Desafios da política de investimentos _ Everaldo Guedes

Edição 370

Franca,Everaldo(PPS) 24marMais um ano chegando ao final, mais uma atualização de Políticas de Investimentos a ser realizada, com as dificuldades de sempre. Projetar cenários, identificar os principais riscos, onde há os que estamos acostumados a vigiar e os que chegam de surpresa, além das situações menos prováveis mas muito impactantes, como pandemias – caso da Covid – e desastres naturais, agora com a mudança climática, nunca foi fácil nem será. Nenhuma novidade.
Dizer que teremos no próximo ano muita volatilidade é desnecessário, não me lembro de quando alguém tenha dito que seria diferente. Sendo assim, vamos tentar utilizar os momentos difíceis a nosso favor, lembrando que as crises trazem oportunidades.
De início, lembremo-nos de que a gestão de planos de previdência não deve ser voltada para o curto prazo. Movimentos táticos, oportunísticos, podem sim ter lastro em visões mais imediatistas, porém nossas políticas de investimentos devem determinar as diretrizes conforme o que está estipulado na Res. CVM 4.994, no art. 19, §2: “A EFPC deve adotar, para o planejamento da política de investimentos dos recursos do plano … um horizonte de, no mínimo, sessenta meses”. Elaborar políticas focadas apenas no próximo ano não é algo em conformidade com as melhores práticas nem com a nossa legislação.
Em termos da situação atual, temos algo ruim para o País e bom para os planos de previdência, que são os juros reais elevados proporcionados pelo CDI. Em 2015, em palestra no Congresso da Abrapp, eu disse que o CDI era o ópio dos nossos fundos de pensão e parece que voltou a ser. Apesar disso, é bom notar que em 2001 o retorno acumulado do CDI significou um juro real negativo de mais de 5% contra o IPCA, lembrando a todos a necessidade de perceber o risco dos investimentos não como uma questão absoluta relacionada à baixa volatilidade, mas sim como a chance de que os retornos oferecidos não mantenham o poder de compra do investidor ou não atinjam os retornos necessários à construção das reservas desejadas.
Não quero dizer que devamos menosprezar o que as taxas Selic e CDI nos oferecem, mas que não podemos achar que aquilo que paga nossas contas hoje vai fazer isso sempre. Disse isso em reunião de diretoria de um banco, com relação à inflação, e tive que ouvir que “no Brasil a inflação nunca será baixa”, fora as risadas – eram tempos de hiperinflação. As palavras “nunca” e “sempre” podem ser muito perigosas, e esse banco sucumbiu ao Plano Real.
Os métodos utilizados na construção de fronteiras eficientes para escolha de nossa carteira ótima já são bem conhecidos de todos, e nos ajudam a não fazer apostas, focando nas probabilidades das possíveis situações futuras, boas ou ruins. Modelos de fronteiras para fundos de pensão, ao contrário do estudo original de Markowitz, são multiperiódicos, não uniperiódicos, importante lembrar.
Em termos de classes de ativos, quais utilizar? Em benefício dos ganhos trazidos pela diversificação, todas as que for possível acessar. Quais privilegiar? Isso quem vai nos dizer é o modelo e sua fronteira eficiente. Nossa intervenção relevante reside na qualidade da modelagem de cada uma dessas classes, já que simplesmente reproduzir o passado é uma maneira primitiva (para dizer o mínimo) de trabalhar. Em qualquer processador, a saída depende da entrada.
Dentro do segmento de Renda Fixa, é claro que podemos privilegiar carteiras indexadas ao CDI, mas as NTN-B continuam com retornos muito atrativos. Explicar a volatilidade desses títulos aos participantes é uma necessidade sempre presente. Talvez devamos atuar taticamente no crédito privado, à escolha de um momento mais favorável em termos de spreads. A Alocação Tática sempre deve ser considerada, mas cuidado quando se trata de ações. Aí é dificílimo.
Já que estamos em Alocação Tática, cabe lembrar os equívocos comuns cometidos com o investimento internacional. Se tentar operar o Timing dos mercados de ações já é difícil, talvez mais difícil seja fazer o mesmo com o câmbio. Edmar Bacha, diz que o câmbio está aí para humilhar os economistas. Alocação neste segmento de aplicação? O máximo possível, desde 2007. Sem tentar adivinhar para onde vai cada mercado, simplesmente pela expansão de nossa fronteira eficiente.
Os riscos geopolíticos estão exacerbados neste momento, com guerras importantes em andamento e potencial para atritos no Mar do Sul da China, Taiwan, outras fronteiras sob disputa na Ásia, implicações nas cadeias produtivas globais, tráfego marítimo, inflação e mais. O Brasil me parece mais seguro do que muita gente pensa, porque não somos exportadores apenas de commodities metálicas ou petróleo. Nossa exportação de alimentos é relevante e proporciona alguma estabilidade.
Em suma, nada de novo no front. Como sempre, volatilidade e necessidade de modelar adequadamente as variáveis de entrada nos modelos de otimização. Bom trabalho a todos.

Everaldo Guedes é sócio fundador da PPS Portfolio Performance Consultoria de Investimentos