman Sachs Asset Management Brasil (GSAM Brasil), afirma que, na prática, isso quer dizer que para um fundo de investimento no exterior ser viabilizado é preciso haver quatro fundações decididas a investir nele – e a não sair do fundo jamais. “Se quatro fundos de pensão optarem por investir no produto, ótimo. Mas o primeiro que sair acaba tirando os demais”, observa.
Eduardo Mendes, presidente da Schroders Brasil, acrescenta que não basta encontrar quatro fundações dispostas a investir em um produto e a não sair dele para não desenquadrar as demais. É preciso que as quatro queiram colocar o mesmo volume de recursos em um mesmo fundo. “Não adianta um fundo de pensão entrar com R$ 20 milhões e outro com R$ 2 milhões”, aponta.
Mendestambém está convencido de que a questão do limite de 25% é o maior entrave para o investimento dos fundos de pensão no exterior. “Nossa sugestão é que a Previc considerasse o limite de 25% não para o patrimônio do veículo local, mas sim do fundo sediado lá fora que será, no fim do dia, o destino dos investimentos das fundações”, propõe Mendes.
O executivo afirma que outra opção seria exigir que os fundos sediados no exterior que sejam alvo de investimento de veículos locais façam seu registro na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). “No Chile é assim que funciona”, indica. “Poderia ser flexibilizada essa questão dos 25%, permitindo que essa participação fosse calculada em relação ao fundo baseado lá fora, mas exigindo que o fundo estrangeiro tenha seu registro na CVM. Assim, seria possível ter acesso a diversas informações do fundo periodicamente, como percentual do patrimônio detido pelo maior cotista, composição e limites de exposição, entre outras”, detalha. Ele diz que uma alternativa seria utilizar o que já há de supervisão fora do País. “Em Luxemburgo, por exemplo, já existe o órgão que faz toda a supervisão dos fundos. Poderia ser estabelecido que, desde que o fundo seja baseado em Luxemburgo e que nenhuma fundação tenha mais de 25% do seu patrimônio, será possível que o produto receba investimento dos institucionais brasileiros sem ser levado em conta o limite para o fundo local”, sugere o executivo. Mendes resume que “há várias alternativas que podem dar a tranquilidade necessária para que o governo permita a flexibilização dos 25% sem perder a garantia da transparência e da segurança”. “No fim, é essa garantia que o governo quer ao impor esse limite. Mas tenho certeza absoluta que, se essa regra mudasse, as fundações começariam aos poucos a investir fora do Brasil.”
Cultura – JáMarcelo Giufrida, presidente da BNP Paribas Asset Management, acha que a legislação até pode inibir um pouco os investimentos das fundações no exterior, mas não é a grande culpada. “A questão dos 25% também dificulta, mas se houvesse uma demanda pujante por parte dos institucionais, isso seria algo contornável”, argumenta . Giufrida afirma que a ida para o exterior envolve um lento processo de educação dos investidores. “Não podemos esquecer que se trata de uma novidade cercada por uma série de circunstâncias que não fazem muita parte do dia a dia dos fundos de pensão, como o formato dos investimentos, a maneira de acompanhar a evolução e a diferença no acesso aos gestores, além da moeda estrangeira. Fora que, quando se abre o mundo, o leque de alternativas é muito grande, o que gera uma certa dificuldade até de escolha dos produtos”, enumera.
O executivo completa que há outro fator emperrando a entrada do institucional brasileiro no segmento: a performance dos ativos nacionais estava muito boa nos últimos dez anos. “Tanto a Bolsa quanto a renda fixa renderam mais aqui do que em outras partes do mundo. E tem uma tendência de as pessoas, quando vão comparar resultados, olharem mais para Estados Unidos, Europa e um pouco para mercados emergentes como Rússia, Índia e China. É uma análise mais ligeira, mas de fato nos últimos dez anos a performance dos ativos brasileiros foi superior, até por conta da própria apreciação do Real”, constata Giufrida.
Ele diz que estamos entrando em uma fase nova, em que os ativos brasileiros não estão rendendo tão bem, inclusive com a Bolsa em terreno negativo já há algum tempo. “A taxa de juros caiu e o dólar começa a mostrar que é realmente bidirecional”, lembra. Giufrida diz que é possível perceber que essa realidade está chegando ao investidor local.
Dois dígitos –Giufrida diz que um elemento de difícil contorno é que, como a inflação brasileira é muito alta, a soma entre um índice de preços e a taxa de juros que compõe a meta atuarial quase sempre vai resultar em algo bem perto de dois dígitos. “Quando o investidor brasileiro for olhar alternativas lá fora, buscará ativos que tenham potencial de retorno de dois dígitos – que, consequentemente, são alternativas de maior risco, o que acaba protelando a decisão do investidor local de ir para fora. Até por conta disso, estamos estudando algumas opções aqui, de produtos mais estruturados na área de renda variável no exterior que possam mitigar um pouco esse risco e reduzir essa barreira do investidor”, conta.
Mendes, da Schroders, completa que a diversificação trazida pelos investimentos no exterior não é nada se não for acompanhada de boa rentabilidade. “Diversificação sem retorno não faz sentido, porque mesmo com uma taxa de juros de 8,5%, que já é baixa em relação ao que era antes, os retornos ainda são elevados no mercado brasileiro. Por isso, realmente é preciso escolher a dedo que classe de ativo ou que produto no exterior faria sentido dentro da carteira”, alerta.