Enfim uma vitória na Câmara | Governo federal concentra esforços,...

Edição 235

Quando o senador Garibaldi Alves Filho foi chamado para o Ministério da Previdência Social, não imaginava que seria protagonista do principal projeto do governo Dilma: a aprovação da previdência complementar para os servidores da União. Um dos principais nomes do PMDB, o senador até reclamou do cargo na época; disse que não entendia e nem gostava de previdência. Pouco mais de um ano após sua nomeação, o ministro mostra-se muito mais animado, e nem a crise na base aliada do governo parece afetar a tramitação do projeto do Funpresp no Congresso. “Vamos aprovar no Senado dentro de 45 dias”, disse Garibaldi em entrevista exclusiva concedida em meados de março.

Após três mandatos como senador, o ministro demonstra confiança sobre a aprovação do Funpresp no Congresso. Afinal, tem utilizado sua principal virtude, a negociação política, para conseguir avanços como a aprovação do projeto de lei 1992/2007 na Câmara no final de fevereiro. Depois da tentativa frustrada de votação no fim do semestre anterior, o projeto sobreviveu e prosseguiu para o Senado, mas não sem sofrer uma série de mudanças devido às pressões de diversos segmentos.
Uma das mudanças principais de última hora foi o aumento da contribuição de 7,5% para 8,5% por parte da União, acima do que exceder o teto do INSS. Esse aumento é explicado pela incorporação de um fundo de longevidade, que torna o plano vitalício. Apesar de manter em sua proposta a modalidade de contribuição definida (CD), na prática o modelo adotado será de contribuição variável (CV), pois garante a renda vitalícia. Essa garantia é bancada por um fundo de longevidade custeado com recursos da União, daí o aumento da contribuição. “Se usarmos por exemplo a tábua AT-2000, a média de vida é de cerca de 85 anos. Mas para aqueles que passam dessa idade, haverá uma renda vitalícia”, diz José Edson da Cunha Jr, secretário-adjunto da Secretaria de Políticas de Previdência Complementar (SPPC).
Outra mudança na mesma linha foi a criação de outro fundo especial para mulheres e policiais, que vai custear a diferença de tempo de contribuição. Como possuem um tempo de contribuição cinco anos menor que o dos homens, as mulheres e os policiais terão um fundo, também bancado pela União, para garantir uma remuneração como se aportassem durante 35 anos.
Gestão dos recursos – Desde que o projeto de lei 1.992 começou a tramitar na Câmara, em 2007, as regras para a gestão dos recursos sofreram alterações importantes. O texto original previa a obrigatoriedade da terceirização de 100% na gestão dos investimentos do fundo de pensão. Na fase final de tramitação, as regras mudaram nesta questão, permitindo tanto a gestão interna quanto a administração mista, ou seja, uma parte dentro de casa e outra terceirizada. As decisões ficam a cargo dos comitês gestores dos planos.
Outra mudança que vai afetar a gestão dos investimentos é o fato de que o Funpresp ficou como uma entidade de direito privado, mas de natureza pública. O texto original previa que o fundo de pensão teria natureza privada. Se o projeto mantiver essa característica após tramitação no Senado, o Funpresp terá que seguir a Lei 8.666, que obriga a realização de processo de licitação pública para a contratação de prestadores de serviços. Ou seja, em caso de terceirização da gestão dos recursos, será necessária a realização de licitação com as assets interessadas.
Além disso, como nos primeiros dois anos o Funpresp estará em processo de formação de sua estrutura, neste período não haverá capacidade de realizar processos de licitação. Por isso, a saída será a contratação de instituições públicas. Assim, no caso da gestão dos investimentos, os recursos iniciais, previstos em R$ 100 milhões, e aqueles que forem entrando nos primeiros meses, ficarão sob gestão de bancos estatais (como Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, etc). De resto, os investimentos seguirão as regras da Resolução número 3.792 do Conselho Monetário Nacional (CMN). Outra decorrência do aspecto “público” de sua natureza é a obrigatoriedade de realização de concursos públicos para formação dos quadros. Essa é um dos motivos que preveem um prazo de até dois anos para a criação da estrutura do Funpresp. Outros aspectos da governança do fundo de pensão serão regidos normalmente pela Lei Complementar 108, da previdência complementar.
Uma alteração já noticiada anteriormente foi a criação de pelo menos três entidades separadas, uma para cada um dos poderes. A proposta original previa a criação de uma única entidade para todos os servidores. Como o Judiciário não ficou satisfeito, o governo tinha acenado com a proposta de criação de planos de benefícios separados para cada poder, mas mantendo o modelo de uma única entidade fechada. Porém, o Judiciário continuou pressionando pela mudança. “Foi uma intensa negociação política. No final entendemos que era importante preservar a questão da independência entre os poderes, apesar de ter criado uma estrutura mais onerosa”, diz o secretário-adjunto da SPPC.
Projeções otimistas – Apesar de não prometer uma solução imediata para o equacionamento do déficit dos servidores da União, a criação do Funpresp transforma a situação da previdência complementar no País. “Saímos de um cenário sombrio de aumento do déficit dos servidores para ingressar em um cenário otimista em que tem se transformado a previdência fechada no País”, observa Nélia Campos Pozzi, presidente do Sindicato Nacional das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Sindapp). A dirigente acredita que as resistências de mudança apresentadas por setores do funcionalismo federal serão derrubadas com o conhecimento do novo ambiente da previdência complementar.
Hoje as entidades fechadas acumulam recursos da ordem de R$ 603 bilhões, segundo dados da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), representando 14,6% do Produto Interno Bruto (PIB).
Segundo projeções da SPPC, o Funpresp deve acumular cerca de R$ 231 bilhões em um prazo de 20 anos, considerando-se os três fundos em conjunto. É o prazo também para que o fundo de pensão do Executivo, que representa mais de 60% do número de servidores (630 mil ativos), se torne uma das maiores entidades do País em termos de patrimônio, tão grande ou maior que a Previ (BB).
“A criação dos novos fundos de pensão será capaz de ampliar a relação entre a poupança interna da previdência complementar e o PIB brasileiro, gerando uma série de benefícios para o setor produtivo da economia”, prevê Cunha Jr. Ele ressalta, porém, que o déficit não é uma questão com solução imediata – ao contrário, nos primeiros anos a União terá um aumento dos gastos, pois terá que continuar custeando os atuais inativos, além de contribuir para o fundo de pensão dos novos servidores. A previsão é que o déficit comece a cair a partir de 2030.

