Exclusivo: Regras de transição não devem ser muito longas, diz Ma...

17-05-2016 – 11:47:16

 

Uma semana antes do anúncio do nome do economista Marcelo Abi-Ramia Caetano como novo secretário de Previdência, realizado nesta terça, 17 de maio, pelo Ministro da Fazenda Henrique Meirelles, a revista Investidor Institucional fez uma longa entrevista com o, até então, pesquisador do Ipea – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas. Naquele momento, Caetano passava férias no exterior e seu nome ainda não aparecia como cotado para a função.

Na entrevista, o novo secretário disse que as regras de transição, para alcançarem os efeitos necessários para redução do déficit da Previdência, não devem ser muito longas. “Se fizermos uma regra de transição muito longa, ou se fizermos uma mudança apenas para aqueles que vierem a ingressar no mercado de trabalho daqui pra frente, não teremos muito tempo para ajustar”, disse. Por isso, ele indicava que as regras deveriam ser mais curtas, sem definir uma proposta fechada.

Caetano defendeu também a proposta de implantação da idade mínima de aposentadoria móvel, ou seja, que possa evoluir de acordo com as mudanças na expectativa de vida da população. A proposta, segundo o novo secretário, elimina a necessidade de realização de reformas periódicas em função do aumento da longevidade da população.

Ainda revelou sua posição favorável em relação à desindexação do reajuste dos benefícios da previdência social ao salário mínimo. Para ele, a indexação aos ganhos reais do salário mínimo está aumentando o desequilíbrio das contas da Previdência e uma solução mais adequada é a adoção de algum índice de inflação para reajustar os benefícios previdenciários. Em relação às idades de aposentadoria entre homens e mulheres, o novo secretário disse que a tendência mundial é reduzir ou acabar com as diferenças.

Em todas as propostas, Caetano ressaltou que as decisões do novo governo, teriam que enfrentar uma dura negociação política com o Legislativo. “Temos parâmetros técnicos, mas no fundo no fundo, a decisão não é técnica. A decisão depende mais da negociação política”, disse. Ele ainda considerou positiva a incorporação da Previdência ao Ministério da Fazenda pelo fato de possibilitar maior unidade ao Executivo na elaboração da proposta da reforma. Meirelles disse em entrevista coletiva na manhã desta terça que o Executivo deve apresentar uma proposta de reforma da Previdência no prazo de 30 dias.

Leia os principais trechos da entrevista com Marcelo Caetano:

Investidor Institucional – O sucesso da reforma da Previdência é um ponto fundamental para a sobrevivência do governo Michel Temer?

Marcelo Abi-Ramia Caetano – Eu não vejo dessa maneira não, que o governo só vai sobreviver se fizer a reforma da Previdência. Existe uma necessidade de ajuste de contas um pouco mais na frente. Se vai ser prioridade ou não, não temos como saber. Será uma escolha política da nova equipe. É importante lembrar que não é uma decisão apenas do Executivo. Para realizar uma reforma minimamente ambiciosa, são necessárias mudanças legais e, muitas delas, constitucionais. Por isso, se o Executivo estiver disposto e não houver a mesma disposição no Legislativo, você não consegue aprovar.

II – A negociação política irá predominar sobre os critérios técnicos?

MC – Temos parâmetros técnicos, mas no fundo no fundo, a decisão não é técnica. A decisão depende mais da negociação política. Ou seja, o que predomina na regra de transição é a discussão política.

II – Como avalia a incorporação da Previdência ao Ministério da Fazenda do governo Temer?

MC – Não posso comentar muito sobre isso, pois não tenho os detalhes, mas um elemento positivo nesse fato é que possibilita uma unidade maior do Executivo para a proposição de reformas. Muitas reformas não andaram, não ocorreram, por conta de divisões internas dentro do Executivo. Isso é um aspecto. Claro que também muitas outras reformas andaram quando o governo conseguiu uma boa coordenação. Então, não é uma condição essencial, mas a unificação ajuda sim. A unificação da Previdência com a Fazenda facilita a vida para o Executivo, mas depois vem a negociação com o Legislativo, que é outra questão.

