Edição 19
Acuados pelo colapso do orçamento, os estados começam a dar passos
concretos no sentido de criar fundos de pensão para seus funcionários
Acuados pelo colapso do orçamento, os estados começam a dar passos
concretos no sentido de criar fundos de pensão para seus funcionários.
Eles querem dar vida a um sistema capaz de arcar com o pagamento dos
benefícios e aposentadorias de uma massa de servidores inativos que
hoje recebe suas aposentadorias diretamente do Tesouro estadual.
Atualmente, em muitos estados os inativos já representam um terço da
folha salarial e ameaçam equiparar-se numericamente aos funcionários
ativos no futuro próximo.
Em São Paulo, eles representam 34% da folha salarial. No Paraná são
30% e na Bahia 23%. Segundo cálculos da Secretaria da Administração e
Modernização do Estado de São Paulo, os funcionários inativos deverão
chegar a 50% da folha salarial estadual em cinco anos, se nada for feito
para mudar a atual ordem das coisas. Hoje, o estado gasta 62% da sua
arrecadação, o que equivale a R$$ 13 bilhões por ano, com o pagamentos
dos servidores ativos e inativos.
“É o nosso maior problema”, afirma o secretário paulista da Administração
e Modernização do Estado, Fernando Gomez Carmona. O estado de São
Paulo, assim como o Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Minas
Gerais, Espírito Santo e Bahia, estão criando fundos de pensão estaduais
para fugir dessa morte anunciada. “Estamos discutindo as alternativas
concretas para formatar o nosso plano”, diz o secretário da Fazenda da
Bahia, Rodolfo Tourinho Neto.
A formatação de um plano de previdência estadual difere da formatação
dos fundos de pensão que contam com patrocinadoras empresariais. Ao
contrário dessas últimas, os fundos estaduais devem ser aprovados pelas
Assembléias Legislativas dos estados e, a partir dai, passam a ter o seu
orçamento fiscalizado diretamente pelos tribunais de contas estaduais.
São Paulo está na fase final de uma concorrência que definirá o consórcio
que vai desenhar o seu plano previdenciário. Estão no páreo a Brasilprev
(liderada pelo Banco do Brasil, com 40% de participação, e o restante
dividido entre Sul América Seguros, Grupo Arbi, Cia. Paulista de Seguros e
Minas Brasil) e o consórcio São Paulo Previ (liderado pela Vera Cruz
Seguradora). O vencedor vai apresentar três propostas, formatando o
plano que for indicado pelo governo.
A escolha do consórcio que desenhará o plano previdenciário paulista deve
ser anunciada ainda no mês de agosto, segundo o secretário da
Administração e Modernização do Estado, Fernando Gomes Carmona. A
partir da análise de três propostas apresentadas pelo vencedor, e da
escolha de uma pelo governo, o grupo terá cinco meses para desenhar o
fundo e outros oito meses para colocá-lo em funcionamento.
Assim como os outros estados, São Paulo também deve utilizar ativos
estaduais, como imóveis e ações de empresas estaduais, para capitalizar
o seu fundo. Além disso, o governo deverá buscar linhas de crédito em
bancos de desenvolvimento, nacionais ou internacionais, para esse fim,
explica Carmona.
Coelba – O governo da Bahia já separou R$ 300 milhões, saídos da
privatização da Companhia de Eletricidade da Bahia (Coelba), para a
criação do fundo de pensão baiano. “E ainda pretendemos alocar os bons
imóveis que o governo tem – não aqueles que ninguém quer, mas os
realmente bons –, e ações de empresas estaduais para a formação do
patrimônio do fundo”, explica Tourinho Neto.
O governo do Paraná também vai colocar imóveis e ações no patrimônio
da sua fundação, assim que ela tiver sido aprovada pela Assembléia
estadual. Também espera receber do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) um empréstimo de R$ 500 milhões, por conta
de um crédito que tem em haver com o Instituto Nacional de Seguridade
Social (INSS), para capitalizar o fundo.
De acordo com o secretário de Previdência do Paraná, Renato Follador,
esse crédito é relativo às retenções feitas pelo INSS sobre os salários dos
funcionários públicos, no tempo em que eles eram “celetistas” (regidos
pela Consolidação das Leis Trabalhistas). Ao passarem para o Regime
Jurídico Único (RJU), os funcionários públicos passaram a ter suas
aposentadorias pagas integralmente pelo estado e, assim, os recursos
retidos pelo INSS para pagar as aposentadorias teriam que ser
repassados ao estado.
