Edição 149
Após 21 anos de disputas em torno da tributação das aplicações dos fundos de pensão, o assunto foi finalmente liquidado com a publicação da Medida Provisória de número 209, assinada no dia 26 de agosto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A MP assinada por Lula acaba com a cobrança do IR na fase de acumulação de reservas. Ela também extingue o Regime Especial de Tributação (RET) para as fundações e iguala o tratamento tributário dados às entidades fechadas e abertas de previdência, criando incentivos reais para que os participantes dos planos de previdência complementar de ambos os regimes deixem seus recursos aplicados no longo prazo (ver íntegra da MP no site www.investidoronline.com.br).
A MP, que vale tanto para o estoque quanto para as novas contribuições, suspende a partir de 1º de janeiro de 2005 o recolhimento trimestral de 12% sobre os ganhos dos fundos de pensão. Essa forma de tributação não-diferida – criada em setembro de 2001 com o RET e que vigora desde janeiro de 2002 – foi adotada para compensar um buraco na arrecadação da Receita, que concede à empresa patrocinadora dedução de 34% do valor aplicado no IR, ao passo que o beneficiário pagava, em média, 22% no momento de sacar os recursos.
“Essa medida muda radicalmente o quadro da previdência complementar no Brasil”, afirma o secretário da Previdência Complementar (SPC), Adacir Reis, que participou ativamente nos últimos meses das negociações que culminaram com a assinatura da MP.
Para o presidente da fundação Petros, Wagner Pinheiro, “a MP veio a contento e atendeu tudo o que nós esperávamos e lutávamos já há duas décadas. A nossa tributação deve ser igual ao resto do mundo. Agora, estamos em pé de igualdade com os gestores privados e o caminho está aberto para a conquista de novos patrocinadores.”
Ainda de acordo com Pinheiro, a medida será bastante benéfica, sobretudo para os fundos pequenos e médios, que estão em crescimento e contam com maior contribuição dos patrocinadores. “A Petros que, ao contrário, já é um fundo maduro terá uma economia anual de R$ 50 milhões com a isenção do IR.”
Segundo o diretor de controladoria da Funcef, Carlos Caser, “as medidas vão ao encontro de um desejo antigo dos fundos de pensão. Sempre foi uma reivindicação nossa que, inclusive, foi vetada na 109. Depois veio o RET e foi uma decisão completamente paliativa. Agora, o governo segue no caminho certo: o do incentivo à poupança de longo prazo. O Brasil precisa disso.”
De acorco com Adacir Reis, a assinatura da medida eleva o Brasil ao padrão internacional de previdência – pelo qual o IR já é cobrado só na fase de consumo e não de acumulação – e resguarda o princípio da neutralidade entre as diversas modalidades de previdência (fechadas e abertas, essas com seus PGBLs e VGBLs). E mais, diz ele, a MP cria uma tabela de IR para a pessoa física que é facultativa. “O participante pode escolher se fica onde está ou se vai para o tratamento tributário B”.
Na prática, deverá funcionar assim: a partir de 1º de janeiro de 2005 os novos planos de Contribuição Definida (CD) serão tributados em 35% em IR, caso o participante venha a sacar os recursos em um período inferior a dois anos. Se não houver essa retirada, a cada dois anos, esse porcentual será decrescido em cinco pontos porcentuais até chegar ao limite de 10%, o que ocorrerá em dez anos. Já os participantes de planos existentes podem migrar para esse sistema de “tributação B” – caso a entidade o ofereça – ou ainda recorrer à portabilidade, que está condicionada à cessão do vínculo empregatício. Em ambos os casos, o tempo seria contado de forma pretérita. Aqueles que preferirem ficar onde estão, pagarão o IR no momento do saque de acordo com a tabela progressiva. Atualmente, essa tabela isenta os rendimentos de até R$ 1.058,00; cobra 15% entre esse valor e R$ 2.115,00; e 27,5% acima dessa quantia.
Apesar de a tabela tributária “B” ser alternativa, aqueles que optarem por ela e tiverem alguma emergência na qual precisem sacar os recursos imediatamente (em menos de dois anos) terão que assumir o ônus de pagar um imposto bem mais salgado do que o atual (do máximo de 27,5% passará a 35%). No modelo americano de previdência complementar essa “penalidade” para quem saca recursos no curtíssimo prazo também existe, incluindo aí uma cobrança de taxa de administração, só que o sistema americano oferece a alternativa de empréstimos lastreados em reservas do plano para aquele participante que passar por imprevistos. O que não ocorre por aqui.
Além dessa discussão em relação à MP, às vésperas da sua assinatura ainda havia quem esperasse que o governo reduzisse a zero, e não a 10%, o benefício tributário para quem mantivesse seus recursos no longo prazo. Para Reis, mesmo com a tributação de 10% diferida, a medida já resulta em um enorme avanço, que elimina toda e qualquer dúvida jurídica. “É importante destacar que o regime é alternativo. A preocupação da SPC tem sido alinhar o Brasil aos padrões internacionais e esse objetivo foi integralmente contemplado pelo governo que, desde o primeiro momento, se mostrou bastante sensível a essa questão”, disse Reis, informando que a decisão saiu no momento certo, em meio a indicadores otimistas sobre a economia brasileira.
Com relação à queda na arrecadação do governo, o secretário de previdência complementar estima que ela será bem menor do que comenta-se no mercado, não chegando a R$ 300 milhões por ano. “Ainda que se tenham perdas aos cofres públicos no curto prazo, sem dúvida, haverá ganhos no longo prazo. Por isso, essa renúncia é relativa. Ela pode até não ocorrer, já que o sistema é alternativo e existirão aqueles que ficarão onde estão e os que pagarão 35%. Além disso, está havendo um aumento dos participantes dos planos e a tendência é de que a arrecadação do governo aumente”, disse Reis.
O secretário da SPC aposta que, em dez anos, a previdência complementar, aberta e fechada, alcançará 25% do Produto Interno Bruto (PIB), não sendo improvável chegar em 30%. Hoje, ela está em torno de 16%. Para Reis, medidas como essa MP, os fundos multipatrocinados, a previdência associativa, a previdência do setor público, entre outras, só vêm somar a esse “crescimento real do setor”. Vale lembrar que a reivindicação dos fundos de pensão de isenção de IR na fase de acumulação, atendida por esta MP, constava na Lei Complementar número 109, porém esse trecho foi vetado pelo governo anterior.
Como é hoje
• A empresa patrocinadora de um fundo de pensão deduz de seus impostos a pagar o equivalente a 34% do valor aplicado no fundo. Este porcentual corresponde à alíquota de 25% de Imposto de Renda (IR) e de 9% de Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL).
• Já o participante do fundo de pensão deduz integralmente do IR anual o valor aplicado. Ele só recolhe o imposto quando passa a receber o benefício ou quando resgata os recursos antecipadamente. Segundo a Receita, a alíquota média paga pelos beneficiários é de 22%.
• Como a empresa deduz 34% do seu IR e o beneficiário paga, em média, 22% em IR, a Receita deixa de receber 12%. Para evitar essa perda, a Receita instituiu em setembro de 2001 o RET para todos os fundos de pensão com patrocinadores, pelo qual é cobrado trimestralmente 12% sobre os ganhos acumulados das reservas.
O que muda
• A partir de 1º de janeiro de 2005, a alíquota de 12% seria extinta.
• A alíquota de IR incidente para os participantes do fundo de pensão seria decrescente ao longo do tempo, começando em 35%. A cada dois anos, ela seria reduzida em cinco pontos porcentuais até o limite de 10%.