Em busca de autonomia | Está pronta a Medida Provisória que trans...

Edição 152

Uma Medida Provisória (MP) separa o Brasil do grupo dos vinte países que já trabalham com órgãos de supervisão de previdência privada. Assim que ela for assinada pelo Palácio do Planalto – o que não tinha ocorrido até o fechamento desta edição –, a atual Secretaria de Previdência Complementar (SPC) será transformada em Superintendência. Embora permaneça subordinada ao Ministério de Previdência e Assistência Social (MPAS), a nova superintendência ganhará logo de cara autonomia política, flexibilidade operacional, estabilidade de dirigentes e profissionalização de quadros.
Segundo o secretário de previdência complementar, Adacir Reis – nome mais cotado para assumir a pasta –, a nova estrutura terá uma diretoria colegiada, que será formada pelo superintendente e por quatro diretores. Reis diz que é possível que essa diretoria tenha mandato, apesar de ainda não haver definição sobre isso. A Superintendência também terá cerca de sete departamentos, entre eles o de fiscalização, de investimentos e de administração, e um ouvidor, figura típica da constituição de uma Agência.
Durante muito tempo aventou-se a possibilidade da transformação da SPC em uma Agência. A proposta, obviamente, não caiu nas graças do ministro da Previdência, Amir Lando, que, com isso, perderia o poder sob a SPC. A Agência foi defendida por alguns representantes do setor, principalmente os ligados ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Chegou-se até a cogitar a possibilidade de se criar uma única Agência de previdência, que juntaria SPC e a Superintendência de Seguros Privados (Susep). Entretanto, se constituída a Agência, ela estaria desvinculada do Ministério e seu representante teria mandato fixo – não podendo ser destituído como ocorre no caso da Superintendência.
Longe desse perigo, Lando é o primeiro a defender a criação da Superintendência. “A MP está pronta esperando apreciação do núcleo governamental”, diz. Com isso, o ministro encerra a questão de que a Superintendência pudesse ser criada por meio de um projeto de lei. Segundo o ministro, a nova formatação dará maior estabilidade jurídica à previdência complementar e ajudará na definição de metas claras para que o setor se fortaleça e desempenhe uma função importante na sociedade. “A nova autarquia terá estrutura própria, voltada mais fortemente para a fiscalização”.

