Edição 126
Sérgio Aureliano Machado, do IBA
A adoção de índices financeiros como meta atuarial das fundações virou uma verdadeira mania. Em conseqüência disso, os investimentos com cláusulas de correção por esses índices, dos quais o mais utilizado é o IGP-M, são hoje os mais populares do mercado. Para o atuário Sérgio Aureliano Machado, que terminou de tomar posse para seu segundo mandato de dois anos à frente do IBA – Instituto Brasileiro de Atuária (a primeira vez foi entre 1992 e 1994), a utilização desses índices acaba distorcendo a filosofia dos planos, que é de repor o poder de compra do participante e não propiciar ganhos financeiros. Veja, a seguir, os principais trechos de sua entrevista à Investidor Institucional:
Investidor Institucional – O que você acha dos índices que estão sendo usados como indexadores dos planos?
Sérgio Aureliano Machado – Eu não vejo com bons olhos alguns planos que têm como meta índices financeiros, ou seja, IGP-DI, IGP-M, que não refletem exclusivamente uma evolução salarial ou uma evolução do índice de preço. O INPC, na minha visão, seria um índice compatível com a filosofia de plano complementar.
II – Porque você defende o INPC?
SAM – Ele é mais favorável à filosofia do plano complementar fechado, que é permitir a complementação da sua remuneração! E para complementar a sua remuneração teria que ser um índice para atualizar o seu poder de compra, e não um índice do mercado financeiro.
II – Porque esses índices financeiros foram adotados?
SAM – Teve um determinado período de tempo em que o INPC não refletia o seu poder de compra. Era IPC e depois virou INPC, foi expurgado e, por causa disso, muitos planos acabaram adotando os índices financeiros. Mas hoje está ficando difícil manter esses índices como meta de rentabilidade para o plano.
II – Em que casos esses índices financeiros seriam válidos?
SAM – Um índice de mercado serviria se você quisesse comprar uma renda, mas aí seria diferente de um plano complementar. Se você tivesse, por exemplo, um plano de CD puro, onde você iria comprar uma renda, aí sim você deveria buscar um índice financeiro para garantir que os seus recursos fossem corrigidos pela variação de mercado.
II – Na tua opinião, a meta atuarial deveria ser uniforme para todo o sistema?
SAM – No meu entender, até poderia ter uma mesma metodologia de atualização dos valores, guardada as devidas características de cada plano. Acho que os planos poderiam ter um indexador único para atualização.
II – Que vantagens isso traria?
SAM – Uma vantagem clara, entre outras, seria poder portar de um plano para outro, que agora pela Lei Complementar nº 109 você tem o instituto da portabilidade, um valor cuja expectativa em outro plano seja correspondente. O que é que o atuário calcula? Ele calcula o valor que você deveria ter capitalizado para ter direito àquele valor de benefício, naquele determinado prazo de tempo. Se você porta menos, o que vai ocorrer? Ou você vai ter que negociar uma redução do benefício ou vai ter uma atualização menor do que aquela que você teria direito.
II – As linguagens atuariais também não deveriam ser uniformizadas?
SAM – No Brasil, até há bem pouco tempo, não tínhamos nenhum diploma legal que servisse para nos basearmos, como algumas premissas mínimas para avaliação atuarial. Hoje já temos esse patamar mínimo, através das Resoluções da SPC, das Portarias etc. Além disso, com o advento da auditoria atuarial, que eu acho muito saudável para o sistema, o auditor atuarial confere a aderência das tábuas, verifica se todas as hipóteses utilizadas estão aderentes àquele plano. Com isso, estão fazendo com que muitos atuários modifiquem até as hipóteses utilizadas.
II – A utilização de diferentes tábuas também não causa distorções?
SAM – Bem, o que acontece é que eu não posso utilizar a mesma tábua para as pessoas que moram no Rio Grande do Sul e para as pessoas que moram no Amazonas, porque elas têm características diferentes, sobrevidas diferentes, composição familiar diferentes. Veja só, eu não posso definir um parâmetro igual para todo mundo, mas eu posso definir parâmetros mínimos, condições mínimas para avaliação atuarial. Pega um plano de uma empresa de energia elétrica, que tenha aposentadoria especial, eu não posso utilizar a mesma tábua de entrada em invalidez para um plano em que todo mundo trabalha em escritório.
II – Quer dizer, dá para ter normas atuariais mínimas mas não normas atuariais únicas?
SAM – Normas mínimas de atualização atuarial eu acho saudável. Na previdência fechada já tem alguns parâmetros mínimos para avaliação atuarial, que é o DAIEA, da SPC, e na Susep também já existem alguns parâmetros mínimos, algumas tábuas que você tem que utilizar.
II – Mas cada um caminha com seus parâmetros…
SAM – Nós temos dois mercados diferentes, o da fechada, onde a filosofia sempre foi a da política de recursos humanos da patrocinadora, e o da aberta, onde a filosofia é você fazer uma poupança individual e comprar uma renda com essa poupança. As filosofias são diferentes para permitir normas unificadas.
II – Já existe um arcabouço de normas atuariais para os regimes próprios de estados e municípios?
SAM – Na época em que eu era consultor do Banco Mundial eu fui contratado para participar do processo do Parsep, que tinha a proposta de reforma para os regimes próprios de previdência dos estados, de mudar a filosofia desses fundos para um regime de capitalização. A idéia é ir avançando aos poucos nas normas, regulamentando o que já tem, a Lei nº 9.917, a Portaria nº 4.992 e várias outras portarias com relação ao assunto, tanto para estados quanto para municípios. Hoje, a maioria dos municípios está se enquadrando nesse regime, estão fazendo sua reforma, fazendo avaliações atuariais e buscando o equilíbrio atuarial. Hoje, o grande empregador de recursos profissionais de atuários é esse mercado.
II – Como você analisa a implantação do fator previdenciário?
SAM – O fator previdenciário foi uma maneira de tentar colocar uma idade mínima nas aposentadorias. Eu, particularmente, acho que deveria ter sido feita uma outra formulação matemática, eu e alguns outros colegas defendemos lá dentro do Ministério da Previdência uma outra formulação matemática.
II – Que tipo de formulação?
SAM – Uma formulação que mudava o conceito, porque o fator foi constituído como se você tivesse o mesmo nível de salário desde o momento que você ingressou até o momento em que saiu da previdência, mas isso não é verdadeiro. Além disso, o fator usa a tábua de mortalidade do IBGE, que não é uma tábua que reflete a mortalidade dos segurados da previdência, teria que ser construída uma tábua com os segurados da previdência. Então, isso cria distorções.
II – Você já ouviu falar na criação de um fator previdenciário para o funcionalismo público? O que você acha disso?
SAM – Eu não tenho informação sobre isso, o que foi feito quando estive à disposição do Ministério da Previdência foram algumas simulações com relação aos inativos da previdência, porque hoje a Previdência tem uma folha de inativos bastante significativa. Se você analisar a avaliação atuarial que foi feita posteriormente à minha saída de lá, você vai ver que a situação dos inativos é bastante preocupante.
II – Quais as suas metas à frente do IBA?
SAM – Temos dois objetivos principais: primeiro, a criação do Conselho de Atuária no Brasil, que é um órgão que já começa a fazer falta, e segundo a realização de exames de seleção para ingressar no IBA, como acontece com a OAB. Pelas regras da Associação Internacional de Atuária (IAA), da qual o Brasil faz parte, nós temos até 2005 para começar a realizar esses exames. O diploma que será dado ao aprovado, de habilitação para aquela área específica, vai ser reconhecido em todos os países que são membros plenos do IAA.