EFPCs devem usar IA em suas decisões de investimentos | Ricardo ...

Edição 363

A evolução das inovações tecnológicas, de maneira exponencial, impõe mudanças de paradigmas de forma sistêmica, a exemplo do uso de aplicativos de Inteligência Artificial (IA), com suas múltiplas possibilidades de atuação, inclusive como apoio na gestão dos ativos. Nesse sentido, acreditamos que a adoção dessas tecnologias revolucionárias em nosso segmento de atuação, Entidade Fechada de Previdência Complementar (EFPC), tornarão-nos mais eficientes e assertivos na gestão, em especial dos investimentos.
As grandes entidades certamente seguirão esse caminho, por outro lado, a não utilização dessas ferramentas poderá significar perda de eficiência na gestão e nos resultados almejados. Como CEO da Funcef, temos incentivado nossa equipe de especialistas que operam no setor, a buscar as soluções tecnológicas disponíveis no mercado que possam ser incorporadas às nossas atividades, a exemplo do uso ponderado da IA.
Com base no cenário econômico prospectivo atual, contextualizaremos a seguir nossas estratégias e, na sequência, detalharemos como entendemos que as ferramentas de IA terão bom aproveitamento para o segmento.
No cenário externo, a palavra “transição” parece a mais apropriada para 2024. As principais economias avançadas estão indicando uma inflação mais amena e possíveis reduções de juros. A grande questão é quando os juros começarão a cair, principalmente nos Estados Unidos. O mercado especula cortes já no início do ano, mas acreditamos que essa expectativa esteja ainda prematura. A desaceleração da inflação americana está ocorrendo de maneira lenta, o que poderá impactar no quadro. Quanto à atividade econômica, eles podem enfrentar desafios, pois os efeitos de juros altos persistem por algum tempo. Apesar das discussões sobre recessão americana, vemos indícios de algo mais próximo de uma estagnação momentânea. A China, por sua vez, enfrentará um ano desafiador, tentando manter um forte crescimento, apesar dos problemas no setor imobiliário.
Para os países emergentes, este cenário pode ser benéfico. A queda dos juros no exterior pode redirecionar o fluxo de capital e valorizar nossa moeda. No entanto, devido a todas as variáveis que impactam no indicador, é difícil prever um dólar abaixo de R$ 4,50 no médio-prazo. Em termos de crescimento, a nossa equipe econômica aponta que o PIB cresça algo próximo de 1,4%, levemente abaixo das expectativas do mercado de 1,6%. A inflação, apesar de diminuir, ainda parece que ficará próxima aos 4,0%. Portanto, apesar das condições externas e internas indicarem um cenário favorável para mais cortes na Selic, ela deve permanecer próxima aos 10,0%, em 2024.
De 2025 em diante, parece-nos que o mundo e o Brasil tenderão à estabilização. Nos Estados Unidos e Europa, o cenário aponta que a inflação deverá estar controlada e com juros mais baixos. A China deve continuar como grande agente do crescimento mundial. Nesse sentido, o Brasil também aponta para a estabilidade, com uma inflação de longo prazo convergindo para a meta de 3,0%.
Com esse cenário, será um desafio maior adquirir títulos de renda fixa com taxas superiores à nossa meta atuarial/índice de referência, o que consideramos importante para operarmos numa margem de risco segura. Dessa forma, pode ser necessária a adoção de estratégias mais complexas, identificando os melhores ativos e seguimentos que trarão o retorno que as EFPC precisam, mas sem expor nossos participantes a riscos desnecessários.
Nesse contexto, é preciso ser o mais assertivo possível na gestão das carteiras dos nossos planos de benefícios. Nesse momento, ferramentas como Machine Learning1, Inteligência Artificial e Deep Learning2 podem ser incorporadas às nossas atividades, deixando nosso corpo técnico com mais insumos de qualidade à disposição, aumentando, assim, a acurácia da gestão.
Por outro lado, não vislumbramos alterações significativas na gestão de investimentos de nossos planos de Benefício Definido, que possuem cerca de 90% em Títulos Públicos Federais marcados na curva. Para esses planos realizamos a imunização do passivo, buscando garantir que o valor presente dos ativos seja igual ao valor presente dos passivos, assim como a duration, reduzindo o risco de flutuações nas taxas de juros.