O desenho da autarquia – Os funcionários da nova Superintendência passarão a ser de carreira (técnicos administrativos), o que evitará a dança das cadeiras nas trocas de governo que, comumente, transferem para o setor privado servidores que acabaram de ser treinados e capacitados para a função. Hoje, parte do quadro de funcionários da SPC ainda é composto por profissionais sem experiência direta no setor.
A Superintendência irá incorporar os atuais 280 servidores da SPC e aumentar esse quadro ano a ano. Só de auditores, serão contratados 450 nos próximos três anos (hoje a SPC trabalha com 92 auditores), segundo estimativas de Reis que, ao traçar tais planos para a entidade, de tão longo prazo, dá sinais claros de que tem tudo para ser promovido à superintendente em breve.
O principal executivo da nova pasta, assim como ocorre com órgãos semelhantes, será indicado pelo presidente da República e nomeado pelo ministro do MPAS. Caso a indicação de Reis se efetive, não será surpresa alguma para o mercado. Até porque, no momento, os fundos de pensão estão muito mais interessados em saber como se dará o financiamento da nova Superintendência – o que é comum na maioria dos países pesquisados pela Organização da Cooperação para Desenvolvimento Econômico (OCDE) que trabalham com “agências” supervisoras (ver quadro na página ao lado).
Não se sabe, por exemplo, se o valor das taxas seria rateado entre as fundações ou se ele seria fixado levando-se em consideração o porte de cada uma delas. Segundo o especialista em previdência privada da OCDE, Vinícius Carvalho Pinheiro, o financiamento privado confere à Superintendência maior autonomia e flexibilidade, permitindo que ela possa ser constantemente atualizada em termos tecnológicos e profissionais em relação ao desenvolvimento do mercado, independentemente de restrições orçamentárias do governo.
Pinheiro ressalva, entretanto, que o modelo orçamentário deve ser estipulado de forma bastante transparente para evitar o risco de que a Superintendência seja “capturada” por seus financiadores. O secretário-adjunto da SPC, Leonardo André Paixão, também alertou para os riscos de interferência do setor privado, caso este venha a financiar a nova agência, lembrando que o mercado de previdência no Brasil ainda tem uma tradição tutelar por parte do governo.
A independência orçamentária é uma bandeira de Adacir Reis, que busca adequar o corpo da entidade ao tamanho do universo dos planos: hoje, são 326 entidades que respondem por R$ 260 bilhões em ativos e abrangem sete milhões de pessoas entre participantes, dependentes e assistidos. “Precisamos de agilidade. A aprovação de um plano, por exemplo, não sai dentro dos 15 dias previstos”, diz, lembrando sempre que a transformação da SPC em Superintendência consta desde o primeiro minuto do programa de governo do presidente Lula (PT).
“O importante é ter especialização e estabilidade de regras e de comportamento. Essa estrutura tem que transcender a mudanças de governos. A continuidade do modelo é vital. Várias empresas já deixaram de incluir planos de previdência na sua política de recursos humanos por temerem alterações de regras”, explica. “O compromisso da SPC é com a transparência e expansão”, finaliza Reis. O economista principal para o setor financeiro do Banco Mundial, Roberto Rocha, elogia os planos de crescimento da SPC e, enquanto negocia um empréstimo à entidade (ver matéria na página 18), diz apoiar a criação da Superintendência. “Há um ganho de qualidade quando se passa a ter autonomia”.
O presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), Fernando Pimentel, é outro entusiasta da idéia. “Defendemos a estabilidade institucional, autonomia administrativa e corpo técnico permanente e duradouro”, diz, enfatizando que a SPC tem dado passos importantes em direção à auto-regulação do setor. “Nosso produto é credibilidade e o caminho é esse”, diz. O ministro Amir Lando concorda: “o importante é cuidar de normatizar e fiscalizar o necessário. A democracia moderna é participativa”.
Os presidentes dos dois maiores fundos de pensão do País, Sérgio Rosa, da Previ, e Wagner Pinheiro, da Petros, igualmente elogiam a auto-regulação proposta pela SPC. “Quanto mais a regra for qualitativa do que quantitativa, melhor será para o segmento”, diz Rosa. O executivo acredita que a Superintendência é consenso no mercado e que a mudança acarretaria, de fato, em um maior grau de profissionalização da SPC – necessário para um setor que responde por mais de 16% do Produto Interno Bruto (PIB).

O tempo não pára – Enquanto a secretaria de Adacir Reis aguarda ser guindada a status de autarquia, os planos seguem a todo o vapor. Segundo o secretário, até o final do ano, todos os estatutos das entidades estarão adaptados à Lei Complementar 109. Será uma grande força-tarefa, uma vez que ainda há uma pilha de documentos na fila de análise da entidade. Além disso, diz Reis, até esta data 100% dos fundos de pensão terão Conselho Fiscal (CF). Hoje, cerca de 70% deles trabalham com esse Conselho.
Ainda no final deste mês, o Conselho de Gestão da Previdência Complementar (CGPC) irá se reunir para votar a qualificação dos planos de Benefício Definido (BD), Contribuição Definida (CD) e Contribuição Variável (CV) – conforme a Investidor Institucional antecipou na edição de setembro.
E, até 17 de dezembro, a SPC finalizará a listagem das fundações no Cadastro Nacional de Planos de Benefícios (CNPB). Reis informou, ainda, com exclusividade à Revista, que a SPC já estuda implantar em 2005 encontros sobre governança corporativa com os conselheiros dos fundos de pensão nas empresas das quais eles são acionistas – nos moldes do que a Previ já faz hoje.