Edição 338
O processo de diversificação de investimentos das entidades fechadas de previdência complementar (EFPCs), iniciado em 2017 quando começou a gradual redução da taxa básica de juros, não deverá ser revertido pelo recente ciclo de alta na Selic deflagrado pelo Comitê de Política Monetária (Copom) em março. As EFPCs até cogitam aproveitar a alta dos juros para novas alocações em crédito privado, mas os ativos de risco continuam em alta.
Entre outros ativos de risco, as EFPCs continuam apostando em renda variável, fundos multimercados, imobiliários, exterior e fundos em participações (FIPs), um ativo que começa a recuperar prestígio junto aos investidores de longo prazo depois de desgastes por envolvimento em operações investigadas pela Polícia Federal na década passada.
“Quando realizamos o estudo de ALM no ano passado, já prevíamos a elevação da Selic em 2021. O que está nos surpreendendo é a velocidade desse ajuste, que tende a tornar mais atrativas opções em títulos públicos e juros”, comenta Pedro Pedrosa diretor de investimentos do Postalis, o fundo de pensão dos funcionários dos Correios. “Mas nos níveis atuais, entretanto, a renda fixa não garante o cumprimento das metas atuariais dos nossos dois planos. Teremos de seguir diversificando as aplicações, hoje com forte presença de títulos públicos.”
Com uma carteira de investimentos de R$ 8,9 bilhões, o Postalis está introduzindo alterações importantes nos portfólios de multimercados e renda variável. Nos multimercados, a entidade analisou cerca de 270 multimercados de um grupo de mais de cem gestores e selecionou quatro deles, com estratégias de juros e moeda, long short direcional, long short neutro e quantitativo, para alocar. As escolhas foram ratificadas pelo conselho deliberativo da fundação há um mês e os aportes nos fundos da Vinci Partners, Gauss, Pandhora e Safra começarão logo após o término dos trabalhos de due diligence. “A intenção é alocar R$ 200 milhões nos quatro fundos escolhidos”, assinala Pedrosa. “Parte desse volume, algo em torno de R$ 45 milhões, virá dos multimercados dos quais estamos nos desligando.”
Mudanças ainda mais expressivas estão previstas para a carteira de renda variável doméstica do Postalis. O fundo de fundos (FoF) exclusivo pilotado pela Vinci, com patrimônio de R$ 1,1 bilhão, deve ganhar até outubro a companhia de um segundo fundo, com as mesmas características, para um mandato inicial de R$ 600 milhões. O gestor será a XP Advisory, escolhido a partir de uma lista quíntupla composta por BTG Pactual, Credit Suisse, Vinci, TAG e XP. “O novo FoF, assim como o fundo com gestão da Vinci, terá cotas de até oito fundos de ações e terá como benchmark o Ibovespa”, observa o executivo.
Até o fim do ano, o Postalis também pretende criar um terceiro fundo de renda variável com gestão de uma equipe interna formada por um coordenador e dois analistas. Segundo Pedrosa, que deve apresentar a proposta ao conselho deliberativo em novembro, a primeira aplicação, em caráter simbólico, deve acontecer até dezembro. “Será uma carteira de R$ 200 milhões de início, e servirá como estímulo para que os gestores dos FoFs alcancem as melhores performances”, diz o executivo. “Dependendo dos resultados, a intenção é que a nossa mesa de operações ganhe musculatura nos próximos anos, aproximando-se dos volumes geridos pelos gestores externos.”
Outra prioridade do Postalis são os investimentos no exterior, hoje restritos a uma fatia de 6% do Plano BD, com patrimônio de R$ 3,22 bilhões. A fundação se prepara para iniciar as operações de dois FoFs exclusivos, ancorados em renda variável internacional, que serão pilotados pelo BTG Pactual e a Franklin Templeton. A dupla foi declarada vencedora, há dois meses, de um processo seletivo que contou com 18 candidatos e agora só aguarda condições cambiais mais favoráveis para iniciar os trabalhos. “Com a recente valorização do real, decidimos postergar as primeiras alocações, que deveriam ter sido realizadas em junho”, assinala Pedrosa. “Estamos definindo uma cotação alvo do dólar e esperando o momento adequado.”
A expectativa é de que os dois FoFs globais recebam, somados, aportes de R$ 600 milhões a R$ 700 milhões. Cerca de R$ 200 milhões desse montante viria do resgate das cotas do Postalis em um fundo problemático, o Brasil Sovereign, com títulos públicos da Argentina e da Venezuela. As novas estratégias de exterior preveem aplicações em fundos de ações e ETFs ancorados, sobretudo, no mercado dos Estados Unidos, com algum espaço para Europa e Ásia.
“A meta é elevar a presença de exterior nas carteiras dos planos BD e Postalprev, para pouco menos de 10% do limite estabelecido pela Resolução 4.661”, destaca Pedrosa. Ele também analisa outras classes de ativos. “Temos planos de retomar aplicações em fundos imobiliários e criar um ou dois fundos de crédito privado em 2022”
Já com boa experiência em crédito privado, o Metrus, fundo de pensão dos funcionários do Metrô paulistano, se prepara para novas incursões na área. A entidade, que conta com uma carteira própria de R$ 295 milhões em títulos de dívidas corporativas, pretende colocar em operação em agosto o seu segundo fundo exclusivo de crédito privado, voltado ao seu Plano II, de Contribuição Variável (CV), com patrimônio de R$ 1,51 bilhão. Iniciado em agosto do ano passado, o processo de seleção foi concluído em abril último com a escolha da ARX Investimentos, do grupo BNY Mellon. Desde então, a asset vem colaborando com a fundação na elaboração do regulamento do fundo.
