Apetite por risco desapareceu | Guilherme Benites

Edição 336

Poucos meses atrás – mais precisamente no final de 2020 – vivíamos um momento de mercado em que as opiniões sobre a retomada da economia eram majoritariamente positivas. Aliadas ao cenário de juro historicamente baixo e ao enorme fluxo de liquidez que os Bancos Centrais despejaram no mercado, elas insistentemente nos diziam: finalmente chegou o momento que esperávamos há anos e agora sim a parcela de risco dos portfólios aumentará significativamente.
É estranho pensar que faz tão pouco tempo que isso aconteceu, ainda que o tempo durante a pandemia pareça estar passando de uma forma estranha! É verdade que não houve nenhuma ruptura drástica no cenário, mas muitos fatores contribuíram (e ainda o fazem) de forma relevante para que o ímpeto de aumentar o risco dos portfólios diminuísse.
Os juros americanos, antevendo o aquecimento da economia dos EUA, foram a primeira variável a induzir algum questionamento nos movimentos que haviam sido previstos pelas Políticas de Investimentos aprovadas no final de 2020. Com uma alta expressiva, de uma única vez esses juros fortaleceram o Dólar, pressionaram nossas taxas longas e arrefeceram as significativas entradas de investidores estrangeiros nas bolsas emergentes.
É evidente que problemas internos também tumultuaram o cenário, a começar por uma demora espantosa para aprovação do Orçamento, e seguindo com frustração relacionada ao ritmo de vacinação (que, em última análise, pauta a retomada da economia) e a incerteza sobre reformas que possam vir a pelo menos atenuar o problema fiscal que estamos vivendo.
A inflação também contribuiu para uma sensação ainda pior, já que começou o ano em patamares muito elevados e não deu sinais nítidos de melhora mesmo com todo o esforço do Banco Central. Por ora, a maior parte das EFPCs está distante de atingir suas metas.
Isso posto, é interessante notar que a maior parte das previsões de alocação que foram feitas no final de 2021 ainda não se concretizou. Ao contrário, muitas alocações inesperadas tomaram o espaço anteriormente destinado ao risco – a alta nas curvas de NTN-Bs longas, que desde março orbitam ao redor de 4,5% ao ano, acabou por estimular muitas EFPCs a reavivarem seus ALMs, que andavam um pouco de lado desde o início da pandemia.
Talvez seja muito cedo para tirarmos conclusões acerca desses movimentos mas, à primeira vista, é possível que mais uma vez o aumento de risco mais vigoroso seja postergado. Isso não quer dizer, de forma nenhuma, que ele não ocorrerá. Mas, à medida que a Renda Fixa deixa de ser tão pouco atrativa, o espaço para as classes de maior risco tende a diminuir.
Cabe destacar, também, que a proximidade de 2022 traz para o jogo a questão eleitoral e, normalmente, esse é um período de alta volatilidade nos mercados. Com tantas questões em jogo, cabe refletir sobre o título desse artigo: será que ainda haverá grandes movimentações ao longo desse ano?
De nosso lado, seguimos vendo muitos estudos acerca de Investimento no Exterior, que parece de certa forma imune ao cenário local e, além disso, oferece o risco cambial como potencial proteção para posições direcionais no Brasil. Também está na mesa, em alguns casos, a avaliação de proteções usando COEs e derivativos – essa pode ser uma forma de aumentar o risco local sem tanta preocupação com a possibilidade de um cenário muito adverso à frente.
Para finalizar – infelizmente diante da impossibilidade de uma conclusão certeira sobre os pontos levantados – chamo a atenção para a grande evolução que tivemos, mesmo em um período tão complicado. Por mais que a incerteza permaneça, hoje em dia discutimos com muito mais frequência produtos mais sofisticados, alocações mais complexas e temas complementares à discussão puramente financeira, como ESG.
A parte do passivo também ganhou relevância no dia a dia dos investimentos, bem como a segregação por perfis dos planos, o que demonstra maior adequação dos planos à realidade dos participantes.
No fundo, mesmo em meio a um cenário complicado, seguimos evoluindo na discussão não só da construção das carteiras, mas também do papel das EFPCs como agente do futuro de participantes e familiares. Um desafio desse tamanho não podia mesmo ser simples!
Guilherme Benitez é sócio e diretor da Aditus Consultoria Financeira