Disputa começa a apertar

Edição 171

Com volume de recursos da ordem de R$ 21 bilhões, os institutos de
previdência de estados e municípios atraem a atenção de muitas assets
que até agora vinha se mantendo à margem

A gestão de recursos de institutos de previdência de estados e municípios
é hoje um dos mercados mais disputados por assets. E não é para
menos. Afinal, dos 5.500 municípios do País, cerca de 2.200 possuem um
regime próprio de previdência, em substituição ao Regime Geral de
Previdência Social, gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Os recursos, capitalizados em um fundo de previdência que garante o
pagamento dos benefícios de participantes, já supera os R$ 21 bilhões,
segundo o presidente da Associação Paulista de Entidades de Previdência
Municipal (Apeprem), João Carlos Figueira. E os planos são de chegar a R$
500 bilhões em dez anos.
“Nos últimos seis anos, o número de institutos mais que dobrou”, informa
Figueira, que também dirige o Instituto de Previdência de Jundiaí
(Iprejun). A migração para o regime próprio, segundo ele, está associada
a pelo menos dois fatores. Um deles é a economia. No regime do INSS, a
prefeitura tem um custo equivalente a 38% sobre a folha de pagamento.
No caso do fundo de previdência próprio, pagará cerca de 23%. “Alguns
municípios conseguem contribuir com o mínimo, que é 11%”, ressalta.
O controle sobre a gestão do patrimônio é outro ponto forte do regime
próprio, o que diminui o risco de perdas no futuro. Os recursos, destaca o
presidente da Apeprem, são capitalizados longe da estrutura do INSS, cujo
déficit chegou a R$ 38 bilhões no ano passado. “Com o juro ainda alto, os
institutos têm conseguido uma remuneração acima da meta atuarial. Com
isso, os volumes têm crescido e as taxas de administração diminuído. O
mercado está ficando mais competitivo.”

Início – As normas gerais para organização e funcionamento dos regimes
próprios de previdência de servidores públicos foram editadas em 1998.
Mas o mercado só ganhou impulso há cerca de três anos, com o
aprimoramento da legislação. As regras para as aplicações dos recursos
dos regimes próprios, no entanto, só foram estabelecidas pela Resolução
do Conselho Monetário Nacional (CMN) nº 3.244, de 28 de outubro de
2004. “Há entidades que ainda precisam se enquadrar e muitos
municípios se preparando para entrar”, informa Figueira.
O mercado ainda é incipiente, avalia Fabiano Gomes, responsável pela
gestão de fundos de renda fixa do Santander Banespa. “Mas, claramente,
o potencial de crescimento é enorme, dado o número de pessoas que
estão fora da previdência. Para o mercado de gestão, esse é um nicho tão
importante quanto o de fundos de pensão fechados.”
Gomes reconhece que será um longo caminho até que esses fundos
atinjam um tamanho relativamente grande. Mas, ressalta: “agora é a hora
de entrar no mercado, depois ficará mais difícil disputar a gestão desses
recursos”. Para o diretor de ativos de terceiros da Caixa Econômica
Federal, Marcelo Bonini, crescer é uma questão de tempo. Na sua opinião,
os institutos de previdência vão acompanhar a disseminação da cultura da
previdência.
Os principais players são os bancos públicos, como a Caixa e o Banco do
Brasil, muito em função do relacionamento que tem com municípios e
estados. A Caixa, por exemplo, administra um patrimônio próximo a R$ 3
bilhões nesse segmento. “Estamos muito próximos do setor público”,
argumenta Bonini. Segundo ele, além de administrar os recursos dos
regimes próprios dos servidores, o banco presta serviços de assessoria de
investimentos e ainda de avaliação atuarial para a gestão do passivo. Já o
Santander, apesar de privado, herdou uma fatia importante desse
mercado no interior de São Paulo e na região Sul do Brasil, por conta da
aquisição dos bancos Banespa e Meridional. Na carteira de clientes, estão
cerca de 100 entidades, com um total de R$ 430 milhões em recursos sob
gestão.
Mas tem banco privado no setor. O Bradesco atua nesse mercado há cerca
de um ano e meio e já conquistou a gestão dos recursos de 150
entidades em todo o País, informa o gerente do departamento de
investimentos do banco, Frederico Ferrari. “A área no banco é
relativamente nova, até porque antes não havia regras específicas, nem
transparência. Mas temos atuado de forma bastante agressiva”,
afirma. “O universo a ser explorado é muito grande e o mercado está
longe de atingir sua maturidade.”
Assim como os bancos estatais, o Bradesco também desfruta de uma
capilaridade grande, especialmente através do Banco Postal, para
disseminar o trabalho junto a municípios de todo o País, acrescenta o
gerente de investimentos para o setor público do Bradesco, Aldo José da
Silva. Segundo ele, o “Poder Público” em geral é um nicho muito
importante de negócios para o banco. Tanto é que há uma área específica
só para atender esse cliente, seja ele um instituto de previdência
municipal ou qualquer outro ente público.
O Bradesco tem sob gestão um total de R$ 2,5 bilhões em recursos de
entidades públicas; os institutos de previdência representam entre R$ 400
milhões e R$ 500 milhões, segundo Ferrari. “Queremos ser líder”, diz
Ferrari. Silva acrescenta que o banco vai buscar uma fatia de mercado
equivalente a que tem no setor de fundos de investimento, no qual é o
segundo do ranking, atrás apenas do Banco do Brasil.

