Edição 204
Em tempos de crise observamos o surgimento de alguns questionamentos relacionados com a atuação dos fundos de pensão no Brasil, colocando em dúvida sua capacidade de fiscalizar a gestão das empresas de capital aberto e até seu real compromisso com a disseminação das boas práticas de governança corporativa.
O presente artigo busca provar que, em muitos casos, tais questionamentos são feitos sem a devida pesquisa documental ou, pior ainda, são formulados com completo desconhecimento do “mundo dos negócios”. Afirmações do gênero “investidores não estão tão próximos quanto deveriam de suas empresas, o que abre espaço para uma atuação passiva dos conselhos de administração”, induzem a opinião pública a concluir que os fundos de pensão são os culpados indiretos, por negligência ou omissão, por recentes escândalos corporativos como os da Sadia e Aracruz, por exemplo.
Reconhecemos que fundos de pensão menores, que atuam sem uma estrutura de acompanhamento de mercado, tendem a adotar uma postura passiva no que diz respeito ao chamado ativismo societário. Isso se deve, em grande parte, ao processo de terceirização da gestão, onde o gestor passa a perseguir uma rentabilidade próxima a de indicadores como o IBX e Ibovespa. Mas não devemos deixar de reconhecer a importância do movimento liderado pela Previ, incentivando à migração das empresas participadas para os segmentos de listagem diferenciados (principalmente o nível 2 e o Novo Mercado), e os exemplos de gestão vencedora que suas empresas participadas, como Perdigão, Embraer e CPFL Energia, oferecem.
Sem dúvida, a defesa de direitos em questões pontuais, na condição de acionistas minoritários, é a postura que ganha mais destaque na mídia.
Além do dever fiduciário dos gestores, os valores envolvidos, como nos casos Arcelor Mitttal, AMBEV e Brasil Telecom, justificam a dedicação de tempo e recursos, ao invés da opção pela saída imediata via mercado.
Mas o constante monitoramento da gestão das empresas participadas, feito através de conselheiros eleitos e com apoio das fundações, muitas vezes é avaliado como uma postura de defesa de interesses de um determinado grupo de acionistas. Ou seja, o alinhamento com o pensamento institucional dos fundos de pensão, muitas vezes, é confundido com uma espécie de “código oculto de conduta/obediência” do conselheiro para com esses investidores.
Críticas desse tipo vêm normalmente acompanhada de um discurso de defesa da adoção dos conselheiros “independentes”. Porém, não seria demais lembrar que a suposta independência não representa um selo de qualidade, até porque inúmeros desses profissionais/consultores, ditos independentes, carregam conflitos ocultos – são consultores, ex-agentes do mercado, ou ainda “figurões” que “emprestam” o nome a inúmeros conselhos sem uma dedicação razoável de tempo.
Na Previ, que adota uma Política de Negociação de Ações (pela Instrução CVM nº 358 tal mecanismo é facultativo) que poucas empesas adotam, nunca tivemos casos de insiders dentro dos conselhos.
Claro que, por conta da relevante representatividade no mercado de capitais, muitas vezes os fundos de pensão encontram-se em dois lados de uma mesma operação, como no caso da reestruturação da Telemar/2006. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) foi consultada sobre o voto dos acionistas detentores de ações ON e PN, que autorizou a votar. Havia um grupo de preferencialistas contrário à operação e outros que avaliavam que seria melhor com a reestruturação do que a estrutura em vigor. Prevaleceu a vontade do mercado, com suas idiossincrasias, algo que foge dos modelos cartesianos de avaliação do mundo acadêmico.
Porém, duvidar da real disposição da Previ em apoiar sempre as melhores práticas de governança corporativa, é desconhecer completamente suas iniciativas, que enumero a seguir: • lançamento de um Código de Melhores Práticas de Governança Corporativa; • campanha pela disseminação de conselhos fiscais de caráter permanente – mais de 40 empresas já tem expressa essa condição em seus estatutos sociais; • luta pelo direito dos minoritários ordinaristas elegerem um conselheiro fiscal nas empresas com free float acima de 10%, independente do comparecimento desse grupo na assembléia; • luta pela queda da restrição à participação na assembléia pelo descumprimento do prazo para depósito prévio de procurações, conforme decisão da CVM; • defesa, perante a Bovespa e CVM, da transformação da Política de Negociação de Ações em documento obrigatório, como forma de combater o chamado “insider”; • campanha pela disseminação de comitês estatutários de assessoramento dos Conselhos de Administração e adoção de regimentos internos; • disseminação de boas práticas de governança corporativa para o setor imobiliário; • o recente lançamento do Manual para participação em assembléias, na busca de maior transparência e incentivo à participação nesses encontros.
Renato Chaves é ex-diretor de participações da Previ