A agroindústria, um dos setores de maior peso na economia brasileira e que já conta hoje com grandes fundos de pensão, está se movimentando para criar novas fundações após as definições em torno da reforma da previdência. Empresas como a SLC Agrícola e a Brasil Agro, duas grandes do segmento, já se preparam para levar a previdência complementar a seus funcionários.
“A instituição de previdência complementar está sendo discutida, há algum tempo, e deve avançar após a reforma da previdência oficial”, afirma Álvaro Dilli Gonçalves, diretor de Recursos Humanos e Sustentabilidade da SLC Agrícola. “É preciso alcançar um equilíbrio orçamentário para todas as empresas que compõe o Grupo SLC”, ressalta. O grupo administra e disponibiliza benefícios de saúde e seguros, entre outros, por meio de uma entidade já constituída, a Fundação SLC. “A decisão da diretoria é de que o benefício seja para todas as empresas do grupo”, explica Gonçalves.
O Grupo SLC foi fundado em 1945, no município gaúcho de Horizontina (RS), e hoje é um dos maiores grupos empresariais do Brasil, empregando cerca de 5 mil funcionários com faturamento anual superior a R$ 3 bilhões. Atua no segmento do agronegócio através da SLC Agrícola, uma das maiores produtoras mundiais de algodão, soja e milho, com 16 unidades de produção localizadas em seis estados brasileiros. Também atua no comércio de máquinas agrícolas, através da SLC Comercial.
Gonçalves acredita que o projeto previdenciário da SLC deve avançar após a definição e aprovação da reforma da previdência. “Precisamos saber quais serão as novas regras do jogo. Com isso, vamos fazer as contas sobre o impacto no trabalho do campo.”
Na Brasil Agro, a situação é semelhante. “Estamos em processo de estudos para poder implementar a previdência complementar na empresa”, afirma Menethey Vianna, coordenadora de Recursos Humanos. No entanto, nesse caso, a motivação maior da companhia é acompanhar a evolução da gestão de pessoas. “Conceitos adotados nos setores da indústria, comércio e serviços estão sendo implementados no agronegócio. As ferramentas de desenvolvimento e estratégias de recursos humanos permitem pensar no colaborador no longo prazo”, afirma Menethey. Além disso, ela reforça que o plano de previdência “é bom dos dois lados, para a empresa e para o funcionário”. “A companhia tem incentivos para implementar esses benefícios.”
A BrasilAgro iniciou suas atividades em 2006 e é uma das maiores empresas brasileiras em quantidade de terras agricultáveis, com foco na aquisição, desenvolvimento, exploração e comercialização de propriedades rurais. Foi a primeira empresa de produção agrícola a abrir o capital no segmento Novo Mercado da B3 e também a listar ADRs (American Depositary Receipts) na NYSE, a bolsa de valores de Nova York. O controle da BrasilAgro é da argentina Cresud, que detém 41% das ações. O restante é free float.
Inicialmente, o plano de previdência da BrasilAgro deve atender aos cerca de 500 funcionários diretos, basicamente tecnólogos em agronomia e engenheiros agrônomos, que administram as atividades dos terceirizados, estimados em 1.500. “Estamos avaliando os produtos existentes e no segundo semestre devemos ter uma visão mais precisa sobre as opções e as possibilidades”, afirma Menethey. Segundo ela, a inclusão dos terceirizados no fundo de pensão também pode vir a ser discutida.
Junto com gigantes – As duas novatas no segmento, se confirmarem sua intenão de criar fundos de pensão, irão se juntar a outras gigantes do setor, como a Cargill e a BR Foods. “Como somos uma empresa espalhada por todo o brasil, nossa percepção é que a preocupação e interesse pelo plano de previdência complementar não está mais restrita aos funcionários nas grandes capitais, mas interessa a todos, do Pará ao Rio Grande do Sul”, afirma Alexandre Muniz, diretor de previdência privada da CargillPrev. Tanto que, além do atual plano CD, a entidade está avaliando a implantação de um plano família. “Temos um plano assistencial que é estendido ao cônjuge, mas estamos estudando o assunto, conversando com entidades que já estão implantando e creio que, em algum momento, implantaremos também na Cargill.”
Constituída em 1988, a CargillPrev segue a diretriz da matriz norte-americana em oferecer um benefício complementar à previdência social, respeitando as particularidades de cada país onde atua. Atualmente, segundo Muniz, são pouco mais de 12 mil participantes, sendo 10.722 ativos, 373 aposentados, 351 autopatrocinados e 531 benefícios proporcionais diferidos. “Entre os planos, oferecemos o Plano BD fechado, plano CD aberto a novos funcionários e um plano CD assistencial com objetivo de acumular recursos para os custos com despesas médicas na aposentadoria”, conta ele.
A política de investimentos da CargillPrev conta com o suporte do Banco Cargill e de traders dos negócios da companhia. “Fazemos estudos com regularidade, principalmente para o plano BD, e olhando sempre a nossa massa de participantes e os ativos disponíveis para investimentos no país”, afirma Muniz. “Outra particularidade importante na Cargill é que a opção por investir em renda variável cabe ao participante”, ressalta. “Aqui, cada um escolhe o quanto quer ter de renda variável em seu patrimônio.”
O que o governo pretende mudar no campo
O projeto de reforma da Previdência (PEC 6/2019), em análise na Câmara dos Deputados, propõe aumento da idade para mulheres, aumento do tempo de contribuição para ambos os sexos e instituição de uma contribuição anual mínima para a aposentadoria rural. Segundo o Ministério da Economia, esse segmento representa 32% dos benefícios concedidos pelo Regime Geral de Previdência Social e 58% do seu déficit.
Essa distorção, de acordo com o governo, acontece porque segurados especiais, ou seja, produtores rurais, extrativistas vegetais, pescadores e indígenas que trabalhem individualmente ou em regime de economia familiar, não precisam comprovar contribuição para se aposentar. Já os trabalhadores rurais assalariados não são considerados segurados especiais e têm que comprovar tempo de contribuição.
A reforma exigirá contribuição comprovada de, pelo menos, 20 anos para alcançar o benefício da aposentadoria especial.