“O INSS reconhece a dívida, mas está enrolando para pagar, com a
desculpa de que eles não sabem como calcular as correções”, diz
Follador. “Mas nós sabemos. Pelos nossos cálculos, as retenções
corrigidas somam R$ 1,2 bilhão”. Como sua expectativa é que o resultado
da cobrança judicial contra o INSS ainda demora a sair, o estado resolveu
pedir um empréstimo ao BNDES, lastreado nessa conta, para constituir o
fundo – cujo patrimônio deverá superar R$ 1 bilhão em seis anos.
A resposta do BNDES ao pleito, segundo Follador, deve sair em 60 dias.
Definida a fonte de recursos, o governo encaminhará imediatamente o
projeto à Assembléia Legislativa, esperando sua aprovação para dar início
à montagem do plano. “O desenho do plano está pronto, o cálculo
atuarial está feito”, conta Follador. “Nosso fundo de pensão será, quanto à
sua natureza jurídica, uma empresa de direito privado e, mais
especificamente, um serviço social autônomo”.
O Paraná foi o primeiro estado a criar um movimento por fundos de
pensão para os seus funcionários públicos, um ano atrás. Segundo
Follador, os secretários gaúcho, catarinense, mineiro e capixaba de
administração estiveram com ele para conhecer detalhes do plano
paranaense. “A intenção de todos é escapar da bomba relógio que se está
montando, pois as aposentadorias estão sendo dadas para trabalhadores
cada vez mais jovens e os aposentados vivem cada vez mais”,
explica. “Muitos inativos e pensionistas acabam vivendo 30 anos após a
aposentadoria ou pensão”.
Na prática, aposentados com vida longa após a aposentadoria recebem
proventos integrais por um período igual ao que contribuíram com uma
parte apenas do salário. É a base do desequilíbrio do sistema. Por isso,
cogita-se de estender as contribuições também aos aposentados. O
secretário Carmona, de São Paulo, é um dos defensores dessa
idéia. “Nosso maior problema está em como financiar as aposentadorias
atuais, e achamos que uma das saídas é fazer os aposentados
contribuírem para o plano”, adianta. “A geração atual não pode arcar
sozinha com o ônus de pagar os benefícios de quem se aposentou lá
atrás”.
Direitos – O presidente da comissão de licitação de São Paulo, Benedito
Chiaradia, acha que dificilmente essa proposta tem chance de passar na
Assembléia. “Existem direitos adquiridos, que devem ser respeitados”,
afirma.
Esses direitos adquiridos, entre outras coisas, devem levar os estados a
optar pelo regime de benefício definido na formatação do plano, uma vez
que o estatuto do funcionário público estabelece que a aposentadoria será
paga pelo valor do último salário da ativa, o que é a mesma coisa que
obrigar à opção pelo BD. O Paraná dá isso como certo, conta Follador.
Carmona, nem tanto. “A Constituição gera direitos que, de certa forma,
acabam obrigatoriamente criando benefícios definidos. Precisamos de uma
solução para quem está no sistema agora e não para quem vive dos
direitos adquiridos”, ressalta.
Segundo ele, achar alternativas à essas questões é tarefa da empresa
vencedora da concorrência. No edital, o governo exige estudos detalhado
em quatro frentes: jurídica, técnico-atuarial, financeira e organizacional,
com pelo menos três alternativas viáveis de plano. Exige ainda a definição
de uma política de recursos humanos, a especificação da origem dos
recursos financeiros, a criação de uma carteira de empréstimos aos
servidores, um padrão mínimo de seguridade, adoção de modelos de
capitalização e repartição de capital de cobertura, além de instituir o uso
de instrumentos de gestão de riscos.
Estipula ainda que a empresa vencedora sinalize para uma
descentralização, ou seja, para a criação de vários fundos ao invés de um
único. Assim, o estado de São Paulo teria, por exemplo, o fundo de
pensão das universidades, da Justiça, etc. A intenção é evitar a
concentração para “diluir os riscos”, explica Carmona.
Além disso, sugere a participação dos servidores na administração do
fundo, a possibilidade de contratar terceiros para gerenciamento dos
recursos, sejam empresas nacionais ou estrangeiros, a portabilidade da
poupança, o controle dos investimentos por parte do participante e a
incorporação dos ganhos financeiros à poupança.
De acordo com Carmona, para que esses fundos começem a operar já em
1.998, o governo paulista deve propor à Assembléia Legislativa, de
imediato, uma lei que estipule a contribuição para efeito de aposentadoria
dos servidores estaduais, o que facilitará a aprovação do estudo técnico
pelos deputados, quando o projeto chegar.