Edição 109
Menos de um mês depois da decisão obrigando a Ceres ao pagamento do IPTU ao Distrito Federal por considerá-la não enquadrada no artigo 150 da Constituição Federal, o STJ dá uma sentença que realimenta as expectativas dos fundos de pensão em relação à imunidade tributária. No último 28 de novembro, decisão unânime da Plenária do Supremo no recurso extraordinário 259.756 enquadrou a Comshell, fundo de pensão dos funcionários da Shell, como empresa de assistência social, por manter seu programa de previdência complementar sem a contribuição dos empregados. Segundo especialistas, a iniciativa pode levar algumas empresas a reverem seus estatutos no sentido de assumirem integralmente o valor da contribuição para a aposentadoria de seus funcionários.
“Foi uma decisão histórica, depois de vermos frustradas nossas expectativas de anos diante da decisão da Ceres”, comenta o presidente da Abrapp, Carlos Duarte Caldas, lembrando que há 18 anos o sistema busca uma definição clara sobre a posição de assistência social dos fundos de pensão. “Essa decisão resgata, ainda que parcialmente, essa condição do sistema, enquadrando-o nas condições de imunidade previstas na legislação”, afirma. “Parte do sistema está salvo”, comemora o advogado Ronaldo Corrêa Martins, do escritório Martins e Salvia Advogados.
No entender de Caldas, o último parecer abre caminhos para alguns novos questionamentos por parte de todos os segmentos de previdência complementar. Afinal, a condição de assistência social não deixaria de existir apenas porque o empregado contribuiu com uma parte do plano, ou seja, isso não mudaria a natureza jurídica da fundação. Ele alega que, independentemente de o funcionário contribuir ou não, o setor faz suplementarmente o trabalho que deveria ser exclusivo da Previdência Social. “É uma decisão contraditória”, avalia Caldas.
Outras entidades com as mesmas características da Comshell, que pleiteiam na Justiça a isenção, aplaudiram a decisão, que deve reduzir o universo de ações em andamento. “A repercussão foi muito boa, tendo em vista que temos plano semelhante. A probabilidade de conseguirmos algo semelhante cresceu expressivamente”, confia João Gilberto Bosa, contador e administrador da PreviBosch – Sociedade de Previdência Privada, cujo plano foi criado em 1985 e tem hoje 10.500 participantes.
“Sempre defendemos que a questão da imunidade deveria ser analisada separando as entidades que tenham contribuição total daquelas que contribuem parcialmente. Quando os planos são 100% custeados pela patrocinadora fica caracterizado mais claramente o aspecto social de complementação previdenciária, enquanto as que captam dinheiro dos participantes dos planos estariam um pouco mais distantes dessa função”, diz o diretor jurídico da PreviBosch, Luiz Fernando de Palma.
Para o advogado Martins, essa decisão cria precedente favorável às demais ações de entidades de previdência privada gratuita e abrange todo o conjunto de ações que a PreviBosch tem na discussão da matéria. A empresa briga há dez anos na justiça e tem 15 mandados de segurança impetrados antes da Constituição de 1988 e posteriores (sete ações). Por cautela, a fundação não apenas provisionou como depositou judicialmente todos os valores em discussão nos últimos cinco anos.
“Vamos utilizar todos esses precedentes nos processos em andamento – o da Ceres, que tecnicamente tem 4 votos pela imunidade e um dos votos dos seis, o da ministra Ellen Greice, que embora contra, reconhece a imunidade das gratuitas, ou seja, temos cinco votos favoráveis e um precedente no Supremo.” Martins, todavia, duvida que haja uma revisão tão maciça no sistema de contribuição por parte das empresas que hoje custeiam apenas parte do valor. “Vai prevalecer não apenas o aspecto da imunidade tributária, mas a saudabilidade da empresa que, se vier a ter problemas financeiros, terá de recuar após ter assumido um compromisso de tal magnitude.”