Edição 216
A perspectiva de uma popularização das emissões de dívidas como forma de as empresas se capitalizarem e o consequente aumento desses ativos nos portfólios dos investidores estão levando a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) a buscar instrumentos para fazer a marcação a mercado das debêntures. A previsão é de que a ferramenta seja lançada pela entidade no próximo ano. A precificação de ativos ilíquidos é uma das preocupações atuais da associação, que também promete lançar um modelo para fazer a marcação dos Certificados de Depósito Bancário (CDBs) até o fim deste ano.
Segundo o presidente do Comitê de Precificação de Ativos da entidade, Luiz Fabiano Gomes Godói, a evolução do País abre espaço para que as empresas emitam dívidas. “Antes o mercado era quase que totalmente suprido pelos títulos públicos. Mas, na medida em que há uma estabilização, existe mais espaço para que as empresas venham a se capitalizar no mercado e utilizem mais instrumentos para isso. Portanto, passam a existir mais ativos para serem precificados”, explica.
De acordo com Godói, o objetivo final é o aumento da liquidez desses ativos. “Para fugir da questão do ovo e da galinha – ou seja, se é preciso formar mais preços para ter liquidez, ou ter mais liquidez para que haja mais divulgação de preços -, não há outra alternativa a não ser trabalhar em várias frentes”, argumenta. Ele acrescenta que uma das frentes trabalhadas é de forma a aumentar a participação das instituições emissoras ou dos coordenadores nas emissões. “Eventualmente, eles podem manter um pedaço das emissões em carteira, para gerar preços de oferta de compra e venda sobre os papéis que forem emitidos. Outra medida possível é estimular uso de plataformas eletrônicas de negociação para papéis privados”, exemplifica. Segundo Godói, isso acabaria contribuindo para o aumento da liquidez, “ou pelo menos, para uma dispersão de preços menor, o que já atrairia liquidez”.
O superintendente executivo de renda fixa e multimerados da Bram – Bradesco Asset Management, Luis Roberto Zaratin Soares, acredita que a liquidez desses papéis virá com o tempo. Segundo ele, é preciso que haja um banco de dados em que seja possível olhar para o passado e estimar riscos futuros. “Houve essa discussão também com títulos públicos, e hoje essa margem de erro é muito pequena. Estimar esses preços se tornou fácil, o que não era no passado”, compara. O executivo acredita que essa facilidade virá com o aumento do banco de dados e da série histórica desses papéis. “Em alguns anos, haverá uma padronização, e não estaremos mais discutindo isso, mas talvez, algum outro tipo de ativo ilíquido.” Godói concorda que uma das maiores dificuldades é a falta de informação.
Para ele, a grande dúvida é sobre como será a passagem do patamar atual para um mercado mais desenvolvido. “A questão é como a gente sai desse nível em que se encontra hoje, de ter aproximadamente 90 debêntures sendo precificadas pela Anbima, para um novo, com muito mais papéis, além de outros ativos”, reforça.
Estudo – O projeto da precificação em elaboração na Anbima é estudado em conjunto com Caio Ibsen Rodrigues, diretor de publicação da Sociedade Brasileira de Finanças e professor assistente da Fundação Getúlio Vargas (FGV) – RJ. Segundo ele, é preciso ter uma mesma curva para marcar todos as debêntures igualmente e capturar o risco naquele mercado inteiro, por uma “questão de consistência”. “Qualquer ativo de renda fixa com fluxo de caixa composto pode ser marcado pela variação da taxa interna de retorno. A desvantagem é que se está olhando para cada um dos instrumentos em separado, o que pode levar a um risco sistêmico caso se trate de uma carteira com ativos de bônus”, explica.
Rodrigues indica que a ideia é criar um instrumento que possibilite gerar uma curva que capture o risco no mercado todo. “O que queremos fazer é, basicamente, pegar a curva composta da soma dos diferentes movimentos que podem acontecer. São os movimentos muito típicos de uma curva de juros, como deslocamentos paralelos e inclinações, e esses serão os fatores de risco da curva.” Para fazer seu modelo de marcação a mercado desses ativos, a Anbima enviou técnicos para conhecer os formatos adotado no Chile e no México.
De acordo com a associação, naqueles países há empresas que prestam esse serviço para os fundos de investimento, colhendo dados com agentes de mercado e estabelecendo a precificação. A entidade planeja ainda visita aos Estados Unidos para conhecer como funciona o modelo em um mercado mais dinâmico. A Anbima esclarece que o projeto ainda está sendo montado, não havendo uma definição do modelo a ser adotado.
Godói, do comitê de Precificação de Risco, acredita que este é um desafio que está apenas no início. “Na medida em que que há mais instrumentos, sejam os de crédito bancário ou os de crédito corporativo, o desafio de marcação só cresce, exponencialmente. Precisamos estar preparados para fazer frente a essas dificuldades.”