Muito além do rouba-monte | Fundos múltiplos de pensão começam a ...

Edição 230

Considerados uma das frentes de maior crescimento do sistema brasileiro de fundos de pensão, os fundos multipatrocinados mostram perspectivas favoráveis quando o assunto é a criação de planos novos, partindo do zero. O segmento é conhecido pela concorrência entre os players por clientes já existentes, pela expansão via migração de planos de entidades próprias e da previdência aberta ou, ainda, pelo recebimento de planos que resultam de reestruturações societárias nas patrocinadoras. Já existe, porém, quem veja novas empresas passando a oferecer o benefício da previdência complementar para os seus funcionários a partir da abertura de um plano junto a uma entidade multipatrocinada. Além disso, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) tem debatido maneiras de fomentar o desenvolvimento da categoria.

O conceito de entidade multipatrocinada é amplo e abrange fundações que têm, por exemplo, diversas patrocinadoras de um mesmo grupo econômico. Para fazer um recorte, consideramos aqueles fundos multipatrocinados que veem nesse negócio uma atividade comercial. Entre os players de mercado estão HSBC, Multiprev, Itaú, BB Previdência, Bradesco MultiPensions e IHPrev. Há, ainda, entidades fechadas de previdência complementar que não são ligadas a grandes instituições mas também se destacam por sua atuação no multipatrocínio, como Petros, Previsc, Quanta Previdência e Sul Previdência.
Dados da Previc apontam que 12 entidades multipatrocinadas contam, juntas, com patrimônio de R$ 72,21 bilhões, o equivalente a 13% do volume de recursos de todo o sistema fechado. O número de planos desse grupo chega a 409 (38% do total), enquanto o de participantes soma 874.895 (14% do geral). Vale lembrar que estão incluídos nesses números os dados da Petros, segundo maior fundo de pensão do Brasil.
Informações fornecidas pela fundação apontam que, em junho deste ano, o patrimônio da Petros somava R$ 58,8 bilhões. Desse montante, R$ 53,5 bilhões são do Plano Petros, cujas patrocinadoras são empresas do Sistema Petrobras e companhias do grupo que foram privatizadas. Os planos de outras patrocinadoras somam patrimônio de R$ 2,9 bilhões, e os instituídos, de R$ 393,3 milhões (veja detalhes na tabela).
Carlos de Paula, diretor de análise técnica da Previc, apresenta outros dados que comprovam o crescimento da importância do segmento multipatrocinado. Ele lembra que, entre 2003 e 2010, foram incorporados ao sistema brasileiro 53 novas entidades fechadas de previdência complementar, 359 planos de benefícios e 690 novos patrocinadores, além de 468 instituidores. No período, a elevação foi de 44% no número de patrocinadores, de 48% no volume de planos e de 17% na quantidade de entidades. “A evolução do número de entidades é menor do que o aumento no número de planos e patrocinadores. Por isso, é evidente que houve a criação de um número significativo de planos em entidades já existentes, assim como a adesão de mais patrocinadoras”, afirma o diretor. Para Carlos de Paula, essa é uma prova de que os planos multipatrocinados vêm ganhando espaço.

Ritmo acelerado – Com patrimônio de ao redor de R$ 5 bilhões no fundo multipatrocinado, o HSBC tem vivido um 2011 bastante movimentado no segmento. Até agosto, a instituição já tinha fechado negócio para administrar nove novos planos, sendo três já implementados e seis em fase de aprovação na Previc. Alfredo Lalia, diretor de fundos de pensão do HSBC Seguros, conta que em média o número de planos conquistados por ano fica em torno de sete ou oito, e a expectativa é que o volume chegue a 13 ou 14 novos planos em 2011. “Minha impressão é que as empresas de menor porte estão começando a colocar a previdência como mais um benefício aos funcionários. Isso acontecia mais entre as empresas maiores”, opina o executivo.
Dos nove planos conquistados até agora, apenas um é fruto de uma retirada de patrocínio de um fundo de pensão próprio. Todos os outros são de patrocinadoras estreantes no mundo da previdência complementar. “Nos últimos dois anos temos visto mais empresas criando planos do zero”, reforça. Ele acrescenta que o HSBC tem no pipeline algumas propostas de migração de planos por conta do fechamento de fundações próprias.
Paulo Stockler, diretor superintendente da Icatu Seguros que mantém o IHPrev, concorda que 2011 tem sido um ano de muita atividade no mercado de fundos multipatrocinados. “Tem mais de R$ 1,2 bilhão em propostas no mercado”, calcula o executivo. Ele pondera que o ano para o segmento de multipatrocinados acaba em setembro, uma vez que todo o processo de aprovação e implementação dos planos costuma demorar cerca de três meses. “Boa parte do que for vendido daqui para a frente só será colocado efetivamente em operação em 2012”, diz.
Com cerca de R$ 1,15 bilhão de patrimônio contando apenas os planos patrocinados, o IHPrev conquistou três novos clientes este ano, sendo que um plano, da ordem de R$ 240 milhões, ainda está em fase de aprovação na Previc. Hoje, o fundo conta com 34 planos e 48 patrocinadores. Stockler aponta que um dos fatores que têm colaborado para o crescimento dos multipatrocinados é a migração de planos de entidades próprias para o segmento. “As mudanças na legislação têm levado a uma profissionalização maior dos fundos de pensão. Os calendários de obrigações que os dirigentes têm de cumprir são cada vez mais intensos e extensos. Muitas entidades contam com profissionais que dividem seu tempo entre a atuação na patrocinadora e na fundação. Isso vai ficar cada vez mais difícil de acontecer. Existe toda uma regra para a composição de conselhos também. A legislação no Brasil está bastante exigente, e isso tem feito com que algumas empresas busquem o multipatrocinado, que já tem toda a estrutura”, observa Stockler.

