Edição 256
Atentas aos movimentos de enxugamento de liquidez que serão colocados em prática pelo Federal Reserve nos próximos meses, as fundações brasileiras não enxergam em 2014 um ano com uma volatilidade menor do que a observada ao longo do ano passado. Isso ocorre justamente em função da baixa previsibilidade que se tem sobre quais serão as reações do mercado conforme os estímulos do banco central dos Estados Unidos forem retirados.
Diante de tal cenário, o ano começa com os fundos de pensão com o foco em investimentos dentro do Brasil, já que ativos mais seguros, como títulos do governo, têm apresentado retornos satisfatórios. O ‘tapering’ do Fed (retirada dos estímulos econômicos), é acompanhado de perto, com cautela, mas não é visto como uma oportunidade para realizar grandes movimentos.
“A retirada dos estímulos americanos tem provocado um movimento nas taxas de juros e gerado oportunidades na renda fixa. A Funcef está atenta a esses movimentos, buscando aproveitar alocações pontuais em determinados ativos na renda fixa”, afirma Maurício Marcellini, diretor de investimentos da Funcef.
Quando Ben Bernanke, então presidente do Fed, anunciou, em maio de 2013, que o ‘tapering’ teria início em algum momento de um horizonte relativamente próximo, a renda fixa global foi acometida por um forte nervosismo, num típico movimento de antecipação que os agentes de mercado costumam fazer antes do evento em si ocorrer propriamente.
Foi quando, no âmbito doméstico, títulos públicos, notadamente as NTN-Bs, voltaram a apresentar rendimentos interessantes sob o olhar dos institucionais. Esses rendimentos foram turbinados pela elevação da Selic que o Banco Central (BC) se viu obrigado a fazer para combater a persistente pressão inflacionária.
No ambiente interno, nota o diretor da Funcef, é adotada uma política monetária restritiva, com aumento dos juros reais. Mas Marcellini enxerga isso como um cenário de curto prazo, com oportunidades para um ou dois anos. Em um cenário de longo prazo, de cinco anos, a equipe da fundação trabalha com um cenário de juros reais abaixo de sua meta atuarial. “No curtíssimo prazo voltamos a ter oportunidades na renda fixa”, diz.
Nova política – Dado que as taxas de juros pagas por papéis do governo dobraram em pouco mais de um ano e passaram a cumprir a meta atuarial, na elaboração da política de investimento da Funcef para 2014 foi decidido que o processo de redução da renda fixa que vinha ocorrendo nos últimos anos será interrompido. “Antes, quando os títulos de nossa carteira venciam, buscávamos ativos de maior risco, atrelados ao crescimento econômico. Interrompemos esse movimento”. Em 2006, ativos atrelados a taxa de juros correspondiam a 45% da carteira do fundo da Caixa, percentual que hoje está ao redor dos 4%, e que pode ter um aumento, apenas residual, nos próximos meses, segundo Marcellini.
Já ativos relacionados ao desempenho do nosso PIB, que são compostos por renda variável, investimentos estruturados e imóveis, e que saltaram de 25% para 53% de 2006 a 2013, param de ganhar peso. “Já atingimos um nível de exposição a risco que entendemos ser ideal. Além disso, vínhamos saindo de ativos atrelados a juros desde 2006, buscando ativos atrelados ao crescimento, e esse movimento de saída de juros se esgotou”.
Um dos assuntos mais discutidos pelos institucionais em 2013, o investimento no exterior foi incluído no plano de investimento da Funcef, mas o caminho a ser trilhado pela entidade nesse universo ainda pouco explorado vai acontecer de maneira tímida – a previsão é que, até 2018, a casa tenha cerca de 0,4% de seu patrimônio de R$ 52 bilhões em ativos internacionais.
O excelente desempenho apresentado pelos principais índices acionários dos Estados Unidos no ano passado (o S&P 500 avançou 29,5%, enquanto o Dow Jones reportou ganhos da ordem de 26,5%) é ressaltado por Marcellini como um ponto que pode retardar a saída da fundação ao exterior. “As Bolsas lá fora estão bem precificadas, sendo negociadas a níveis recordes. No Brasil a Bolsa está abaixo dos 50 mil pontos. Não tenho dúvida de que temos boas oportunidades de alocação no mercado local. Vai ser difícil convencer meus pares na diretoria das oportunidades na renda variável lá fora”.
Colchão de rentabilidade – A Sistel, por sua vez, optou por ainda não incluir na política de investimento de 2014 a alocação em ativos no exterior, e a abertura das taxas pagas pelos títulos do governo brasileiro é citada por Carlos Alberto Cardoso Moreira, diretor de investimentos e finanças da fundação, como um ponto contra essa nova empreitada. “Para quem não fez o dever de casa, no sentido de buscar um colchão de rentabilidade com um risco relativamente baixo, que é o título público do governo, essa é uma boa oportunidade”.
Na avaliação do diretor da fundação, falta um maior aculturamento por parte dos institucionais do país para que o investimento no exterior ganhe ares atrativos sob o olhar da Sistel. “A própria situação dos nossos juros hoje nos dá um conforto de buscar alternativas de retorno acima daquilo que necessitamos, em um ativo já conhecido operacionalmente”.
Como não poderia deixar de ser, também de olho na volatilidade no mercado de renda fixa por conta das mudanças a serem promovidas pelo Fed, a Sistel realizou algumas alterações em sua política de investimentos para o ano corrente. “Marcamos 100% de nossos ativos a mercado, e isso fez com que no ano passado tivéssemos uma performance desfavorável. Em função dessa volatilidade, e da incerteza de como será o mercado, ampliamos a participação de ativos ligados à Selic, e diminuímos a exposição a ativos ligados a índices de preços”, diz Moreira. “Nossa intenção com a alteração é se proteger, mesmo porque entendemos que 2014 também será um ano com muita volatilidade”.
Outra mudança no fundo de pensão que tem hoje um patrimônio por volta dos R$ 14 bilhões e cuida da aposentadoria de empregados das grandes empresas de telefonia móvel do país é deixar de lado opções em investimentos estruturados. “Entramos no final de 2012, mas resolvemos dar uma parada a partir do início da elevação dos juros. Precisamos pelo menos ter um parâmetro de qual retorno achamos adequado para entrar em ativos estruturados que realmente compense em relação a um título público”.
Já a Funcef segue analisando as oportunidades nos estruturados, principalmente em private equity, mais especificamente nas áreas de educação, saúde e inovação. Responsável por 9% da carteira da entidade, a expectativa é que, nos próximos cinco anos, os estruturados cheguem a ocupar um espaço por volta dos 15%. “Em 2013 aprovamos dois fundos de infraestrutura e dois de inovação. Para 2014 acredito que o movimento deve ser muito próximo”, pondera Marcellini.
O ponto que parece ser o guia das fundações nesse início de ano, a abertura das taxas de juros, é também citado pelo diretor de investimentos do fundo de pensão da Caixa Econômica Federal, que entende que, com uma renda fixa mais rentável, o tempo de espera para que apareçam boas oportunidades de negócio pode se tornar um pouco maior. “Hoje estou mais seletivo para investimentos em todas as classes de ativos, porque hoje o caixa já não destrói como destruia a dois anos atrás. Se eu fico no CDI, tenho um retorno próximo de 5%, ainda abaixo do atuarial, mas não destrói tanto o valor como quando era 2%, 3%”, pontua o especialista.