Estratégias – Os institutos, em geral, têm optado por aplicar seus recursos
em fundos de investimento. Segundo Gomes, do Santander, são poucas
as entidades que têm escala para montar carteiras exclusivas. Quando a
prefeitura resolve adotar o regime próprio, tem de repassar ao fundo de
previdência os recursos equivalentes às contribuições já realizadas ao INSS
com o objetivo de compor suas reservas. “Pouquíssimos municípios têm
caixa suficiente para transferir todo o dinheiro necessário para as
aposentadorias futuras e investimentos.”
Sem reservas suficientes, os institutos aplicam seus recursos em fundos
que já estão em operação. Como esse é um segmento com regras
específicas para investimento, os bancos têm apostado na criação de
produtos especiais para atender esse público. O Santander, por exemplo,
tem fundos que só podem captar recursos dos institutos de previdência e
também carteiras voltadas para os fundos de pensão em geral.
Já a estratégia da Caixa é criar fundos regionais, a fim de ficar mais
próximo do cliente. Hoje, conta com três produtos: Regime Próprio Rio
Grande do Sul; Regime Próprio Aliança (Rio de Janeiro, Minas Gerais e
Espírito Santo) e Regime Próprio Nacional, esse último para institutos de
previdência dos demais estados e municípios.
O Bradesco, segundo Ferrari, também estruturou fundos específicos para
os institutos, compostos exclusivamente de títulos públicos. Outra opção é
a compra direta de papéis do governo; nesse caso, o banco apenas faz a
intermediação do negócio e presta o serviço de custódia do ativo. “O
investimento direto não é muito freqüente, porque nem sempre o
dirigente do instituto se sente confortável ou tem experiência para decidir
sobre a gestão dos recursos”, informa o gerente do Bradesco.

Política de investimento – A política de investimento dos institutos de
previdência, diferentemente de seus pares fundos de pensão fechados,
ainda é muito restrita e conservadora. Para Gomes, isso é fruto de um
mercado muito recente. “Com o amadurecimento do setor, a tendência é
de flexibilização das regras.”
Em geral, os institutos fazem um mix de aplicações, alocando os recursos
em fundos referenciados DI, até o limite de 80% do patrimônio, carteiras
de renda fixa desde que classificadas como de baixo risco (até no
máximo 15% dos recursos) e títulos públicos, que podem receber até
100% dos ativos. Os institutos de previdência podem ainda destinar parte
dos recursos (até o limite de 20%) para o mercado de ações, desde que
através de fundos referenciados em índices de Bolsa, e a cotas de fundos
imobiliários.

Os entraves – Projeções de mercado feitas no início dos anos 2000
apontavam que esses fundos teriam hoje cerca de R$ 400 bilhões em
ativos. O mercado, no entanto, está muito longe disso e uma das
explicações seria a falta de controle sobre os regimes próprios, o que
estaria comprometendo a formação das reservas. Como não há
exigências sobre avaliações atuariais, muitas entidades podem estar com
as contribuições defasadas. A demora para a transferência do dinheiro do
INSS para o caixa dos institutos, por meio do mecanismo de compensação
previdenciária, também pode estar atrasando o crescimento desse
mercado. Esse processo tem levado no mínimo seis meses.