O fomento da previdência fechada _ Arnaldo Lima
Edição 370
A Previdência é um tema apaixonante, pois abrange todas as funções do setor público na economia: estabilização macroeconômica, eficiência alocativa e distribuição de renda. Nesse contexto, todos os governantes precisam se debruçar sobre os desafios financeiros e atuariais da Previdência, pois tais despesas ocupam parte relevante do orçamento público, o que torna o regime previdenciário a maior referência para o custo de oportunidade de alocar recursos em outras políticas públicas.
É notório que a contribuição dos empregadores em reconhecimento ao esforço contributivo dos seus empregados é o principal pilar do regime de previdência complementar (RPC), pois significa uma rentabilidade mensal de 100% nos casos em que a contribuição paritária é feita na proporção de R$ 1 patronal para cada R$ 1 dos trabalhadores, que é o limite máximo permitido no caso dos servidores públicos, conforme dispõe o §3º do art. 202 da Constituição (CF/88).
De fato, a contribuição do patrocinador mostra-se fundamental para os servidores, pois, com exceção daqueles que ganham um salário mínimo, todos terão perda de bem-estar significativa no momento de aposentadoria caso não tenham previdência complementar, haja vista que a grande maioria dos entes federativos já não oferecem mais a integralidade do benefício de aposentadoria como regra de cálculo. Com efeito, os entes públicos podem conceder paridade contributiva para os servidores que ganham abaixo do teto visando ter uma maior progressividade das despesas de pessoal, o que poderia ser pauta das negociações salariais, inclusive as lideradas pelo Ministério da Gestão e Inovação (MGI).
Faz-se indispensável esclarecer que não há regra constitucional que impeça os entes subnacionais de contribuir paritariamente com os servidores para a formação de sua previdência complementar, isso tanto para os servidores públicos que ganham acima do teto do INSS, quanto aqueles que recebem valores abaixo desse limite. Isso porque, considerando-se que os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) são de competência legislativa concorrente entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios (art. 24, XII da CF/88), os entes subnacionais podem conceder paridade contributiva para os seus servidores, já que cabe à União editar normas gerais sobre os RPPS e aos demais entes federativos estabelecer regras específicas, desde que não contrariem as normas gerais estabelecidas pela União.
Poder-se-ia argumentar que os §§ 2º e 14º do art. 40 vão de encontro à interpretação acima, pois exigem que seja observado o limite máximo dos benefícios do INSS para os entes federativos que implantarem RPC para os servidores públicos. Todavia, o limite do teto do INSS deve ser estabelecido para o pagamento das aposentadorias e das pensões no âmbito dos RPPS, o que não tem qualquer relação com as contribuições que o patrocinador público direciona ao RPC, as quais funcionam como importante instrumento de incentivo à adesão ou com o benefício especial, que tem natureza compensatória para os servidores que optam pela migração. Vale lembrar que o RPC é um regime autônomo em relação ao RGPS e RPPS (art. 202).
O cerne da discussão está consubstanciado no art. 40, §3º: “As regras para cálculo de proventos de aposentadoria serão disciplinadas em lei do respectivo ente federativo.” Ou seja, é competência exclusiva dos Estados, DF e municípios decidirem se concedem paridade contributiva para os servidores abaixo ou acima do teto, definirem as alíquotas previdenciárias, bem como o desenho dos diferentes tipos de benefício especial, desde que observado o equilíbrio financeiro e atuarial dos seus respectivos RPPS. Por exemplo, o plano previdenciário do município de Curitiba oferece paridade contributiva para os servidores que ganham abaixo do teto.
Naturalmente, a paridade contributiva implica em despesas obrigatórias, o que exige observância aos ditames dos artigos 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que determinam a comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais, devendo seus efeitos financeiros serem compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa. Em resumo, a limitação da concessão da paridade contributiva para servidores públicos que ganham abaixo do teto do INSS é de caráter fiscal, e não previdenciário. Dessa forma, caso os entes públicos optem em aumentar a progressividade do gasto com pessoal, a paridade contributiva pode ser a maior ação de fomento para a previdência complementar fechada, pois poderá beneficiar mais de 3,1 milhões de servidores públicos que atualmente ganham menos do que o teto do INSS e têm menos incentivos para aderir ao RPC do que os servidores com maiores remunerações. Um parecer simples do Ministério da Previdência pode fazer uma revolução positiva no nosso sistema protetivo.
Arnaldo Lima é economista e Relações com Investidores da Polo Capital