Gueitiro Matsuo Genso, da Previ Sérgio Souza, deputadoEdição 281
Enquanto Petros, Funcef e Postalis tiveram dezenas de indiciamentos civis e criminais de dirigentes e profissionais, a Previ do Banco do Brasil foi o único fundo de pensão investigado pela Comissão Parlamentar de Inquérito a sair ilesa no relatório final. Com patrimônio de R$ 162,61 bilhões, o fundo de pensão não teve nenhum profissional indiciado no relatório do deputado Sérgio Souza (PMDB-PR), aprovado em abril passado, após oito meses de trabalhos. Além dos indiciamentos, o relatório realizou uma série de propostas para aperfeiçoar a governança dos fundos de pensão de estatais.
O relatório da CPI encaminhou ao Ministério Público cerca de uma centena de indiciamentos de pessoas ligadas aos fundos de pensão, instituições financeiras e empresas de auditoria e consultoria. Apenas um indiciado pertence ao mundo político, o ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, João Vaccari Neto. Os trabalhos da CPI apontaram para um prejuízo de R$ 6,6 bilhões em perdas de 14 investimentos suspeitos, como por exemplo, em fundos do Trendbank, da Multiner, Galileo Educacional, Atlântica, entre outros (ver lista). Um dos fatos que chamou a atenção foi a ausência de indiciados do maior fundo de pensão do país.
Nas palavras do próprio relator da CPI, a Previ apresentou um alto padrão de governança. “Percebemos que a Previ tem uma governança de alto nível. Se os demais fundos de pensão tivessem governança semelhante ao da Previ, não estariam com todas essas dificuldades que têm agora”, diz o deputado. Souza faz uma ressalva, que não quer dizer que a Previ não tenha problemas, mas que nos trabalhos da CPI, que se concentraram nos negócios investigados, o fundo de pensão não apresentou prejuízo em nenhum deles, com exceção da Sete Brasil.
Mesmo nesse caso, a Previ entrou com uma aplicação bem menor que as outras fundações investigadas, a Petros e a Funcef. O fundo de pensão do Banco do Brasil fez apenas um investimento inicial de R$ 180 milhões e depois não acompanhou os demais investidores na ampliação dos aportes. As outras duas fundações acabaram com aplicações de cerca de R$ 1,5 bilhão nos negócios da empresa, que entrou em processo de recuperação judicial no mês de abril passado.
Os fundos de pensão entraram como investidores do FIP Sondas (fundo de investimento em participações), para financiar os projetos da empresa, e tiveram que realizar provisionamento de perdas em decorrência do processo de recuperação judicial. O presidente da Previ, Gueitiro Matsuo Genso, diz que a governança da entidade funcionou para impedir maiores perdas. “Fizemos apenas o investimento inicial após realizar uma análise completa do negócio. A análise apontava que o negócio era muito bom, por isso, fizemos o investimento”, diz. Quando os investidores foram chamados a ampliar as aplicações, a Previ decidiu não entrar. “Nossa área técnica alertou que o aumento das aplicações na Sete Brasil poderiam exceder os limites de nossa política de investimentos”, diz o presidente da Previ. O limite era de 1% para fundos estruturados do Plano 1, que na época tinha R$ 143 bilhões. A fundação já contava com R$ 1,09 bilhão no segmento. Apesar de ainda contar com algum espaço para investir, a equipe do fundo avaliou que não seria adequado aumentar a concentração da carteira no mesmo ativo.
Em outros investimentos relacionados a ativos e fundos de investimentos de bancos e instituições pequenas e médias, investigados pela CPI, a Previ passou longe. “Não tivemos perdas com ativos dos bancos médios. Não é que esses bancos não batiam em nossa porta, mas as propostas eram filtradas pelas áreas e comitês técnicos e nem chegavam para discussão na diretoria”, diz Genso.
As investigações da CPI mostraram, segundo o deputado Sérgio Souza, que as perdas dos demais fundos de pensão analisados, sobretudo do Postalis, apontam para o problema de governança no qual as decisões de aplicações menores que 1% do patrimônio, não precisavam passar por análise da diretoria e comitês. O Postalis aparece em oito dos 14 casos investigados pela comissão. O mais conhecido envolve os fundos no exterior Atlântica I e II, do gestor Fabrizio Neves, com fraudes envolvendo ativos da dívida da Venezuela e da Argentina. Os executivos do BNY Mellon, que era o administrador desses fundos, também foram indiciados no relatório.