II – O que você acha da proposta do estabelecimento de uma idade mínima móvel para a aposentadoria?

MC – A ideia de estabelecer uma idade mínima móvel vem aparecendo em alguns países e faz bastante sentido. A proposta elimina a necessidade de realizar reformas previdenciárias periódicas em função do processo de envelhecimento populacional. Então, por exemplo, se colocamos uma idade mínima hoje de 62 anos de idade, como um parâmetro qualquer, e daqui a 10 anos, a expectativa de vida da população tenha aumentado, é necessária nova mudança. Então, uma idade que fazia sentido em um momento dado, no momento seguinte, pode ficar baixa novamente. Quando se coloca uma idade ajustada de acordo com a expectativa de vida da população, temos um ajuste que fica automático e elimina a necessidade de realizar reformas previdenciárias de tempos em tempos.

II – O que você acha da equiparação das idades de aposentadoria entre homens e mulheres?

MC – A tendência mundial é igualar a idade de aposentadoria para homens e mulheres. Com as mudanças na longevidade das populações nos últimos anos, a tendência é acabar ou reduzir a diferença de idade de aposentadoria entre homens e mulheres. Novamente, se isso será feito ou não, é mais um questão política que técnica.

II – Qual a sua posição em relação à indexação do salário mínimo aos benefícios da Previdência Social?

MC – Sou favorável à desindexação porque já haverá um aumento muito grande dos gastos em função do envelhecimento populacional. E se adicionar, além disso, o ganho do benefício acima do ganho da produtividade, que é o acontece quando ocorre a indexação do salário mínimo ao piso do benefício previdenciário, o gasto será ainda maior. Acho mais razoável manter o reajuste da inflação, para manter o poder de compra e, com isso, mantém o poder aquisitivo das pessoas e mantém a sustentabilidade. Então, a indexação da inflação não prejudica a questão social.

II – Como devem ser as regras de transição?

MC – A meu ver, nós perdemos tempo para realizar a reforma. Estamos atrasados para realizar a reforma. Deixamos para realizar a reforma tardiamente. No início do século, a taxa de fecundidade no Brasil começou a ficar abaixo de 2,1 filhos por mulher. Essa é a taxa que a população se mantém estável, ou seja, não decresce. Hoje em dia, a taxa já caiu para 1,9 filhos por mulher, até abaixo disso, e existe a tendência de convergir para 1,5 filhos por mulher nas próximas décadas. Estamos começando a ver essa geração que começou a nascer com a taxa de fecundidade menor que 2,1 filhos, está entrando na vida ativa. Vão sair do final da adolescência para fazer a transição para a vida adulta e isso vai significar que teremos uma queda muito rápida do número de contribuintes.

II – A queda acelerada do número de contribuintes aponta para a necessidade de uma transição que deve acompanhar essa mudança?

MC – Como haverá uma queda muito rápida do número de contribuintes nos próximos anos, em função disso, se fizermos uma regra de transição muito longa, ou se fizer uma mudança apenas para aqueles que vierem a ingressar no mercado de trabalho daqui pra frente, não teremos muito tempo para ajustar. Então, as regras de transição de fato devem ser mais curtas. O quão curtas serão as regras, isso é uma questão política, não é meramente técnica.

II – Qual a situação de outros países em relação à adoção ou não da idade mínima?

MC – Há apenas 14 países que não adotam a idade mínima. São na maioria países da África do Norte e do Oriente Médio, basicamente são países com maioria árabe. Um exemplo é o Irã, que não adota idade mínima. Na América, acredito que só o Equador tem a regra que permite a aposentadoria sem um limite etário, mas mesmo lá, há um tempo de contribuição mais alto que o Brasil. Então, é uma situação muito peculiar do Brasil em não adotar a idade mínima.

Leia entrevista na íntegra na edição 281, de maio de 2016, da revista Investidor Institucional