Edição 132
Wagner Pinheiro, da Petros
Para Wagner Pinheiro, o novo presidente da Petros, uma das marcas diferenciais da sua gestão à frente do segundo maior fundo de pensão do País, será o incentivo aos investimentos éticos. Ou seja, para poder contar com aportes de longo prazo da fundação da Petrobrás, as empresas terão que dar a sua contribuição social, na forma de respeito às leis, aos direitos dos trabalhadores e ao meio ambiente. “Não, em nenhum momento essa orientação de investimentos éticos poderá se contrapor à rentabilidade”, garante ele. Veja, a seguir, os principais pontos da entrevista de Pinheiro à Investidor Institucional
Investidor Institucional – O que muda nas diretrizes da Petros na sua gestão?
Wagner Pinheiro – Ao longo da gestão deve mudar bastante, porque temos uma visão de gestão diferenciada da diretoria anterior. A primeira coisa que muda é a maior participação e a maior integração com os participantes e seus representantes. Um fundo de pensão depende de dois pilares, os patrocinadores e os participantes, e não adianta um lado estar fortalecido na gestão se o outro não está. Isso só gera desconfiança, medo, insegurança. Enquanto o Conselho Deliberativo deve ser o elo de ligação entre essas duas partes, nós seremos os formuladores, os fomentadores e os fornecedores de informação para que se avance no sentido de um entendimento entre as partes.
II – A diretoria já está toda escolhida?
WP – Toda não. Está definido o meu nome, como presidente da Petros, o Luís Carlos Afonso, como diretor financeiro, e o Maurício França, como diretor administrativo. Ainda falta escolher o diretor de benefícios, cujo nome deve ser definido nos próximos dias pela patrocinadora e pelos conselheiros.
II – A gestão passada enfatizou sempre o fato de ser uma diretoria profissionalizada. Essas indicações partidárias não podem ser vistas como um retrocesso na gestão da Petros?
WP – Do ponto de vista do profissionalismo, eu diria que não. Eu vim de um fundo pertencente a um banco privado, o Banesprev, cujo patrocinador, o Banespa, foi estatal no passado mas hoje é privado, tem regras de banco privado, e o banqueiro me cobrava nos últimos dois anos da minha gestão porque ele era cobrado pelo acionista majoritário, que é o Santander espanhol. Sim, está certo que eu era diretor eleito do Banesprev, mas minha carreira é de profissional do banco, só depois é que fui ser gestor dos recursos do Banesprev. O Luís Carlos Afonso era secretário de finanças de Campinas e antes tinha sido secretário de finanças de Santo André, nas duas gestões do prefeito Celso Daniel, e o Maurício França foi coordenador da FUP, dos petroleiro. Além disso, acho que a indicação sempre é política.
II – Mesmo no passado foi política?
WP – Veja, se estou certo a diretora financeira anterior da Petros veio do ministério da Justiça, mas de qualquer maneira ela era uma profissional de qualidade. O presidente da Petros tinha vindo de uma outra fundação, de patrocinadora privada.
II – As medidas que foram tomadas pela diretoria antiga, para profissionalizar a gestão, serão mantidas?
WP – Lógico. A gente não está trocando toda a equipe e nem vamos fazer isso. Não vamos jogar fora o que, no nosso entendimento, é bom. Acho que houve avanços importantes na readequação da gestão financeira, independente da forma como tenham sido feitos, e não podemos jogar isso fora.
II – Quais as boas experiências que vocês encontraram na área financeira?
WP – Eu diria que tem um ritual para o investimento, com começo, meio e fim, com porta de entrada e porta de saída. Então, a proposta de investimento chega na área, a área faz a análise, os analistas fazem a discussão com a área financeira, é encaminhado para um comitê de investimentos e esse comitê aprova ou rejeita. Aprovado, vai para a diretoria executiva e, se for o caso, passa para o Conselho Deliberativo.
II – É um processo despersonalizado?
WP – Sim, eu não sei se isso é muito antigo ou novo, mas de qualquer maneira é um processo de investimento que privilegia o lado técnico. É muito mais difícil você ter algum tipo de ingerência, alguma tráfego de influência.
II – Na questão do foco dos investimentos, terá alguma mudança?
WP – Nós queremos trazer algo novo para o sistema de fundos de pensão. Já estamos iniciando um debate com a Previ, com o Sérgio Rosa, com quem temos uma relação antiga, para definir uma nova cultura de investimentos, privilegiando investimentos socialmente responsáveis.
II – O que seria isso?
WP – Nós queremos levar aos nossos parceiros de investimentos uma discussão sobre o que é uma empresa ética, que respeite as condições de trabalho de seus trabalhadores, que respeite o acordo coletivo vigente. Vamos discutir o respeito aos clientes, para ver se os produtos que oferecemos são efetivamente produtos de qualidade e se são usados de maneira adequada. E, terceiro, vamos discutir o respeito à legislação, vamos pagar os impostos direitinho.