No caso de dirigentes que agiam com intenção de fraudar o fundo de pensão, havia uma certa liberdade, pois as entidades contam com patrimônios volumosos. “Em alguns casos, era preciso convencer apenas uma única pessoa que tinha o poder deliberativo de alçada de valores que permitiam investimentos substanciais. Se você considera 1% de quem tem R$ 8 bilhões, são R$ 80 milhões; imagine quem tem R$ 200 bilhões de patrimônio”, diz o deputado (ver entrevista na pag. 20).
Pilares de governança – Não é de hoje que a Previ é vista pelo mercado como o fundo de pensão de empresas estatais com governança corporativa acima da média de seus pares. O resultado da CPI parece comprovar essa visão. As razões podem ser explicadas de forma variada, mas um dos pilares centrais, segundo o atual presidente da Previ, Gueitiro Matsuo Genso, é a procedência de seus diretores e conselheiros. “Um dos motivos da boa governança da entidade é que o estatuto define que para ser diretor ou conselheiro é necessário contar com pelo menos 10 anos de filiação ao fundo de pensão”. Genso acredita que a exigência faz com que os dirigentes tenham comprometimento com o bom desempenho dos planos de benefícios e seus investimentos.
“Eu mesmo daqui a 6 anos vou adquirir direito de aposentadoria pela Previ. Se eu tomar uma decisão errada hoje, vai impactar sobre meu futuro”, diz Genso. A regra impede ainda a entrada de pessoas alheias ao universo do fundo de pensão e da patrocinadora na direção da entidade.
O deputado Sérgio Souza cita também a eficácia do modelo. “A Previ tem uma regra que todos os diretores são funcionários do Banco do Brasil. Então, além de diretores eles são também os beneficiários e isso parece ser importante para o modelo de governança para que haja uma solidez maior para o plano”, diz o deputado. Ele lembra que no caso do Postalis, a maior parte dos problemas e irregularidades com investimentos foram realizados por dirigentes alheios ao universo da patrocinadora e do fundo de pensão.
A realização de investimentos do Postalis nos fundos Atlântica I e II foram realizados por volta do ano de 2011, quando os dirigentes eram Alexej Predtechensky e Adílson Costa, que receberam uma série de indiciamentos no relatório. Os dois não pertenciam aos quadros dos Correios. O Postalis foi o fundo de pensão com maior incidência de investimentos suspeitos nas investigações da comissão.
A questão da contratação de profissionais de fora do universo dos fundos de pensão é controversa. Há quem a defenda como forma de aumentar a profissionalização da direção das entidades. É o caso do projeto de lei em análise no Senado Federal, de autoria de Paulo Bauer (PSDB-SC), que defende a contratação de dirigentes de fundos de estatais através de processo seletivo no mercado. O projeto, porém, tem recebido críticas da Abrapp e de profissionais dos fundos de pensão. “Da forma como está elaborada a proposta do Senado, somos contra”, diz José Ribeiro Pena Neto, presidente da Abrapp (ver box).
O representante da Abrapp defende a proposta que entrou no relatório da CPI dos fundos de pensão que propõe obrigatoriedade de filiação ao fundo de pensão para se tornar dirigente.
Paridade na diretoria – Além da filiação dos diretores e conselheiros, outro fator apontado pelo presidente da Previ como diferencial positivo para a governança é a paridade entre diretores eleitos e indicados pela patrocinadora. Atualmente são três diretores eleitos e outros três indicados. Além disso, o presidente não conta com voto de qualidade, conhecido também como voto de minerva, que é utilizado em casos de desempate. “As decisões mais importantes são tomadas apenas por maioria; tem que formar uma maioria para aprovar uma decisão, senão não aprova”, explica Genso.
O presidente da Previ aponta ainda a segregação de funções como outro pilar para a governança da entidade. “Utilizamos o princípio da segregação de funções, inspirada em empresas de capital aberto. Por exemplo, a política de investimentos é elaborada pela diretoria de planejamento, que é executada pela diretoria de investimentos e, posteriormente, existe outra área que controla. Ou seja, quem planeja não executa e quem executa não controla”, diz Genso.