“O mandato inicial será de R$ 30 milhões”, informa a diretora de investimentos e previdência Keite Bianconi. “Não anteciparemos recursos para o nosso novo fundo exclusivo. Os aportes serão realizados de forma pontual, à medida que o gestor identificar e nos apresentar oportunidades.”
O novo fundo da casa seguirá, em linhas gerais, as diretrizes do fundo exclusivo do Plano I, com gestão da BRZ Investimentos. Duas das regras básicas são aquisições de lotes de no máximo R$ 3 milhões e a montagem de um portfólio com cerca de 30 papéis, para diluir riscos. Com patrimônio de R$ 66,18 milhões, o exclusivo mais antigo ainda tem muito para crescer. “Nossa expectativa é de que ele atinja um volume de R$ 100 milhões nos próximos anos. As projeções para o exclusivo do Plano II são da mesma ordem, mas em um prazo maior”, diz ela.
As carteiras de multimercados do Metrus, que renderam ao redor de 3,26% de janeiro a maio, também terão novidades. O volume de aplicações dos planos I e II nessa classe de fundos, que já soma R$ 150 milhões, será mantido mas com mudanças de gestores e estratégias. Um dos objetivos é reduzir o grau elevado de concentração em produtos de perfil macro.
“Vamos abrir espaço para fundos ancorados em juros e moedas, long short direcional e neutro, e livres. O ajuste deverá ser concluído até o fim do ano”, relata Bianconi, que embora sem planos imediatos de reforçar a carteira de papéis federais, nunca perde de vista essa opção. “A alocação em títulos públicos será sempre estratégica, pois garante ganhos reais com risco quase nulo. Seguimos acompanhando atentamente os reflexos da alta da Selic sobre as curvas de juros das Notas do Tesouro Nacional da Série B, as NTNs-B, para identificar o surgimento de oportunidades.”
Assim como o Metrus, a Funpresp-Exe, o fundo de pensão dos servidores do Executivo e do Legislativo federais, planeja encerrar este ano com dois fundos exclusivos de crédito privado em atividade. Os gestores escolhidos, que seriam anunciados em 2 de agosto (antes do fechamento desta edição da Investidor Institucional), receberão aportes individuais de R$ 150 milhões e terão de garantir, até 2026, taxas de retorno anuais de 4,5% além da variação do IPCA. “Os novos fundos só vão comprar papéis high grade, no mínimo com avaliações BB-. A longo prazo, à medida que a carteira de crédito privado ganhar escala, pretendemos internalizar parte das operações nesse mercado”, diz o gerente de operações financeiras Gilberto Tadeu Stanzione.
A estreia em crédito privado representa mais uma etapa da política de diversificação da entidade, que ganhou intensidade em 2020. A renda variável elevou em oito pontos percentuais, para 12%, a sua participação no portfólio da fundação, que passou a contar, desde o ano passado, com fundos voltados a exterior, hoje representando 5,25% do total da carteira. Em contrapartida, a fatia dos títulos públicos federais encolheu cerca de 16,5 pontos percentuais nos dois últimos anos, representando 78,5% do patrimônio atualmente e com projeções de descer 56% até 2023.
“Se não tivéssemos diversificado o portfólio, não teríamos conseguido bater o índice de referência dos nossos planos de benefícios em 2020”, diz Stanzione. “A busca por novas opções prosseguirá nos próximos anos, pois não dá para confiar na Selic como geradora de resultados.”
Para 2022, estão previstos alocações em renda variável ativa, mudando a orientação seguida até agora de de buscar principalmente fundos de ações atrelados ao Ibovespa. Além disso, a entidade pretende alocar em fundos imobiliários (FIIs). “Teremos espaço, no próximo ano, para alocar até 7,7% dos recursos em FIIs”, diz Stanzione. “Ainda estamos definindo as estratégias para esse novo segmento, mas pretendemos dar preferência a fundos com carteiras mais diversificadas em termos de risco.”
As mudanças nos portfólios do sistema fechado de previdência complementar também já começam a levar em conta, destacam os dirigentes ouvidos pela Investidor Institucional, as perspectivas de um cenário doméstico nervoso em 2022, devido à corrida eleitoral. Para reduzir riscos de volatilidade, boa parte das entidades estuda opções mais defensivas, sem abrir mão, contudo, da diversificação. Com patrimônio de R$ 1,55 bilhão, a Basf Previdência planeja para o próximo ano aportes adicionais em FIPs florestais, ativos que desde 2015 vem proporcionando retornos ao redor de 18% ao ano. “Pensamos em alocar mais R$ 16 milhões na carteira deesses FIPs, que hoje soma R$ 25,8 milhões”, adianta o diretor de investimentos Antônio José D’Aguiar.
Com relação às opções mais líquidas de investimentos, há perspectivas de ajustes em várias frentes. Em razão da curva ascendente dos juros, a entidade pensa em retomar aplicações em multimercados de perfil macro, que foram reduzidas durante o período de queda da Selic, assim como analisa a conveniência de aumentar as apostas em fundos long bias. “Também temos planos de elevar alocações, em proporções idênticas, em fundos de renda variável e exterior”, diz D’Aguiar. “A ideia é saltar de 6% para algo em torno de 9% do portfólio total, com o objetivo de mitigar os efeitos da forte volatilidade prevista para o mercado local em 2022.”