II – Isso vale só para os investimentos futuros ou também para os que a Petros já tem na carteira?
WP – Veja bem, essas coisas e outras como o respeito ao meio ambiente, negar o trabalho infantil e o trabalho escravo, isso vale para os investimentos futuros e também para os atuais. Mas os investimentos atuais da Petros, na maioria dos casos, muito provavelmente já respeitam essas regras.
II – A opção por esses investimentos éticos não poderá resultar, em alguns casos, em aplicações menos rentáveis?
WP – Não, em nenhum momento essa orientação de investimentos éticos pode se contrapor à rentabilidade. Primeiro de tudo, vamos respeitar os três pilares básicos da boa administração de um fundo de pensão, que são rentabilidade, liquidez e segurança. Esses três pilares são fundamentais para cumprir a meta atuarial. Mas a rentabilidade adequada para um fundo de pensão não deve ser a mesma de um investidor capitalista, que quer sempre mais e mais e mais. Não, perseguimos a rentabilidade com muito conservadorismo, aliada à liquidez e a busca de segurança para o investimento. Este tripé, na verdade, tem tudo a ver com investimentos eticamente responsáveis, que não procura expoliar ninguém, que não procura ganhar cada vez mais, que não procura remunerar cada vez mais o capital, mas sim obter uma remuneração adequada que permita o pagamento dos benefícios aos participantes.
II – Haverá uma vigilância maior sobre a atuação das empresas onde o fundo investe?
WP – Sim, exatamente. Na hora de comprar debêntures de uma empresa, vamos ver qual é o rating que essa empresa tem na área social. Ela tem triple A? Ah, então podemos comprar.
II – Vocês vão adotar um tipo de rating social, juntamente com o rating financeiro, para as empresas?
WP – Quem trabalha com isso é o Instituto Ethos, do qual a Petros, inclusive, é sócia. O Instituto Ethos tem uma classificação de quem foi a empresa eticamente mais responsável, as 10 primeiras do ponto de vista do respeito ao meio ambiente, as 10 primeiras do ponto de vista do respeito social aos seus trabalhadores etc… Nós e a Previ vamos alavancar esse debate e junto com os bancos, em especial os controlados pelo governo, por exemplo o BB e CEF, pretendemos incentivar o lançamento de fundos eticamente responsáveis, fundos socialmente responsáveis.
II – Esse debate não irá ser ampliado para outras fundações, além da Petros e Previ?
WP – É que eu estou falando das duas maiores fundações, que mudaram agora suas diretorias. Tem também a Funcef, mas ela ainda não mudou a diretoria. Mas, na verdade, esse debate vale os 360 fundos de pensão do sistema. Nós queremos todo mundo, o investidor de longo prazo, fazendo esse debate com a sociedade brasileira. Mas nós, os grandes fundos de pensão, temos a obrigação de iniciar esse debate.
II – Vocês poderiam pressionar as empresas nas quais participam para mudar a sua forma de atuação, caso elas não estejam seguindo algumas normas de respeito social?
WP – Eu não usaria o termo pressionar, mas negociar, tentar convencê-las de que isso só é ganho para a empresa. Ela vai ganhar na imagem, vai ganhar no respeito junto à sociedade e vai ganhar quase que uma propaganda gratuita quando começar a falar que tem posturas eticamente responsáveis.
II – Essa deve ser a marca da sua gestão?
WP – Acho que sim, porque transparência e gestão participativa, com todas as partes envolvidas discutindo e ajudando a definir os rumos, isso nós sempre tivemos. Então, essa questão, além de muita honestidade e profissionalismo, deve ser a marca da nossa gestão.
II – Uma das prioridades da antiga gestão era buscar novos patrocinadores. Vocês vão continuar com essa preocupação?
WP – Sim, isso está muito bem organizado na área de benefícios. Tem uma equipe interna de atuários que, a cada dia, tem se aprimorado mais. Vamos perseguir essa questão de buscar novos patrocinadores e inclusive trabalhar junto à SPC para rever aquele impedimento de abrigar os fundos instituídos, por termos patrocinadora estatal. A lei não tratou disso e, de repente, sai uma resolução proibindo isso. Temos trabalhado essa questão junto ao Adacir e penso que proximamente deve haver uma mudança nessa regulamentação.
II – E a proibição do empregador de fazer contribuição, em nome do participante, no fundo instituído, isso também pode mudar?
WP – Pode, só depende de uma resolução do Conselho de Gestão da Previdência Complementar, que esperamos que também mude isso também.
II – Você acha que essas questões são fundamentais para o sucesso do fundo de instituidor?
