Crise pode valorizar os Fips

Edição 196

Longo prazo e falta de relação direta com o humor do mercado são apontadas como vantagem do segmento

A dificuldade no acesso ao crédito e o estreitamento do canal que leva as empresas à captação de recursos no mercado via emissões de ações podem resultar em um aumento das oportunidades para investimentos em private equity. Entre os pontos a favor da categoria estão a maior relação dos ativos com a economia real, a independência relativa do humor do mercado e a característica de longo prazo das aplicações. Do outro lado, além da forte incerteza que pode deixar os investidores em stand by, está a complicada tarefa de convencer os empresários de que os múltiplos oferecidos pelas participações em seus projetos já não são os mesmos do recente passado de fartura.
De acordo com Luiz Eugenio Junqueira Figueiredo, presidente da Associação Brasileira de Private Equity & Venture Capital (Abvcap) e diretor da Rio Bravo, a redução no volume de IPOs realizados este ano na comparação com 2007 aumentou o espaço para investimentos em private equity e venture capital, mas, para a concretização desses aportes, é preciso que os acionistas das empresas percebam que os múltiplos do mercado observados no ano passado não são mais uma realidade. “Muitas vezes os acionistas estão esperando obter múltiplos que haviam sido ‘prometidos’ por bancos de investimento ou que foram atingidos por algumas empresas similares negociadas na Bolsa. Eles precisam entender que o momento atual é outro, de maior fundamentalismo. Em alguns casos este ajuste de percepção pode levar algum tempo”, sinaliza Figueiredo. Para Carlos Augusto Nunes Jr, da Nest Investimentos, o desafio dos gestores de fundos de private equity é justamente alinhar as expectativas de empresários e investidores. “Por conta das recentes quedas das ações, os comparáveis da Bolsa também tendem a ficar mais baratos, e é preciso convencer os empresários de que aqueles múltiplos de antes deixaram de fazer sentido. Como vamos convencê-los de que agora o múltiplo passou a ser menor?”, diz o executivo. A Nest passou a atuar no mercado de private equity no início deste ano, mas, mesmo assim, Nunes afirma imaginar que o apetite dos investidores e a abertura do mercado para a realização de IPOs em 2007 tenha “dificultado a vida” dos gestores de private equity. “Com o cenário de alta liquidez, era mais fácil uma empresa conseguir fazer IPO e, com os grandes bancos oferecendo o acesso ao mercado com múltiplos mais interessantes, era mais complicado o gestor chegar e oferecer um private equity”, analisa.
Nunes acrescenta que o encarecimento do crédito pode ajudar a reduzir, pelo menos um pouco, a expectativa dos empresários em relação aos múltiplos oferecidos por seus projetos. Ele explica que os bancos devem endurecer um pouco as condições para concessão do crédito até “entenderem direito os efeitos da crise” e, como as empresas precisam de recursos para fomentar suas operações, abre-se uma oportunidade para fundos de private equity capitalizados. Essa tendência já pode ser sentida na prática. Demósthenes Marques, diretor de investimentos da Funcef, conta que, com o enxugamento da liquidez, estão se abrindo “excelentes oportunidades” de investimento de longo prazo e, mais ainda, empresas que antes não sentiam a necessidade de contar com um parceiro para injeção de capital voltaram atrás e agora estão em busca de investidores interessados.
“Já estudávamos alguns projetos de participações de longo prazo há mais tempo, mas os empreendedores não sentiam a necessidade de procurar parceiros porque tinham toda a liquidez do mercado à disposição. Agora estes mesmos empreendedores já voltam a olhar para nós e fazem contatos para saber do nosso interesse em investimentos nestes projetos de longo prazo. Hoje o crédito já está começando a ficar mais caro, e os empresários passam a avaliar se não vale a pena compartilhar o seu negócio com um sócio como um investidor institucional, por exemplo”, afirma o executivo. A carteira da fundação tem uma parcela de 35% exposta em renda variável e cerca de metade desta fatia refere-se a participações societárias de longo prazo. “São os investimentos em private equity ou em participações diretas com planejamento similar a de um private equity em empresas já de capital aberto. Nestes casos, há uma lógica dentro da carteira em se aguardar um determinado montante de valorização da empresa, como se fosse realmente uma estratégia similar à do private equity”, explica.
Outra característica que pode beneficiar ou, pelo menos, não atrapalhar os investimentos em private equity em meio à turbulência nos mercados financeiros é o fato de os aportes serem de longo prazo – e, em parte por conta disso, menos suscetíveis ao sobe-e-desce da Bolsa. “O prazo também ajuda os investimentos em private equity. Por maior que seja o temor de como a crise pode afetar o Brasil, existe um otimismo de médio prazo em relação ao País. Além disso, o fato de o private equity não estar sujeito diretamente ao humor dos papéis no mercado também pode auxiliar”, comenta Nunes, da Nest. Para Figueiredo, a procura dos investidores por fundos de private equity e venture capital continua grande, consistente e crescente. “Não acho que a volatilidade vivida pela Bolsa aumente a procura de investidores por fundos de PE&VC no curto prazo, mas também não acho que gere uma redução desta procura.
Penso que os investidores de PE&VC possuem uma estratégia de longo prazo, pouco ou nada impactada por volatilidades de curto prazo nos mercados financeiros”, assinala o executivo.
Nunes, no entanto, adverte que o atual cenário pode complicar a captação de recursos para os fundos, porque os investidores ainda estão “preocupados em entender a crise e até onde ela deve chegar”. “Mas tenho a percepção de que haverá, em um segundo momento, quando passar esse período de grande turbulência, uma migração dos investimentos para ativos mais ligados à economia real”, completa.