Migrações – Janio Macedo, diretor presidente da BB Previdência, também vê a transferência de planos de entidades próprias para fundos multipatrocinados como uma das principais vertentes de crescimento deste nicho. “Quer queira quer não, uma entidade própria precisa de todo um quadro composto por atuários e pessoas que prestam assessoria não só contábil e financeira, mas também jurídica, para que o fundo esteja enquadrado a todas as regras. E de repente a empresa se vê cuidando de algo que não tem a ver com o seu core business, que não diz respeito ao seu dia a dia e nem à sua atividade-fim”, afirma o executivo. Ele acrescenta que, diante disso, muitas patrocinadoras têm preferido delegar a administração da previdência complementar dos funcionários a um agente especializado no assunto, como é o caso dos fundos multipatrocinados.
Esse é o caso dos dois novos planos conquistados pela BB Previdência ao longo do primeiro semestre de 2011. “Eles tinham gestão própria e decidiram migrar para um multipatrocinado”, conta Macedo, acrescentando que os dois planos somam algo em torno de R$ 250 milhões. Esse volume ainda não está considerado no total de R$ 1,35 bilhão que o fundo contabiliza em ativos, com 43 planos e 51,408 mil participantes.
O Multiprev, da MetLife, foi outro multipatrocinado que conquistou recentemente um cliente que está fazendo a transferência do plano de uma entidade própria para o fundo múltiplo. A operação está em processo de encaminhamento de documentos para análise da Previc, por isso a estimativa é de que o plano venha a rodar efetivamente em 2012. Esse cliente adicionará cerca de R$ 60 milhões ao patrimônio do Multiprev, atualmente em R$ 2,15 bilhões. No fundo múltiplo, estão 59 planos, de 118 patrocinadoras (47 grupos econômicos) e 28 mil participantes. Além deste plano que está em processo de análise na autarquia especial, o Multiprev registrou a adesão de quatro novos clientes em 2011, totalizando patrimônio de aproximadamente R$ 67 milhões. Rosangela Jardim, superintendente comercial da MetLife, comenta que, mais do que a migração de planos de entidades próprias para multipatrocinados, o que tem ocorrido bastante é a chegada de planos oriundos de reorganizações societárias, cisões, fusões e aquisições entre patrocinadoras. “Às vezes acontece de uma unidade de negócios de uma empresa ser vendida e, como essa unidade estava dentro de um plano fechado de previdência complementar patrocinado pela empresa, ela acaba procurando o multipatrocinado para dar continuidade ao seu plano de previdência. Isso é o que mais ocorre”, diz a executiva.

Concorrência – Dos fundos multipatrocinados “de mercado”, aqueles ligados a grandes instituições financeiras, o Multiprev é o segundo maior do sistema brasileiro, ficando atrás somente do HSBC. Considerando a Múltipla, fundo originalmente do Unibanco, o Itaú fica em terceiro lugar – e tem como objetivo alcançar o segundo. “O Itaú tem a Múltipla, que era do Unibanco, e o Itaú Multipatrocinado. Juntando os dois, ultrapassamos os R$ 2 bilhões de patrimônio, o que nos leva para a terceira posição no mercado. São entidades separadas, não sabemos se vamos juntá-las em algum momento, mas olhamos para os dois fundos como uma coisa única”, esclarece Flavio Pires, superintendente de clientes institucionais do Itaú. Ele revela que a instituição tem como objetivo chegar rapidamente à segunda colocação no mercado, e está trabalhando para isso. Nos últimos três meses, o fundo conquistou três novos clientes, cujos planos estão em processo de aprovação na Previc. Os três juntos devem agregar um patrimônio de R$ 215 milhões aproximadamente. Considerando a Múltipla e o Itaú Multipatrocinado, a instituição conta com 36 planos e 27 patrocinadores. “E estamos participando de diversos processos. Há várias propostas na rua”, completa. Pires detalha que os processos de concorrência em andamento no mercado são dos mais variados tipos. “Alguns planos surgem da reorganização societária das patrocinadoras ou da retirada de patrocínio de entidades fechadas, assim como existe a migração de uma fundação própria para um multipatrocinado. Também tem a troca de um multipatrocinado por outro.
E há ainda a empresa que passa a oferecer o benefício da previdência complementar. De todos os tipos, esse ainda é o menor em termos de atividade, mas está crescendo”, observa.

