Para além das fronteiras

Edição 208

Uma das mudanças mais comentadas da Resolução 3.792 do Conselho Monetário Nacional (CMN) foi a criação do limite de 10% para investimentos no exterior. A intenção da Secretaria de Previdência Complementar (SPC) de instituir esse novo teto já era de conhecimento dos participantes do sistema após reportagem de Investidor Institucional publicada em setembro do ano passado. Agora que a regra virou realidade, algumas fundações consideram a possibilidade de diversificar aplicações em mercados globais. Outras, porém, continuam com o discurso de que ainda há muitas oportunidades para investimentos no mercado doméstico.A Fundação Chesf de Assistência e Seguridade Social – Fachesf, por exemplo, deverá apresentar a seu Comitê de Investimentos a possibilidade de aplicar em Exchange Traded Funds (ETFs), ou fundos de índices, no exterior, por meio de fundos de investimentos locais. Com a Resolução 3.792, os ETFs passaram a ser citados na legislação como forma de investimento em renda variável e no exterior. “A vantagem é já comprar um investimento diversificado”, afirma Luiz da Penha, gerente de investimentos da entidade. Os ETFs são negociados em bolsa e replicam, em apenas um papel, todas as ações de um determinado índice. “Não temos uma decisão ainda. A idéia está na área técnica e seguirá para o Comitê de Investimentos”, comenta.Segundo ele, iniciar o investimento no exterior por meio de fundo de índice é mais adequado para os fundos de pensão por ser simples. “Não precisamos nos dar ao trabalho de escolher ação por ação, já que em um papel só o fundo agrega empresas de diversos setores”, completa. Ele lembra que, caso o Comitê de Investimentos aprove, a aplicação sai ainda este ano. “Vamos começar com um percentual pequeno do patrimônio.Será um aprendizado para quando for realmente necessário utilizar os investimentos no exterior como uma fonte de retorno”, salienta.Atualmente, a Fachesf conta com patrimônio de R$ 4 bilhões, sendo 70% aplicados em renda fixa e 20% em renda variável.Outras fundações, no entanto, ainda não vêem muitas vantagens em investir no exterior. Uma delas é o Metrus – Instituto de Seguridade Social. Segundo o presidente da entidade, Fábio Mazzeo, a fundação ainda não recebeu propostas de gestores para aplicar lá fora. “Mas vai ser difícil aceitarmos, a não ser que sejam produtos atrelados a papéis de empresas brasileiras”, diz. Sem dar detalhes, Maurício da Rocha Wanderley, diretor de investimentos da Valia, afirma que a fundação “está olhando” oportunidades de investimentos fora do País.E existe um longo caminho a se percorrer entre as intenções e a prática.Os próprios gestores ainda vão ter de se adaptar à nova regra e criar produtos adequados aos fundos de pensão. A BB DTVM, por exemplo, levanta algumas possibilidades sobre o que poderá ser feito para esse investidor. Segundo Carlos José da Costa André, diretor da asset do BB, o melhor será começar com fundos que invistam em ativos relativamente simples para que a fundação consiga visualizar melhor que tipo de risco está correndo e qual retorno pode esperar. “Algumas alternativas podem ser títulos de renda fixa emitidos no exterior relacionados ao Brasil, de empresas brasileiras ou do governo, além de ADRs [American Depositary Receipts]. Em um segundo momento, podemos nos sofisticar mais, com exposição a índices das principais bolsas do mundo, com ETFs ou diretamente no mercado futuro”, afirma André. Apesar de a BB DTVM ainda não ter definido o portfolio de produtos que poderá ser criado de acordo com a nova legislação, o executivo afirma que o mais provável é seguir uma estratégia gradativa de sofisticação.De acordo com André, é natural que a maior parte dos fundos de pensão ainda não tenha as aplicações no exterior no radar. “Primeiro porque ainda existem boas oportunidades em ativos domésticos para serem explorados. Segundo, porque acredito que os investidores ainda precisam entender todo o operacional necessário para esses investimentos”, afirma, completando que essa “curva de aprendizado” vai ser puxada pelos gestores de fundos. “Porque nós é que temos que induzi-los, facilitar a ligação entre mercado local e o lá de fora.” Segundo ele, o primeiro passo da asset que gere o maior volume de recursos de fundos de pensão no País será mapear a estrutura operacional para conseguir posteriormente captar os recursos dos investimentos e adquirir ativos no exterior. “Isso tem que estar bem azeitado para não se haver perdas operacionais”, diz.