Um último pilar para a alta governança da Previ, ainda segundo seu presidente, é a capacitação técnica do corpo diretivo e dos conselheiros. “São todos funcionários cedidos pelo Banco do Brasil, com alta capacitação na área financeira”, aponta Genso. Ele mesmo se classifica como um profissional com perfil mais técnico. O dirigente é funcionário de carreira do banco, tendo ingressado no BB em 1985. Ele ressalta ainda o fato de não possuir filiação partidária. Nem sempre foi assim na Previ. O ex-presidente do fundo de pensão entre 2003 e 2010, Sérgio Rosa, tinha uma atuação sindical e partidária ligada ao Sindicado dos Bancários e ao Partido dos Trabalhadores (PT). Mesmo nesse caso, Rosa não foi indiciado pela CPI e nenhum dos diretores ou profissionais que atuaram na entidade na sua gestão. Seus sucessores, Ricardo Flores e Dan Conrado, também não sofreram indiciamento.
Comitê de investimentos – Para evitar problemas futuros nos fundos de pensão, a CPI elaborou uma série de propostas para aperfeiçoar a governança das entidades. As principais são a obrigatoriedade de criação de um comitê de investimentos que tenha o poder de avaliar as decisões de investimentos e a implantação de auditoria interna. A proposta prevê ainda que o comitê tenha poder de veto para barrar investimentos de alto risco. Atualmente, a criação do comitê não é obrigatória.
Outra proposta é a obrigatoriedade para as agências de rating em depositar a metodologia de análise dos ativos na Comissão de Valores Mobiliários. A proposta é que os investimentos de fundos de pensão que se basearem em análises de rating, que as metodologias sejam registradas no órgão.
Abrapp não concorda com seleção obrigatória de dirigentes no mercado
O presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), José Ribeiro Pena Neto, tem assumido posicionamento contrário às principais propostas do projeto de lei 388/2015, de autoria de Paulo Bauer (PSDB/SC) que trata da governança dos fundos de pensão patrocinados por estatais. Aprovado no Senado no início de abril passado, o PLS determina, entre outras propostas, a contratação obrigatória de dirigentes dos fundos de estatais no mercado e a indicação de conselheiros independentes para os conselhos das entidades. O projeto deve passar ainda pela análise e aprovação na Câmara dos Deputados.
“Da forma como está, se ficar mesmo obrigatória, nós somos contra a contratação de dirigentes no mercado. A proposta enseja a gestão de curto prazo pelo profissional contratado, que vai querer mostrar resultado no período de dois anos, que é o tempo definido pelo seu contrato”, diz o presidente da Abrapp. O projeto define o prazo de dois anos para a contratação, com possibilidade de renovação. “O profissional vai querer mostrar resultado para que a sua contratação seja renovada ou, caso isso não ocorra, para voltar ao mercado com um bom currículo”, diz Pena Neto.
O representante da Abrapp alerta ainda para a possibilidade de contratação de profissionais não idôneos no mercado. “Sabemos que nem sempre os processos de contratação são conduzidos com seriedade. Por isso, podem dar maior abertura para contratar pessoas não idôneas não ligadas ao fundo de pensão. Temos maior risco de deixar a raposa tomando conta do galinheiro”, diz o presidente da Abrapp.
Relatório da CPI traz propostas melhores – O presidente da Abrapp diz que as propostas encaminhadas pela CPI dos fundos de pensão da Câmara dos Deputados, são bem melhores se comparadas com o projeto de lei 388 do Senado. O relatório da CPI propôs a obrigatoriedade de formação de comitês de investimentos pelos fundos de pensão patrocinados por estatais. Além disso, propôs a criação de auditorias internas subordinadas aos conselhos deliberativos das entidades. “As propostas, algumas delas sugeridas pela Abrapp, deixam claro que o relatório denota qualidade técnica e equilíbrio”, diz Pena Neto ao comentar o relatório da CPI. O representante elogiou o trabalho realizado pelo relator Sérgio Souza, do presidente Efraim Morais Filho (DEM-PB) e da assessoria técnica da Câmara dos Deputados.