Em relação aos planos BD, que necessitam de retorno adicional sobre a meta atuarial, temos feito uma mudança considerável no perfil de alocação desses planos. Com a forte abertura da curva de títulos públicos indexados ao IPCA, em decorrência ainda dos efeitos da pandemia, utilizamos os recursos disponíveis para adquirirmos títulos públicos a taxas acima da meta atuarial. Além dos TPF’s, a aquisição dos títulos bancários e corporativos é relevante, pois esses ativos possuem retorno adicional sobre o título público equivalente, auxiliando para o retorno global dos planos. Por fim, para financiar esses investimentos em renda fixa, temos aproveitado os momentos de forte subida da bolsa de valores para realizar a participação de renda variável líquida. De 2021 para 2023, passamos de cerca de 53% de alocação em renda fixa para mais de 73%.
Já os planos de contribuição definida, possuem portfólio mais diversificado, pois podem assumir pouco mais de risco e seu objetivo é maximizar a relação risco e retorno.
A ideia tem sido manter o foco na alocação estratégica, de longo prazo. Nesse ambiente macroeconômico que se desenha, de redução das taxas de juros de longo prazo abaixo das metas atuariais dos planos de benefícios, a assertividade nas alocações se faz ainda mais necessária. As ferramentas de IA e Machine Learning aparecem para agregar aos nossos analistas em suas projeções.
O avanço da tecnologia está cada vez mais presente no nosso cotidiano. No mercado financeiro, a Inteligência Artificial (IA) desempenha um papel cada vez mais significativo na gestão de investimentos, proporcionando suporte e melhorias em termos de análise, volume de dados para análise e tomadas de decisão.
Nesse contexto, algoritmos de computação podem analisar notícias, relatórios e outras fontes de informação para identificar sentimentos de mercado e informações relevantes que possam impactar os investimentos, dando-nos perspectivas adicionais do mercado. Da mesma forma, padrões, tendências e correlações que podem não ser facilmente identificados por humanos, podem ser constatadas por esses algoritmos através da análise de grandes conjuntos de dados históricos.
Outro exemplo de sua utilização é seu treinamento para analisar todos os dados históricos e realizar previsões da rentabilidade e volatilidade das classes de investimento, bem como a estimativa de índices macroeconômicos, como inflação, bolsa, câmbio, entre outros. Todos esses indicadores são premissas fundamentais no processo de macroalocação da FUNCEF, levando, portanto, a estimativas mais acuradas e alocações mais realistas.
Além de ser uma ferramenta poderosa para a obtenção e análise de dados, a IA desempenha um papel essencial na redução de vieses comportamentais que muitas vezes nos levam a erros devido a fatores emocionais e psicológicos. Importa anotar que os vieses comportamentais, sob a ótica humana, são atalhos mentais ou regras empíricas para encontrar solução para dado problema, levando-nos para o lado contrário ao da racionalidade.
A Inteligência Artificial, pode, portanto, ser aplicada e contribuir também na gestão automática de riscos. Uma vez que ela avalia riscos de maneira realista e sistemática, protegendo-nos contra decisões impulsivas que poderiam resultar em perdas desnecessárias. Sendo útil também para nos ajudar a evitar decisões movidas por esses eventos de curto prazo. Por outro lado, adaptações às mudanças no mercado são importantes e, os vieses comportamentais, como o conservadorismo, em que ficamos apegados às nossas ideias iniciais, podem nos estagnar e nos tornar relutantes em ajustar nossos investimentos.
Outros exemplos práticos do uso dessa tecnologia são: criação de tábuas atuariais personalizadas com a obtenção de dados como hábitos, alimentação, histórico de doenças, entre outros; implantação do Perfil de Apetite a Risco e definição de grupos homogêneos para a implementação de Ciclos de Vida.
Acreditamos que essas ferramentas, aliadas ao nosso modelo de Asset Liabilty Management (ALM) poderão trazer importantes implementações, de maneira a auxiliar o corpo técnico. Sendo assim, pretendemos que a FUNCEF siga para uma direção em acordo com as evoluções do mundo, de modo a sempre proporcionar excelência na gestão dos investimentos e melhores resultados aos participantes. Entender tudo isso aqui exposto, apropriar-se de forma inteligente destas ferramentas e saber utilizá-las, tornam-se o grande desafio. Como disse, o momento é de transição, logo, nós gestores trataremos deste tema como algo usual no cotidiano empresarial.

1 Aprendizado de máquina. 2 Aprendizado de máquina profundo.

Ricardo Pontes é presidente da Funcef