Société Générale – Em parceria com a gestora MPL Investimentos – cujo conselheiro é Mizael Matos Vaz, ex-presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) –, o banco francês Société Generale partiu para sua segunda experiência com fundos de investimento no exterior para clientes brasileiros. A primeira delas, lançada no ano passado, não teve demanda das fundações. “Algumas entidades procuraram o fundo, mas como sabiam que a nova regra ia sair, desistiram e o produto não decolou”, explica Sebastien Lafosse, vice- presidente de produtos estruturados da instituição.Agora, a gestora prevê abrir para captação em 1° de dezembro seu novo fundo, que será de capital garantido. O objetivo do produto é garantir o principal, que será corrigido pela inflação. O prazo é de cinco anos.Segundo Vaz, da MPL – que se encarregará da gestão no Brasil –, em torno de dez fundações estão analisando o investimento. “Os países só começam a investir no exterior quando há cenário de superávit em conta corrente, o que vem ocorrendo com o Brasil desde 2003. O País passou a ter reservas internacionais. Houve mudança completa de cenário. O CMN está compatibilizando os investimentos dos fundos de pensão com a política macroeconômica”, declara Vaz.O fundo investirá 70% de seu patrimônio em Depósitos a Prazo com Garantia Especial (DPGEs) e em Certificados de Depósitos Bancários (CDB).Os demais 30% serão aplicados em um derivativo emitido pelo banco francês no exterior para dar exposição a uma cesta de 120 hedge funds geridos pela Lyxor, a gestora global do Société Générale, que gere em torno de US$ 90 bilhões em ativos no mundo. “Acreditamos que o produto possa ser um primeiro passo rumo ao investimento no exterior, porque não tem os riscos tradicionais, já que é de capital garantido”, explica Lafosse. O retorno, porém, também será menor que o de fundos mais agressivos. A expectativa da instituição é que o produto atinja patrimônio de, no mínimo, R$ 100 milhões.Para Marcelo Mello, vice-presidente da SulAmérica Investimentos, o aproveitamento do novo limite de 10% para investimento no exterior não vai ocorrer no curto prazo, mas sim no médio e no longo. “É preciso criar um histórico para as fundações passarem a investir. Estamos já pensando em ter produtos com investimento no exterior na nossa grade para oferecer aos fundos de pensão, e podemos aproveitar a expertise do nosso sócio estrangeiro [a seguradora holandesa ING]”, declara Mello.Ele explica que a ING atua bastante com fundos de fundos, tanto comprando cotas de produtos dela mesma como de outras casas. “Assim que saiu a 3.792, começamos a discutir com a ING a elaboração de um produto, que vamos desenvolver junto a Nova York. Mas não sabemos quando ele será lançado”, diz Mello, completando que a gestora ainda tem dúvidas em relação à regulação. “A abertura da carteira terá que ser diária? Como deve ser feito o cálculo de cotas? E o hegde de moeda? Qual o papel do custodiante daqui e do de fora? São questões operacionais que precisam ser resolvidas. Precisamos olhar a legislação a fundo e, se for o caso, levar nossas dúvidas para a CVM [Comisssão de Valores Mobiliários]”, conclui o executivo.
Fundos de pensão brasileiros remam contra a maré
Enquanto os fundos de pensão brasileiros passam por um processo de diversificação de investimentos e aumento das aplicações em renda variável, os norte-americanos reduzem sua exposição a ações, afirma Glenwyn Baptist, chief investment officer da Prudential Financial, braço de investimentos da seguradora americana de mesmo nome.
“A razão para isso é histórica. Nos Estados Unidos, os fundos de pensão já amadureceram, estão de olho na questão do risco, já que há mais gente se aposentando do que contribuindo. No Brasil, pelo contrário, as pessoas ainda estão contribuindo para os fundos de pensão, e a tendência de investimento é diferente”, afirma Baptist. Para ele, não existe o risco de os fundos de pensão brasileiros investirem demais em renda variável e no exterior. “As fundações brasileiras pensam muito sobre a questão do risco. Elas tendem a fazer mudanças na alocação de seus ativos de forma bem devagar. Então, acredito que isso é algo que possa ocorrer em dez ou 15 anos, mas não agora.”