WP – Eu acho que são muito importantes. Tanto a igualdade para as fundações patrocinadas por estatais na disputa por gerir fundos instituídos, quanto a questão da contribuição do patrão nos fundos instituídos. O governo Lula vem dizendo que vai dar força para que haja esses fundos instituídos, mas é importante que possa ter aporte do patrão também, senão vai ser muito pequeno! Tem que ter uma parceria do outro lado também, porque se ficar só no aporte do trabalhador aí perde a motivação.
II – Hoje, mesmo que o patrão queira ele não pode fazer essa contribuição.
WP – A regulamentação extrapolou a lei, a lei não proibia isso. Então, o Conselho de Gestão da Previdência Complementar, que é um órgão abaixo do Congresso, muito abaixo do Congresso, muda o espírito da Lei. Eu pergunto: com que legitimidade?
II – Como será encaminhada a questão da migração de BD para CD da Petros, que foi barrada juridicamente?
WP – Nós vamos limpar a mesa e recomeçar esse debate, como se ele começasse do zero. Prá que? Para que a gente não entre num debate desses com rancor do passado, até porque o passado não nos pertence. Então, queremos limpar a mesa, começar do zero.
II – O que significa limpar a mesa e começar do zero, nesse caso?
WP – Significa sentar com a patrocinadora, com os participantes, ouvir as vontades e as possibilidades das duas partes. Ver quanto que a patrocinadora pode dispor de contribuição, o que ela gostaria de ver sendo oferecido aos seus funcionários, e ouvir dos participantes tudo aquilo que eles esperavam de um plano de fundo de pensão, e buscar ser um instrumento que viabilize essa vontade das duas partes. O que faremos? Isso ainda não estamos falando muito claramente, até porque estamos no início de um processo de levantamento dos dados, de ouvir as pessoas, de conversar com a patrocinadora, com as entidades de representação dos participantes.
II – Mas o plano de BD acaba mesmo?
WP – Não sei, isso não está decidido. Por isso que te digo, queremos limpar a mesa, sem ter preconceito de passado ou presente. Nós sabemos que hoje em dia a tendência tem sido a Contribuição Definida, mas não quero aqui descartar nenhuma hipótese.
II – Com relação à administração fiduciária dos recursos da Petros, que foi totalmente terceirizada, essa estratégia será mantida?
WP – Por enquanto, no curto prazo, sim. Mas nós temos que avaliar, procurar fazer uma interação com os administradores para conhecer a fundo a forma como eles fazem. Acho que, de certa forma, o controle do investimento já é feito pelo custodiante, que é quem liquida a operação. Segundo diz a regra da SPC, o custodiante não pode liquidar um investimento que não esteja enquadrado nas resoluções e na política de investimentos do fundo de pensão, entre outras coisas. A administração fiduciária pode contribuir com o controle, e acho que isso pode ser útil, mas acho que os objetivos da administração fiduciária estão contemplados na Resolução 2.829.
II – Vocês vão reavaliar essa política?
WP – Melhor que reavaliar, nós vamos avaliar. Nós vamos fazer uma primeira avaliação, junto com a avaliação dos investimentos. Se o instrumento realmente se mostrar positivo para a Petros nós vamos continuar com ele, caso contrário vamos ter que reavaliar e ver o que fazer. Mas, de qualquer maneira, a área técnica fala que é um bom instrumento, mas tem que aprimorar, até porque é recente, tem pouco menos de 6 meses.
II – Como estão sendo os primeiros dias na direção da Petros?
WP – Eu, pessoalmente, tenho feito uma gestão quase que por demanda. Se eu tenho que decidir sobre algum tema, é sobre esse tema que me debruço. E olha que quase toda decisão de investimento e alocação de recursos é feita pela Petros. A carteira de ações, que soma R$ 2,2 bilhões, é todinha feita internamente com exceção de R$ 120 milhões em fundos terceirizado de small caps. E a carteira de renda fixa, mesmo com os fundos terceirizados de renda fixa, também têm critérios de alocação, de realocação e de resgate decididos e acompanhados por nós.
II – A rentabilidade da Petros, nos últimos anos, tem sido adequada?
WP – Tem sido bastante razoável. É lógico que tem muito imóvel, que é investimento antigo, que isso tem sido reavaliado e nossa prioridade será a desmobilização desses imóveis no médio prazo. Também tem alguns títulos públicos com vencimento em 2033, uma parcela bastante grande que se refere a uma dívida que a Petrobras tinha com a Petros e que rende IPCA+6%, que rende certinho a taxa atuarial. Além disso, têm alguns investimentos em títulos de rentabilidade baixa, que vamos ter que avaliar para ver se no momento da aplicação, em 1995/1996, era assim mesmo. Acho que temos que fazer uma avaliação global de todos os investimentos.