Edição 176
Guilherme Narciso de Lacerda – presidente da Funcef – Fundação
dos Economiários Federais
Atualmente intensifica-se o debate nacional acerca das condições
necessárias para fazer o País crescer 5% ou mais ao ano. Há ampla
concordância de que para se atingir tal objetivo é preciso deslocar nosso
nível de investimentos – hoje ao redor dos 20% do PIB – para algo em
torno de 25% e de que os projetos de infra-estrutura precisam sair do
papel e vencer os gargalos que travam a expansão sustentada de nossa
economia. Faz-se necessária, portanto, a análise da atuação dos fundos
de pensão brasileiros no que concerne às possibilidades de se destinar
recursos para o setor de infra-estrutura, identificando a significância do
setor como coadjuvante expressivo de um projeto econômico que
reconduza o país a uma trajetória de desenvolvimento sustentável.
Dados recentes divulgados pela ABRAPP mostram que ainda há
predomínio da alocação dos recursos das entidades fechadas de
previdência complementar em aplicações de renda fixa, nas quais
prevalecem os investimentos em títulos públicos. Mas nem sempre foi
assim. Em meados da década passada os fundos de pensão detinham
uma participação muito maior de seus investimentos em renda variável. O
crescimento da participação de títulos públicos nas carteiras dos fundos de
pensão se deu à medida que se expandiu a dívida pública mobiliária
federal.
Em 1994, quando tal dívida estava em 30% do PIB, a participação de
renda fixa na carteira dos fundos de pensão era de apenas 40%. Ao final
de 2006 esses percentuais apresentam-se invertidos, tendo a renda fixa
representatividade de 64% da carteira dos fundos, enquanto a dívida/PIB,
50%. Portanto, o financiamento do passivo nacional, ou seja, a aquisição
de títulos públicos constitui-se, atualmente, na principal alternativa de
investimentos dos fundos de pensão. Em renda fixa, onde prevalecem tais
títulos, estão destinados mais de dois terços dos investimentos totais do
setor.
Esse cenário aponta para uma mudança. Se levarmos em conta certas
projeções, a disponibilidade financeira dos investidores institucionais pode
ultrapassar a marca de 50% do PIB, no final dessa década.
Simultaneamente, as estimativas desenvolvidas pela Secretaria do
Tesouro Nacional (STN) indicam uma redução contínua e gradativa da
relação Dívida/PIB (que poderá estar entre 37% e 40% do PIB, no mesmo
período). Nestes termos, haverá um montante significativo de recursos da
poupança agregada nacional, disponível para ser deslocado da aplicação
majoritária atual, em títulos públicos, para os investimentos produtivos.
Ou seja, diante desse cenário não haverá espaço para todos ocuparem
suas carteiras com a compra de títulos federais e, fundamentalmente,
haverá a inexorável necessidade de se buscar aplicações alternativas para
as carteiras.
Todavia, a realocação de parcela dos recursos hoje aplicados em renda
fixa para investimentos alternativos dependerá do ritmo de queda da taxa
de juros e também (importantíssimo frisar) da oferta de investimentos
alternativos com boa rentabilidade. Ou seja, os investimentos em infra-
estrutura só serão executados pela iniciativa privada se, e somente se,
tiverem rentabilidade atrativa em seus fluxos de caixa para atrair os
investidores.
Voltando ao ponto das possibilidades de investimento dos fundos de
pensão, e observando os aspectos legais, a Resolução 3.121 do Conselho
Monetário Nacional, aprovada em Setembro de 2003, estabelece que os
fundos podem alocar até 50% de seu patrimônio em renda variável.
Existem duas alternativas para se fazer tal alocação. Uma, é através da
aquisição direta de ações das empresas. A maior parte dos investimentos
atualmente realizados pelos fundos de pensão ocorreu por este caminho.
Neste caso, há diversos meios de se ter uma participação acionária, mas
pode-se resumir em duas formas: através da compra em bolsa ou através
da negociação direta, assumindo uma participação relevante e, no mais
das vezes, entrando no grupo de controle da companhia.
Outra alternativa para se fazer investimentos em empresas é a partir dos
Fundos de Investimentos em Participações, os chamados FIPs. Tal forma
permite maior diversificação da carteira, tanto pelo lado dos investimentos
quanto pela diversidade, além de permitir uma melhor governança dos
negócios. É esta a forma que estamos priorizando para destinar recursos a
projetos de infra-estrutura.
É provável que nos primeiros anos apenas um número restrito de fundos
de pensão tenha disposição de participar de estruturas de investimentos
mais sofisticadas – como é o caso da montagem dos FIPs – e, assim,
destinar parte de suas disponibilidades para investimentos estruturantes.
Em parte, este redirecionamento de aplicação já está ocorrendo, mas
atinge um grupo seleto de investidores corporativos nacionais.
Os atores atuais são os grandes fundos e também investidores
estrangeiros ou mesmo detentores nacionais de grandes fortunas. No caso
de fundos de pensão estrangeiros, há um espaço ainda a ser ocupado e é
possível admitir que eles crescerão nos próximos anos, atuando em
parceria com os investidores nacionais.
A intensificação da realocação de recursos dos fundos de pensão para os
investimentos produtivos pode se efetivar com o desenvolvimento dos
mercados secundários dos títulos privados de crédito. Por isso, há
necessidade de se aprimorar a atuação da CVM e definir medidas que
dêem mais segurança aos investidores.
O deslanche dos investimentos em infra-estrutura exigirá aportes
complementares de diferentes fontes. Para os projetos não
mercantilizáveis (sem atratividade econômico-financeira), os recursos
terão que vir dos orçamentos públicos. Como estes são reconhecidamente
escassos, será necessário construir alternativas para tornar atrativos à
iniciativa privada certos projetos hoje tidos como não viáveis. Ou seja, o
que interessa é o fluxo de caixa. Neste ponto é que entra a capacidade
governamental de estruturar projetos na modalidade de PPPs.
Para os projetos mercantilizáveis (que têm fluxos de caixa atraentes), os
recursos administrados pelo BNDES são os componentes principais dos
fundings requeridos. A eles se somam os recursos próprios das empresas,
os recursos ofertados por agencias multilaterais, o financiamento bancário
externo e interno e as participações acionárias complementares de
investidores corporativos. Portanto, dada a carência de recursos
disponíveis na esfera pública e as limitações presentes na economia
nacional (baixos níveis de crédito) cresce a importância da participação de
recursos complementares dos investidores corporativos.
Os fundos de pensão serão os atores relevantes (mas nunca os únicos)
desta realocação de recursos hoje ancorados nos títulos federais para os
investimentos produtivos, com destaque para os setores de infra-
estrutura. As aplicações de recursos dos fundos de pensão deverão ocorrer
por intermédio da participação em consórcios ou como investidores
associados ou mesmo em aquisições de lotes de ações em ofertas
públicas ou transferências/alterações nos grupos de controles.
Devemos enfrentar, também, o que podemos chamar de custos de
transação (estruturação de negócios, pagamentos de taxas, consultorias,
exigências burocráticas) e o custo institucional que corresponde às
incertezas decorrentes da indefinição presente em certos setores e
projetos quanto à suas referências institucionais, de meio ambiente e
regulatória. Os fundos de pensão, os empreendedores e, na certa, os
demais investidores institucionais têm apetite para destinar recursos a
projetos de infra-estrutura. Mas isso só se efetivará na medida em que,
primeiro, os projetos estejam disponíveis e, segundo, que sejam viáveis
financeiramente. Criar estas condições é o grande desafio que nos coloca
neste momento.