Estréia – A Nest já conta com cerca de 20 a 25 projetos sob análise em sua recém-formada área de private equity, sendo que dois deles já estão bem avançados, em fase de negociação com os empresários. “Temos chance de fechar o deal ainda esse ano, só dependemos de algumas questões negociais”, afirma Nunes. Um deles, destinado ao setor de agrobusiness, tem como foco basicamente os investidores estrangeiros – a asset já vem conversando com fundos de investimento principalmente de Londres e Nova York, além de Portugal e Espanha, países que, segundo o executivo, vêm demonstrando uma demanda recentemente e podem ser uma grande fonte de interesse. O outro, voltado a investidores brasileiros, investirá no ramo de bens de capital. Isso não quer dizer, no entanto, que a asset trabalha os investimentos em private equity com foco setorial. “Uma decisão que tomamos é de atuar case by case, ou seja, identificamos oportunidades e montamos um pool de investidores para cada uma delas. E fazemos um filtro mínimo, a empresa alvo do investimento tem que ter pelo menos R$ 30 milhões de faturamento anual”, resume. Nunes acrescenta que “toda gestora pensa em estar perto das fundações”, mas, neste primeiro momento, a Nest não tem os fundos de pensão como target preferencial na área de private equity.
Figueiredo, da Abvcap, conta que a participação de fundos de private equity e venture capital na carteira das fundações brasileiras ainda é reduzida se comparada com os padrões internacionais, mas tem crescido de forma consistente. “O movimento de aplicação em PE&VC se iniciou pelos grandes fundos de pensão e está agora atingindo também as pequenas e médias fundações”, aponta o executivo.

Modal está de olho na demanda da Petrobras As médias empresas fornecedoras de produtos e serviços à Petrobras estão no radar dos investidores. Entre o final de outubro e o início de novembro, será aberto para captação o novo fundo de private equity do Modal, em parceria com a Caixa Econômica Federal, voltado a investimentos em empresa da cadeia produtiva de óleo e gás. “Temos mapeadas 1500 empresas do setor. Destas, 220 estão nos segmentos que serão mais prestigiados com os investimentos da Petrobras e terão condições de entrar em licitações de contratos maiores”, conta Humberto Tupinambá, sócio do Banco Modal e responsável pela criação do novo produto. No final da seleção, de dez a 12 empresas receberão os aportes.
O fundo tem prazo de 96 meses para investimento, quatro anos de maturação e dois anos de desinvestimento. A rentabilidade esperada para o investidor é de IPCA+10% ao ano, mas no target do fundo estão projetos que possam gerar retorno de IPCA+18% a IPCA+20% ao ano.
O produto deve atrair investidores estrangeiros – o Modal já vem conversando com alguns fundos de investimento asiáticos e europeus, além de organismos internacionais – e fundos de pensão brasileiros. “Falamos informalmente com as fundações. Precisamos esperar o registro do fundo na CVM para conversarmos de um jeito mais formal”, diz Tupinambá. Paralelamente, o Modal lançará um outro veículo, de dívida, também voltado ao setor de óleo e gás. “Este veículo deve ser lançado em três ou quatro meses, operando concomitantemente ao fundo de private equity. O Modal já trabalha com prestadores de bens e serviços da Petrobras há sete anos e, nesse tempo, emprestou R$ 9 bilhões à cadeia”, afirma.