Fomento – Paulo Stockler, da Icatu Seguros, lembra que o mercado de multipatrocinados ainda tem uma visão de “rouba-monte”, em que um player disputa os clientes dos outros. “Temos a missão de buscar novas empresas, e isso passa pelo desenvolvimento de mecanismos que podem tornar o produto mais atraente”, diz o executivo. Ele afirma que há uma lista de companhias de pequeno e médio porte que poderiam passar a oferecer o benefício da previdência complementar aos seus funcionários. “Tem também empresas maiores, como as multinacionais que estão se instalando no Brasil e se interessam pela formato dos fundos fechados”, adiciona. Stockler estima que, mapeando os potenciais adeptos, pode-se encontar entre 2 mil e 3 mil empresas propensas a criar novos planos.
Para o executivo, ajudaria se a legislação fosse mais flexível de forma a agilizar a montagem dos planos. “Temos mantido um diálogo interessante com a Previc, que está se mostrando bastante receptiva às demandas do segmento. A discussão tem sido interessante”, comenta.
Carlos de Paula, da Previc, conta que foi realizada em julho uma reunião entre a autarquia especial e representantes do segmento de multipatrocinados, incluindo a Comissão de Fundos Multipatrocinados e Instituídos da Abrapp. “O tema central do debate era como eles poderiam crescer. Eles elencaram uma série de apontamentos, que também foram levados para a Comissão da Abrapp. Agora temos um ponto de contato com a associação para discutir as questões objetivamente. A ideia é tentar encaminhar algumas ações no sentido de reconhecer o multipatrocinado como uma figura diferenciada dentro do sistema e começar a pensar até em um processo de regulação alinhado com o perfil dessas entidades”, adianta.
Ele esclarece que alguns pontos podem ser viabilizados por parte da autarquia, enquanto outros devem ser submetidos ao Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC). “Discutimos movimentos que podem potencializar a atuação dos fundos multipatrocinados. Temos três frentes: uma mais objetiva, cujas ações estão ao alcance da própria Previc e têm a ver com procedimentos internos da autarquia; outra que se refere a pontos que podem ser tratados por meio de instrução; e uma terceira relacionada a temas que vamos precisar discutir com o CNPC. São vários assuntos. De imediato vamos poder atender a alguns. São questões que, na opinião do mercado, estão causando algum atraso. Vamos poder avançar”, garante o diretor.
Carlos de Paula cita uma iniciativa da Previc que, apesar de não ser direcionada exclusivamente aos multimercados, está relacionada a algumas das demandas apresentadas. Ele se refere à Instrução número 4, de agosto de 2011, que “disciplina o procedimento de análise eletrônica e define prazos para atendimento de requerimentos no âmbito da Diretoria de Análise Técnica” da Previc. Com ela, os requerimentos enviados à Ditec terão o tempo médio de tramitação reduzido em 48%. “Isso já está em linha com alguns pedidos dos multipatrocinados que seguem na linha de dar mais celeridade ao processo de análise”, reforça o diretor. Além da questão da agilidade, os fundos também debatem, por exemplo, a possibilidade de desenhar novos tipos de planos e a aproximação com o mercado segurador.
Reginaldo José Camilo, coordenador da Comissão Técnica Ad Hoc de Fundos Multipatrocinados e Instituídos da Abrapp, lembra que no 31º Congresso Nacional dos Fundos de Pensão, realizado em novembro do ano passado em Olinda (PE), foram apresentados itens considerados prioritários para o desenvolvimento deste mercado. Resumidamente, esses itens foram divididos em três pilares: desoneração, fomento e novos produtos. “Essa agenda também já foi levada ao CNPC. O Conselho recepcionou todos os itens que apresentamos, além de um ou outro ponto ter sido acrescentado no âmbito do CNPC”, conta Camilo. Ele explica que o fato de o CNPC ter recepcionado as demandas significa que os assuntos levantados seriam elencados na priorização de temas a serem trabalhados no CNPC. Camilo lembra que, naquilo que não depende do CNPC, algumas ações já foram feitas. “Nós tínhamos colocado entre os itens a questão da exigência do Demonstrativo de Reavaliação Atuarial Anual para planos de Contribuição Definida, que não fazia muito sentido.
A Previc recepcionou esse assunto e já mudou a norma. Esse é um exemplo do que já aconteceu”, aponta.