 

Confiança na aprovação no Senado é muito grande, diz ministro

Investidor Institucional – Quando assumiu o ministério no início do ano passado, o senhor chegou a dizer que não gostava ou entendia de previdência. O que mudou de lá pra cá?

Garibaldi Alves – No momento da posse, falei que a previdência representava um desafio grande. Meus amigos me falaram que eu enfrentaria um verdadeiro abacaxi. Fui muito sincero quando disse que não entendia muito das questões da previdência e que procuraria entendê-las para dar minha contribuição e acionar a melhor equipe possível. Hoje posso afirmar que reuni uma boa equipe. Por exemplo, na previdência complementar, o secretário Jaime Mariz foi quem se encarregou de levar adiante as negociações do projeto.

II – O que representa a aprovação do Funpresp na Câmara dentro das prioridades do governo Dilma?GA – A previdência dos servidores tornou-se uma prioridade não apenas do Ministério da Previdência, mas de todo o governo Dilma. Por isso, houve um envolvimento direto dos principais ministérios, como Fazenda, Casa Civil e Planejamento. É uma prioridade mesmo, porque realmente mobilizou vários ministérios.

II – As mudanças ao longo da tramitação do Funpresp provocaram a desconfiguração do projeto, como a aprovação de três fundos de pensão separados?GA – Sendo sincero, o único problema da aprovação de três entidades separadas é que a administração será um pouco mais onerosa. Não posso negar que, sendo uma reivindicação do próprio Supremo Tribunal Federal, não teria como o governo ignorar isso.

II – Poderia ser gerado um problema de inconstitucionalidade no futuro se fosse aprovado um único fundo de pensão?GA – Sim, poderia dar espaço para uma ação de inconstitucionalidade com o argumento de ferimento à autonomia dos poderes da República. Poderia surgir a questão de que os poderes não estariam sendo respeitados.

II – Como se pode evitar as disputas políticas pelo comando de três grandes fundos para que isso pelo menos isso não afete o profissionalismo na gestão?GA – Não acredito que esses fundos, ou pelo menos sua administração, gerem alguma disputa política. Ao menos isso não deve ocorrer no início da gestão, porque será uma tarefa muito árdua. Vamos ter uma administração que terá pela frente uma tarefa onerosa. Mais para a frente, daí teremos uma perspectiva totalmente diferente. No futuro, acreditamos que esses fundos serão os maiores de previdência complementar do Brasil. Mas isso ainda vai levar muitos anos.

II – Como será a gestão dos investimentos do Funpresp? Há alguma restrição aos bancos privados?GA – A decisão de terceirizar ou não a gestão caberá a um conselho gestor. Se o conselho definir pela terceirização, terá que fazer uma concorrência pública. Mas pode selecionar tanto bancos públicos quanto privados.

II – A economia gerada pelo Funpresp em longo prazo poderia ser aplicada para melhorar as políticas de carreira e a remuneração dos servidores?GA – Com relação à remuneração do quadro de servidores, acredito que não haverá grandes mudanças no curto prazo. O governo está limitado à Lei de Responsabilidade Fiscal, não tem uma margem muito grande para aumentos de remuneração. Mas em longo prazo, acredito que isso pode começar a acontecer.

II – O Ministério da Previdência vai incentivar a criação da previdência complementar nos estados?GA – Logo após a aprovação do projeto no Senado, vamos fazer um seminário aqui em Brasília para trazer os estados. Sabemos que São Paulo já se antecipou. Mas outros também estão se movimentando nessa direção.

II – E quais são as perspectivas no Senado? Sua trajetória no Congresso deve ajudar na aprovação?GA – Nossa confiança na aprovação do Senado é muito grande. Acredito que será aprovado dentro de 45 dias. Sendo eleito por três mandatos como senador, me autorizo a dizer que um projeto dessa natureza não deve enfrentar dificuldades, porque isso não é uma política de governo, é uma política de estado.

II – Com a perspectiva de aprovação do Funpresp o senhor começou a gostar de previdência ou ainda não?GA – O fato de eu estar gostando da previdência é por estarmos hoje avançando com a tramitação no Congresso. Se eu estivesse na previdência apenas para administrar os déficits, sem nenhuma perspectiva de mudança para o futuro, continuaria desanimado.

 

Mudanças no Projeto de Lei 1992/2007 – Funpresp
Antes 
Entidade única para os três poderes 
Contribuição da União 7,5% 
Terceirização da gestão dos investimentos 
Plano Contribuição Definida (CD) 
Mesmo plano para homens e mulheres 

Depois

Três entidades (Executivo, Judiciário e Legislativo)


Aumento para 8,5%

Interna, mista ou terceirizada

Plano CD mais Fundo de Longevidade

Fundo especial para mulheres

Fonte: Secretaria de Políticas de Previdência Complementar (SPPC)